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Olhar Olímpico

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Bloqueio a Cuba faz brasileiro candidato a medalha treinar sem técnico

Darlan Romani e Justo Navarro no Pan de Lima - Wagner Carmo/Panamerica Press/C
Darlan Romani e Justo Navarro no Pan de Lima Imagem: Wagner Carmo/Panamerica Press/C

25/06/2021 04h00

Com Amanda Romanelli, colaboração para o UOL Esporte

Forte candidato a uma medalha nos Jogos Olímpicos de Tóquio, Darlan Romani, do arremesso de peso, não se encontra pessoalmente com seu próprio treinador desde o ano passado. O brasileiro treina em Bragança Paulista, no interior de São Paulo, enquanto o técnico que o colocou entre os melhores do mundo, Justo Navarro, não consegue sair de Cuba.

Navarro foi contratado pela CBAt em 2010, quando dois atletas despontavam no arremesso de peso, ainda na categoria júnior: a paulista Geisa Arcanjo, que no mesmo ano se tornaria a primeira brasileira campeã mundial júnior em mais de 15 anos, e Darlan, então um desconhecido catarinense que também foi finalista naquele Mundial. Os três foram unidos em Uberlândia e desde então trabalham juntos. Sob as orientações de Navarro, Geisa foi finalista olímpica em 2012. Darlan terminou em quarto os últimos dois Mundiais, indoor e outdoor, e em quinto nas Olimpíadas do Rio, em 2016.

O cubano vai a Cuba nas férias, mas desta vez não conseguiu voltar. "Este ano, o plano era retornar em 31 de janeiro. Por problemas pessoais, tive que atrasar minha partida e, devido à pandemia, meu país reduziu a frequência de voos para o Panamá", contou Navarro, por e-mail.

Uma possibilidade seria o treinador viajar até os Estados Unidos, mas, por causa do bloqueio dos americanos a Cuba, não existe embaixada dos EUA no país. Por isso, ele não consegue sequer solicitar visto de passagem. Também foi discutido que Navarro tentasse ir até a Espanha, onde encontraria Geisa e Darlan, mas ele também não consegue pedir o visto.

Enquanto isso, no Brasil, Darlan também passou por problemas. O arremessador, que não respondeu aos pedidos de entrevista, chegou a montar uma estrutura para treinar no terreno próximo de sua casa, em Bragança, em 2020, porque as pistas de atletismo estavam todas fechadas por causa da pandemia. Devido ao treinamento improvisado, começou a sentir dores lombares em julho do ano passado. Em fevereiro, recebeu o diagnóstico de hérnia de disco, que o obrigou a passar por uma cirurgia e ficar cinco semanas se recuperando.

Quando retornava do pós-operatório, Darlan precisou viajar para Concórdia, sua cidade natal, em Santa Catarina, para acompanhar um familiar que teve covid. E também pegou a doença. "Com pouco trabalho e tão intermitente é difícil prever um resultado para o Darlan", diz Navarro. "Ele é um menino de muita boa vontade e com vontade de dar um bom resultado ao seu país".

Os dois, que conviviam diariamente desde 2010, agora só se falam por vídeo, o que está também atrapalhando muito não só a preparação de Darlan, mas também de Geisa, que deve ir à Olimpíada pelo ranking, e de Willian Denilson, que entrou no grupo esse ano. "Falo quase diariamente com meus alunos. Em alguns casos, eles filmam os treinamentos, eu os vejo aqui e retorno minhas considerações técnicas a eles. A presença do treinador é fundamental, não havendo possibilidade de aprimoramento técnico com trabalho apenas online", afirmou o treinador, destacando a palavra "fundamental", com o texto em caixa alta.

O Comitê Olímpico do Brasil (COB) acompanha o caso de perto e tenta encontrar uma solução para que Navarro ao menos vá à Olimpíada. "Estamos buscando primeiro esse caminho. Estamos tentando Doha ou Frankfurt. A dificuldade era trazê-lo ao Brasil. Estamos também conversando com Cuba, para saber como eles vão levar a delegação ao Japão, se tem como ajudar. Ele está escalado, mas hoje eu não sei te dizer por onde ele vai ainda, se ele vai conseguir sair de Cuba", disse Jorge Bichara, diretor de Esporte do COB.

Darlan competiu três vezes esse mês e vem evoluindo. Fez 20,46 m no Troféu Brasil, 20,86 m em um meeting em Bragança Paulista no domingo, e 21,56 m em outro evento idêntico anteontem. Ele ainda disputa o Campeonato Paulista este fim de semana, em São Paulo, e depois viaja à Europa, já como escala para o Japão.

Enquanto isso, o nível da prova internacionalmente vem subindo. No fim de semana passado, o americano Ryan Crouser bateu o recorde mundial, em 23,37 m. O também americano Joe Kovacs fez 22,72 m. Além dos dois, deve brigar por medalha o australiano Tomas Walsh, que foi bronze no Mundial de 2019 com 22,90 m, 29 centímetros acima do recorde sul-americano de Darlan, quarto naquela competição.