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Olhar Olímpico

Bioquímico que defendeu Rafaela vai comandar controle de doping no país

LC Cameron - Divulçação/IVESP
LC Cameron Imagem: Divulçação/IVESP

17/04/2020 13h58

Há quatro meses, L.C. Cameron se reuniu virtualmente com especialistas da Agência Mundial Antidoping (Wada) para defender que Rafaela Silva caiu no doping porque deixou um bebê chupar o seu nariz. Em breve, o bioquímico será o novo secretário/presidente da Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD). Ele aceitou o convite do secretário especial do Esporte, Marcelo Magalhães, e vai comandar o controle antidoping no país.

A informação foi publicada pelo jornal Lance! nesta sexta-feira (17) e assustou pessoas que militam há anos no combate ao doping no país. Cameron sempre esteve do lado oposto do balcão. Chefe do Departamento de Genética e Biologia Molecular da UniRio, Luis Claudio Cameron se notabilizou no esporte por produzir laudos isentando atletas de responsabilidade em casos de doping. Em outro caso famoso, defendeu o atacante Paolo Guerrero.

Trabalhando em conjunto com o advogado Bichara Neto (não confundir com o diretor de Esporte do COB, Jorge Bichara), fracassou no caso Rafaela Silva. A tese apresentada por Cameron passou longe de convencer o painel da Federação Internacional de Judô (IJF) e o especialista da Wada, seu "opositor" no painel, a ponto de no mesmo dia do anúncio da decisão a judoca dispensar a dupla Bichara Neto/Cameron e contratar o especialista Marcelo Franklin.

Nos bastidores, é notória a rivalidade de Cameron com alguns advogados do ramo e com o comando do Comitê Olímpico do Brasil (COB). Cameron e a esposa, Adriana Bassini, também pesquisadora, ajudaram a montar o laboratório olímpico brasileiro. Ela era funcionária CLT do comitê até fevereiro de 2018, quando foi demitida.

Cameron, que na época comandava o laboratório como consultor, era contra a demissão da própria esposa, sua subordinada, e, em ato de protesto, também se desligou do COB. Reclamando que não recebia há cerca de um ano, por questões burocráticas, abriu um gigantesco processo trabalhista contra o COB, no qual cobra US$ 800 (R$ 3,5 mil) por hora de consultoria - até 2017 o COB pagava a ele cerca de R$ 6 mil por mês. Bassini, esposa dele, também processou o COB.

O bioquímico, futuro presidente da ABCD, está em guerra fria contra o COB. Além dos dois processos, ele se aliou ao médico Roberto Nahon para criticar a atuação do diretor de Esporte Jorge Bichara. Entre diversas trocas de acusação, Nahon foi demitido por justa causa, por correr uma ultramaratona enquanto estava afastado por licença médica.

No início da semana, Cameron foi cedido pela Universidade Federal do Rio, onde é professor, para a Secretaria Especial do Esporte, onde vai ocupar cargo de direção na ABCD. Ele ainda precisa ser oficialmente nomeado para ser secretário/presidente, ocupando posto que hoje é da ex-ginasta Luisa Parente.

A rixa entre Cameron e o COB causa preocupação extra quando se relembra episódio da véspera da Olimpíada do Rio. O português Luis Horta, então consultor da ABCD, e o diretor de Esporte do COB, Marcus Vinicius Freire, trocaram acusações públicas. Freire acusou a ABCD de perseguir os atletas olímpicos brasileiros, testando-os massivamente (quanto mais testes, maior o risco de um atleta não ser encontrado e, por isso, ser punido). Horta depois reclamou da pressão e disse que deixou o país temendo por sua vida.

Há ainda outro fator de conflito: Paulo Wanderley montou, no COB, uma continuação do que era a ABCD até dois anos atrás. Na ocasião, seu filho, Sandro Teixeira, chegou a anunciar que seria o novo comandante da ABCD, cargo para o qual acabou não sendo nomeado. Dois amigos dele, Vinicius Loyola e Christian Trajano, tiveram cargos de confiança na ABCD e hoje representam a nova área antidoping do COB.

Só no governo Bolsonaro, Cameron será o terceiro secretário/presidente, depois dos ex-atletas Emanuel Rego e Luisa Parente. No governo Temer foram outros três comandantes: Rogério Sampaio (hoje CEO do COB), Celso Giacomini e Denise Cunha, além do filho de Paulo Wanderley, que não chegou a ser oficialmente nomeado. Ou seja: são seis presidentes em quatro anos.

Procurados, Cameron e Luisa Parente, que deixa o cargo, não responderam os contatos da reportagem.