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Danielzinho: nasce na maratona um novo ídolo do esporte brasileiro

Wagner Carmo/CBAt
Imagem: Wagner Carmo/CBAt

Colunista do UOL

18/04/2022 13h00

Esta é a versão online da edição desta segunda-feira (18/4) da newsletter Olhar Olímpico, seu resumo sobre o que de mais importante aconteceu e vai acontecer nos esportes olímpicos durante a semana. Para assinar o boletim e recebê-lo no seu e-mail, clique aqui.

Henrique Avancini estava sem camisa quando tirou uma selfie com a também ciclista Ana Polegatch após uma etapa de Copa do Mundo de Mountain Bike em Petrópolis (RJ), há uma semana. Ela explicou a razão: o ídolo do MTB brasileiro distribuía autógrafos e resolveu presentear um fã que havia ido pedalando até lá, só para vê-lo, e deu a ele sua própria camiseta.

Por um fim de semana, Petrópolis, terra de Avancini, se transformou em Meca para uma cada vez maior legião de fãs de mountain bike. Não é todo dia que se vê os melhores do mundo de perto. E mais importante: uma enorme comunidade, crescente, não quer perder a chance de fazer parte da história construída pelo petropolitano. No futuro, pais e avós contarão que estiveram lá, e respiraram o mesmo ar que Avança (como o chamam) respirou em uma Copa do Mundo no Vale do Cuiabá.

É Avancini quem me vem à mente quando penso em Daniel Nascimento, de 23 anos. No domingo, em Seul, na Coreia do Sul, ele se tornou o maratonista não africano mais rápido da história. Pense: em todas as pessoas que um dia correram a prova mais clássica do esporte mundial e que vieram da Ásia, da Europa, da América ou da Oceania, nenhuma delas foi tão rápida quanto Danielzinho, nascido em Paraguaçu Paulista (SP). É um feito extraordinário. E é só o começo.

Avancini e Danielzinho não poderiam ter histórias de vida mais diferentes, mas são muito parecidos no mais importante: ocupam uma lacuna de carência de ídolos em esportes de massa. O ciclismo sempre foi grande, especialmente o mountain bike, praticado à margem das grandes cidades, mas faltava aquele cara que faz o fã acordar cedo no domingo e ligar a televisão para vê-lo competir. Avança fez isso, a ponto de a Red Bull TV, que transmitia a Copa do Mundo até o ano passado, montar equipe para transmissões em português.

Mesmo sem ter conseguido "furar a bolha", Avancini tem meio milhão de seguidores no Instagram (o mesmo que o campeão olímpico Thiago Braz) e, antes da pandemia, colecionava 18 patrocinadores. Na esteira dele, as marcas passaram a investir mais no ciclismo brasileiro, que tem um circuito cada vez mais forte, com mais atletas profissionais, mais torcedores, mais tudo. O que um ídolo não faz, né?

E aí voltamos para Danielzinho. Por causa dele, no sábado à noite, havia 4,7 mil pessoas assistindo a Maratona de Seul no canal de Youtube Corrida no Ar. E mais algumas tantas mil na concorrente Corra K.O. Ruivo — agora elas somam 42 mil visualizações. Isso antes de "nascer a lenda", como escreveu o Ruivo, sobre o resultado do brasileiro.

Considere que: 1) Danielzinho tem 23 anos, enquanto o recordista mundial Eliud Kipchoge correu sua primeira maratona aos 31; 2) o brasileiro tem experiência de quatro maratonas, sendo só três delas concluídas, e ainda está aprendendo estratégia de provas de rua (apostaria que ele não tem 10 na carreira toda); 3) em Seul, para completar a prova em 2h04min51, ele fez os últimos 5 quilômetros mais rápido que os dois atletas que chegaram logo à sua frente, sendo um deles medalhista de prata no último Mundial. A partir daí, note o potencial de Danielzinho para resultados históricos.

Mas o xis da questão é como esses resultados podem ser transformadores do esporte. A cultura do pedestrianismo está enraizada em grandes centros do mundo todo (Boston está parada para a Maratona de Boston enquanto esta newsletter é publicada), incluindo o Brasil. O blog Decorrido contabilizou que, em 2019, 33 mil brasileiros concluíram uma maratona, números ainda modestos, mas mais do que o triplo dos 10 mil de 2011.

Os números explodiram exatamente na lacuna entre o último resultado expressivo do Brasil em maratonas (o quinto lugar de Marilson dos Santos na Olimpíada de Londres, em 2012) e o surgimento de Danielzinho. Para manter o exercício de projeção: imagine como esses números podem ser impactados por um atleta brigando de igual para igual entre os melhores do mundo. Arrepia só pensar em ligar a TV para ver uma Maratona de Londres, Nova York, Boston, e Danielzinho estar lá nas cabeças.

Com o resultado que fez em Seul, o brasileiro por um bom tempo vai poder escolher que maratona correrá, e ainda ganhar uma bolada de cachê. Só na Coreia do Sul, pelo terceiro lugar e pelo tempo (recorde brasileiro e sul-americano), levou a bagatela de US$ 130 mil (mais de R$ 600 mil). Patrocinado pela Adidas e com independência financeira, não vai precisar de confederação ou do COB (como Avancini, aliás) para definir seu calendário de provas. Danielzinho já tem seu próprio destino em uma mão — na outra, o destino do pedestrianismo no Brasil.

COB envolvido em mais uma confusão

É grave a denúncia feita pelo advogado Alberto Murray, ex-integrante do Conselho de Ética do COB e derrotado na eleição realizada na última terça-feira. Uma série de print screens tirados do grupo de Whatsapp do Conselho de Atletas com o presidente Paulo Wanderley mostram o dirigente propondo um diálogo sobre votos com a presidente do Conselho, Yane Marques. "Se considerar que não tem problema para você, gostar de saber apenas uma coisa, e pode ser por telefone, também. Bernardino ou Sami?", pergunta Wanderley, depois de saber que os atletas votariam em bloco.

Para os atletas, ficou a impressão de que Paulo Wanderley pretendia falar no particular com Yane e mandou mensagem no grupo errado. Tanto que, dois minutos depois, criticado no grupo pela mensagem, o dirigente pediu desculpas e disse que "não quer saber de nada".

"Paulo Wanderley, utilizando-se do status de presidente e líder maior da entidade, assediou a atleta Yane Marques, a fim de tomar conhecimento e interferir diretamente nos votos dos integrantes da CACOB [Comissão de Atletas], provavelmente para moldar o Conselho de Ética de acordo com sua imagem e semelhança", denunciou Murray ao compliance do COB, acusando o presidente da assédio moral.

Ah tá...

Em nota, o COB disse que a pergunta sobre votos em Bernardino Santi ou Sami Arap foi por "mera curiosidade política".

"O presidente Paulo Wanderley reconhece que o diálogo foi inoportuno. Enfatiza, ainda, que conversas sobre preferências políticas são normais em um ambiente democrático e de escolha de representantes, ainda que em nenhum momento tenha feito qualquer indicação ou pedido de voto para quaisquer dos candidatos ao Conselho".

Curiosidade

Eu também tenho uma curiosidade política: a Comissão de Atletas do COB vai continuar assistindo calada o mandato de Paulo Wanderley?

Estratégia de marketing

O Comitê Brasileiro de Clubes ampliou seu Colegiado de Direção e reservou duas cadeiras para mulheres. Pela internet, pediu sugestões de nomes para ocupar essas cadeiras e deu o e-mail do seu departamento de marketing para receber as indicações. Pressa para implementar as medidas? Nenhuma. O prazo é até novembro. Tudo errado, mas não faz diferença. O colegiado é para inglês ver e quem manda no CBC é Arialdo Boscolo, todo mundo sabe.

Lobby do bem para Piu

Alison dos Santos, medalhista de bronze nos 400m com barreiras em Tóquio-2020 - Christian Petersen/Getty Images - Christian Petersen/Getty Images
Imagem: Christian Petersen/Getty Images

Paris-2024 ainda não divulgou o programa do atletismo, mas bem que poderia não marcar os 400 m rasos e os 400 m com barreiras masculino para as mesmas datas, como aconteceu em Tóquio. Disso pode depender uma medalha do Brasil. Alison dos Santos, o Piu, mostrou no sábado que é muito bom também na prova sem barreiras, estabelecendo, nos EUA, a segunda melhor marca do país (44s54) e um tempo que lhe daria o sexto lugar na Olimpíada. Mas ele não pretende correr os 400 m rasos, a menos que isso não afete seu desempenho na sua prova principal. O ideal é ter 400 m com barreiras antes e 400 m rasos depois em Paris.

Boa campanha do judô

Ok que o Campeonato Pan-Americano estava desfalcado de vários judocas de destaque do continente, mas a campanha do Brasil foi, mais uma vez, esperançosa. Destaque para quatro resultados: ouro de Guilherme Schmidt (81kg, brigará por medalha em Paris), vitória de Luana Carvalho sobre Maria Portela (tendência é de renovação na 70kg), Jéssica Lima eliminando Rafaela Silva (briga deve ser ótima até Paris) e Eric Takabatake em categoria nova, 66kg, superando o colega de Pinheiros Willian Lima.

Preocupação no vôlei de praia

Preocupante que, mesmo com várias das melhores duplas inscritas no Challenger de Itapema, etapa brasileira do segundo escalão do Circuito Mundial de Vôlei de Praia, o país só tenha conquistado um ouro e um bronze. A boa notícia é que, no masculino, André e George ganharam o ouro, repetindo a vitória de uma etapa 4 estrelas disputada em novembro passado. Eles, que têm 27 e 25 anos respectivamente, largam na frente na corrida interna por Paris-2024.

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