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A paixão e os valores de Rafa Nadal pelo mundo

Espanhol Tomas Prieto no camp da Rafa Nadal Academy em Florianópolis - Divulgação/Caio Graça
Espanhol Tomas Prieto no camp da Rafa Nadal Academy em Florianópolis Imagem: Divulgação/Caio Graça

Colunista do UOL

10/02/2022 09h15

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Tomás Prieto é o comandante do Rafa Nadal Summer Camp em Florianópolis. Cabe a esse espanhol de 39 anos, ex-tenista profissional com cerca de duas décadas de experiência como técnico, uma missão de enorme responsabilidade: transmitir a cada semana, para turmas diferentes, a paixão e os valores do homem que mais conquistou slams em simples na história do tênis.

Conversamos na semana passada, quando estive na capital catarinense para acompanhar alguns dias do evento (a Rafa Nadal Academy ainda fica por mais uma semana, e há vagas para os interessados), e ficou clara a ênfase de Prieto nessas duas palavras: "paixão" e "valores". O maiorquino falou sobre as metas de cada clínica e destacou a quantidade de informação que é passada às crianças e aos adultos participantes.

Gostei, especialmente, de ouvir sobre como eles tentam replicar a experiência de estar em Maiorca e de como os campos não se limitam aos bate-bolas com instruções técnicas. Os participantes recebem muitas instruções táticas e dicas de como agir em situações diferentes dentro de cada ponto. Acho que todos vão gostar de ler as linhas abaixo.

Existe todo tipo de clínica de tênis mundo. O que este camp aqui tem de especial? O que torna o camp da Rafa Nadal Academy diferente dos outros?

A primeira coisa é que o que tentamos fazer é um copiar+colar dos camps que fazemos na Academia [em Maiorca]. Depois, o especial para os jogadores é que eles têm a possibilidade de viver a experiência que teriam na Academia, mas em uma parte diferente do mundo. Alguns jogadores podem não ter a possibilidade, outros podem não ir a Manacor, então é uma boa opção ter um pedaço de Rafa Nadal Academy pelo mundo.

Você está com a Rafa Nadal Academy há quanto tempo? Como eles contratam técnicos? Como é esse processo?

Estou com eles desde que abriram, em 2016. A Academia é dividida em duas partes. Uma é para os jogadores que querem se tornar profissionais ou buscar bolsas de estudo. Eu sou o head do programa adulto. Eu não contrato os técnicos, mas conhecendo Toni, que é o diretor agora, o primeiro que ele busca é que os técnicos sejam boas pessoas com certeza. Isso, para ele, é muito importante. Pessoas legais e normais. E depois acho que é importante amar o que fazemos. Ter essa intensidade em quadra, importar-se muito com as crianças. Se você precisar ficar na quadra 30 minutos a mais para tentar consertar alguma coisa no jogo de um jovem, que fique. No fim das contas, é paixão, ser uma pessoa boa e ter muita paixão pelo tênis.

Camp Rafa Nadal - Divulgação/Caio Graça - Divulgação/Caio Graça
Imagem: Divulgação/Caio Graça
Como foi quando Toni te contratou?

Ele não me contratou. Nessa época, ele ainda estava com Rafa no circuito. Era outro diretor. Ele me contratou e no começo cuidei dos jogadores da Academia com menos de 14 anos. Eu vinha de Nova York, da John McEnroe Academy. Fiz a entrevista, eu tenho os certificados da Federação Espanhola e mais de 20 anos de experiência, mas a conversa foi um pouco sobre como estar na quadra, o que era o mais importante para mim e esse tipo de coisa.

Quando uma pessoa vai a uma Rafa Nadal Academy, aqui ou em qualquer lugar, ela quer a "experiência do Rafa" ou algo relacionado a ele e seu jeito de ser e treinar. Que parte disso é possível oferecer em uma semana?

Se você for à Academia em Maiorca, só o ambiente te faz sentir especial. Eu sempre digo que se você ama tênis, é como a Disneylândia. Seja criança ou adulto, você sente o ambiente, e essa experiência é incrível. Nós [técnicos] não sentimos muito porque estamos lá diariamente. Se vemos Toni, ok. Se Rafa estiver lá, ok. Mais uma vez. Mas se você viaja até lá para ficar uma semana, você consegue ver o Rafa, o Toni e talvez alguns jogadores top treinando. É uma experiência incrível. No que diz respeito à quadra, Toni adora fazer coisas simples e não complicar demais as coisas. Tentamos fazer com que os jogadores deem muita intensidade e esforço em quadra. É uma coisa que seguimos muito. Segundo: acreditamos que quanto mais você bate na bola, mais chance você tem de consertar um golpe ou melhorar. E o terceiro: nós, como técnicos, tentamos estar com os jogadores o máximo possível do tempo no sentido de que se - eu não sou fã de falar mil coisas diferentes, mas prefiro dizer três ou quatro coisas muitas, muitas, muitas vezes. Se eles estiverem em um treino de três horas, e eu puder dizer a mesma coisa muitas, muitas, muitas vezes, eles terão mais chances de ficar com aquilo na cabeça e ver se aquilo é útil para eles.

Imagino que na Academia - não só nos camps - o objetivo seja sempre formar o tenista completo ou chegar o mais perto possível disso. Mas se for preciso destacar uma característica, o que um atleta precisa ter acima de qualquer outra coisa?

Acho que é fácil, ainda mais falando da Rafa Nadal Academy e de seus valores: paixão. Paixão pelo tênis é o mais importante. Você pode ter a maior habilidade técnica e tática, mas se não tiver paixão pelo que você faz, será muito difícil ter sucesso. No fim das contas, tênis é um esporte em que apenas uma porcentagem muito, muito, muito pequena tem sucesso. É preciso fazer disso a sua primeira prioridade para ter uma chance de sucesso.

Que aspecto do método da Rafa Nadal Academy você destacaria como o mais importante? O que diferencia a academia das outras?

Não consigo escolher uma. Escolheria algumas. Primeiro, a maneira com que tentamos transmitir os conceitos que queremos que eles absorvam; depois, como tentamos fazer os atletas sentirem a paixão dos técnicos e como eles devem seguir isso; e também é muito importante que, além da parte do tênis, tentamos transmitir valores. Sei que é difícil em uma semana [nos camps], mas eles têm que sentir que nos importamos com valores e conceitos como esforço, disciplina, humildade. Essas coisas são coisas com que Rafa, a família, Toni Nadal e toda equipe se importam muito.

Em termos de estratégia, uma semana é suficiente para agregar algo ao jogo? Se eu ficar uma semana com vocês, o que eu vou conseguir fazer de diferente em um torneio amador em termos de tática e estratégia?

Como adulto - ou mesmo como criança, não vejo diferença nisso - nosso objetivo, em uma semana, é te dar o máximo possível de informação e fazer você sentir a nossa maneira de fazer as coisas, a maneira que achamos que as coisas têm de ser feitas, não? Damos muitas informações sobre táticas, por isso temos sessões com "objetivos diários", e cada objetivo é ligado a uma situação de jogo em quadra. Em um dia, treinamos situações neutras e explicamos tecnicamente o que você deve fazer. Explicamos o significado de situação neutra e por que você deve fazer certas coisas. No dia seguinte, falamos sobre ataque ou defesa e fazemos o mesmo. E, no fim, você terá muita informação técnica e taticamente.

Prieto horizontal - Divulgação/Caio Graça - Divulgação/Caio Graça
Imagem: Divulgação/Caio Graça

Qual a pergunta mais comum que os alunos fazem?

A pergunta que pais e filhos mais fazem, especialmente as mães, é se Rafa vai vai aparecer (risos). Essa é a pergunta principal. Fora isso, depende do grupo e das crianças. Muitas delas - não sei se porque são tímidas - não perguntam muito, apenas seguem as instruções. Nesta semana, por exemplo, elas foram muito boas nisso e perguntaram bastante. Acho que muitas vezes tiram dúvidas com relação ao que estamos trabalhando naquele dia. Ou então, depois das sessões, perguntam na sala de aula sobre problemas que elas têm. Elas ligam o que estamos falando com as sensações que têm em quadra.

Mais técnica ou tática?

Tudo. Na segunda, falamos de técnica e alguns jogadores perguntaram como podem melhorar isso ou o que pode ser feito a respeito daquilo. De manhã, em quadra, tentamos dar muito feedback técnico. Outro dia estávamos falando sobre a importância de se concentrar e prestar atenção, e perguntaram muito sobre isso. Depende do dia.

No camp aqui em Florianópolis, alguma coisa te chamou atenção em especial? Ou foi mais ou menos como nos camps que vocês fazem pelo mundo?

Já fizemos muitos camps. Em alguns, elas [crianças] não falam nada. Às vezes, o nível é mais baixo. Quando o nível muda, a atitude também é diferente. Não são tão interessados em tênis. Mas no Brasil, sentimos em São Paulo e aqui que tivemos grupos muito bons. Todos jovens eram fãs de tênis e treinavam 3-4 vezes por semana. No começo, estavam interessados em perguntar coisas e resolver problemas que têm [no tênis]. Depois, foi mais fácil fazer o programa caminhar aqui porque eles vieram para aproveitar o camp o máximo possível. Eles foram ótimos no Brasil.

[fim da entrevista]

Coisas que eu acho que acho:

- Acompanhei boa parte da primeira semana do Rafa Nadal Summer Camp em Florianópolis e gostei do que vi, tanto no que vi dentro de quadra quanto fora. Poucos alunos por quadra, professores dedicados nas instruções, crianças (e adultos) mostrando interesse e aulas teóricas passando conceitos simples, mas eficientes de planos de jogo e como se portar taticamente dependendo da situação e do placar. Recomendo. Semana que vem haverá outro camp de sete dias na Super9, em Florianópolis. Interessados devem procurar a MundoTênis.

- Som de hoje no meu Kuba Disco: Shut Off The Lights, faixa do álbum novo da banda Bastille