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Olhar Olímpico

Coronavírus impõe blackout ao esporte a 4 meses da Olimpíada

Francesco Caputo, do Sassuolo, comemora gol com mensagem pedindo para torcedores ficarem em casa devido ao coronavírus - Reprodução
Francesco Caputo, do Sassuolo, comemora gol com mensagem pedindo para torcedores ficarem em casa devido ao coronavírus Imagem: Reprodução

10/03/2020 19h03

Faltam apenas quatro meses o primeiro grupo de atletas entrar na Vila Olímpica de Tóquio, gesto simbólico que diz que, a partir dali, a Olimpíada já é realidade. Os meses que antecedem a competição costumam ser destinados à definição de grande parte dos classificados e ao acerto dos últimos detalhes para que os anos de preparação sejam justificados com uma medalha olímpica ou, no mínimo, uma boa participação. O novo coronavírus, porém, virou de cabeça para baixo os planos do mundo esportivo ao impor um blackout cada vez mais generalizado.

É até difícil acompanhar todo o noticiário internacional sobre "consequências do coronavírus no esporte". Sem contar futebol, só hoje (10) o remo cancelou seletivas olímpicas e paraolímpicas que aconteceriam na Itália, o tênis de mesa cancelou uma etapa importante do Circuito Mundial que aconteceria em Tóquio e o judô, depois de paralisar todo o calendário até 30 de abril, estendeu por dois meses a corrida olímpica. Já o Quênia determinou que, por pelo menos um mês, nenhum atleta está autorizado a sair do país.

Não há planejamento que resista a tantas mudanças e à incerteza se o torneio de amanhã não será cancelado também. Talvez o melhor exemplo seja a maratona. Abril é o melhor mês para obtenção de boas marcas e quem ainda precisa de índice ou melhorá-lo deixou para correr uma prova no mês que vem. Mas já são pelo menos 12 corridas com chancela internacional canceladas e tudo indica que outras tenham o mesmo destino, como Viena (Áustria), Berlim, Hannover, Hamburgo (Alemanha) e Roterdã (Holanda). Afinal, parece ser mesmo pouco sensato colocar dezenas de milhares de pessoas de países diferentes para se espremerem durante horas.

Sem maratonas para correr o planejamento esportivo dos principais atletas do mundo é afetado, mas não só. Também o financeiro, uma vez que muitos dependem de premiações para se manterem. No Brasil, fundistas como Ederson Vilela e Adriana Aparecida estão entrando na reta final de preparação para faze índices, sem saber se as provas para as quais estão inscritos, Viena e Hannover, serão realizadas. E nem adianta estender a janela de classificação porque não há provas rápidas previstas para maio e o prazo de recuperação seria insuficiente até a Olimpíada.

O judô fez isso, cancelando todas as últimas quatro etapas de circuito mundial que restavam até o fim da corrida olímpica, no início de maio. Por dois meses, ninguém compete. Na expectativa que o mundo tenha sucesso na tentativa de bloqueio do novo coronavírus, a modalidade manteve eventos programados para maio e junho e os incluiu na corrida olímpica. Disso dependem atletas como Nathalia Brigida, que era a melhor brasileira de sua categoria quando lesionou o ombro e, agora que se recuperou, já ficou sem participar de dois torneios cancelados em cima da hora. Ontem (9), ela estava no aeroporto quando soube que não adiantava nada viajar para Rússia, onde competiria na sexta.

Outras modalidades também estão apelando para o adiamento puro de seletivas olímpicas, na esperança de que daqui um tempo o coronavírus não seja mais uma preocupação tão grande. O problema é se isso não ocorrer. A Itália, segundo país mais afetado pelo COVID-19, por exemplo, cancelou seus eventos esportivos, o que inclui seletivas olímpicas. Seus atletas também não podem viajar para fora, porque seriam colocados em quarentena, ficando duas semanas trancados em hotéis, sem treinar. Seria justo realizar a Olimpíada sem eles?

O blackout que paralisa o esporte mundial, do golfe ao skate, do taekwondo ao tênis de mesa, prejudica parte importante dos Jogos Olímpicos: a preparação. A Olimpíada só é o que é porque os melhores atletas do mundo chegam a ela no auge da forma física e técnica, para competir em igualdade de condições com outros esportistas também no seu auge. Quando isso se perde, se perde também parte do espírito olímpico.

Nem com bola de cristal, porém, é possível prever o que vai acontecer. O Comitê Olímpico Internacional (COI) impôs ao comitê organizador e ao governo de Tóquio a dura decisão de tirar a maratona olímpica da capital japonesa e levá-la ao norte do país porque seu presidente Thomas Bach foi impactado pela imagem de corredores derretendo no calor de Doha durante o Mundial. Não teve televisão, patrocinador ou boa relação com o governo que dissuadisse o COI da ideia.

Da mesma forma, talvez a paralisação do esporte mundial sensibilize dirigentes graduados ou políticos importantes e os convença de que não há clima para fazer uma Olimpíada. Ou as regras tão rígidas agora surtam efeito a tempo de as coisas voltarem ao normal a tempo de se realizar uma ótima edição dos Jogos Olímpicos. Enquanto não houver essa resposta, porém, essa angústia vai persistir na mente de atletas e dos fãs do esporte.