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Milton Neves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

MN: Morre Viktor Saneyev! Que, lá no céu, ele peça desculpas a João do Pulo

João Carlos de Oliveria, o João do Pulo salta durante os jogos olímpicos de 1976 em Montreal - AFP
João Carlos de Oliveria, o João do Pulo salta durante os jogos olímpicos de 1976 em Montreal Imagem: AFP

04/01/2022 11h30

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Da Redação do Portal Terceiro Tempo

O esporte mundial perdeu uma de suas grandes lendas na última segunda-feira (3). Morreu em Sidney, Austrália, Viktor Danilovich Saneyev, um dos maiores vencedores do salto triplo em todos os tempos. Saneyev nasceu na Geórgia e competiu durante toda a sua carreira pela União Soviética.

Nascido em 3 de outubro de 1945 em Sukhumi, na Geórgia (que ainda fazia parte da antiga União Soviética), Saneyev começou a competir no salto triplo no início dos anos 60. Em 1968, ganhou a medalha de ouro nas Olimpíadas da Cidade do México e estabeleceu na competição um novo recorde mundial para a modalidade: 17m39.

Em 1972, nos jogos de Munique, levou o ouro mais uma vez e bateu o próprio recorde, alcançando desta vez 17m44. Esta marca acabou sendo quebrada por João do Pulo em 1975, nos Jogos Pan-Americanos do México, quando o brasileiro atingiu assombrosos 17m89.

Nos jogos de Montreal, em 1976, levou mais uma vez a medalha de ouro. Já em 1980, em Moscou, ficou com a prata, enquanto o ouro ficou com o também soviético Jaak Uudmäe. A prova é muito contestada, principalmente pela mídia brasileira, que afirma que os árbitros da competição, todos soviéticos, teriam "queimado" dois saltos perfeitos de João, possivelmente acima dos 18m.

Após encerrar sua carreira, Saneyev mudou-se para a Austrália, onde acabou falecendo.

Viktor Saneyev, tricampeão do salto triplo

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Bem, minha gente, e agora vou explicar melhor para vocês o que aconteceu em 1980, nos Jogos Olímpicos de Moscou.

Naquela época, é claro, não tínhamos as redes sociais e a revisão de vídeo de hoje em dia.

E nem toda a tecnologia existente para aferição de doping.

Imaginem então o que os soviéticos fizeram em competições passadas...

E não apenas em termos de substâncias ilícitas, utilizadas para "turbinar" os atletas, mas também na tal manipulação de resultados.

Os "olhômetros" imperavam na antes União Soviética assim como as fitas métricas que marcavam menos centímetros para seus adversários, a exemplo de dados "viciados" em jogos "de azar".

Foi o jornalista Orlando Duarte, o "Eclético", quem chamou a atenção para o roubo sofrido por João do Pulo nos Jogos Olímpicos de Moscou, em 1980.

Pertinho da caixa de areia, o "Gol do Salto Triplo", o já experiente Orlando Duarte alardeou em 1980 que João do Pulo tinha sido roubado em dois de seus saltos espetaculares, certamente acima dos 18 metros, que lhe garantiriam a medalha de ouro, feito que os russos jamais aceitariam.

Recordista mundial desde 1975 nos Jogos Pan-Americanos do México com seus assombrosos 17,89m, João Carlos de Oliveira era grande adversário de Viktor Saneyev, que morreu na última segunda-feira (3), no salto triplo.

Reforçado pela zebra Jaak Udmae, o time russo de Saneyev tinha a medalha de ouro como questão de honra nacional.

O que fizeram?

Roubaram João do Pulo!

Na cara dura, nos olhos podres e nos punhos comprados.

Seus dois saltos acima dos 18m foram "queimados" pelo "olhômetro" desonesto do fiscal de linha, hasteando a bandeirinha vermelha, impeditiva.

Um deles, tcheco, já falecido, um dia reconheceu em Praga que tinha mesmo ordem de sabotar o atleta brasileiro.

O fiscal tcheco anula um dos saltos perfeitos de João do Pulo nos Jogos Olímpicos de Moscou, em 1980, para indignação do atleta brasileiro. Fotos: Reprodução/YouTube

Era fácil.

Não havia o VAR de hoje.

As câmeras que flagram o exato momento em que o bico da sapatilha do saltador toca ou não na marca derradeira.

É como a bolinha amarela do tênis quando do desafio pedido pelo tenista, recurso eletrônico que minimizou as "barbeiragens" de outrora...

Bastava, em 1980, o "achômetro" (e a má intenção, claro) do fiscal-bandeirinha naquela Olimpíada de Moscou.

Aliás, em 2015, a Associação de Atletismo da Austrália exigiu uma investigação da Federação Internacional de Atletismo pois considerava que seu atleta Ian Campbell, a exemplo de João do Pulo, foi prejudicado com saltos mal anulados.

Se esta investigação um dia der "ganho de causa" ao australiano e a João do Pulo, o brasileiro ficaria com a medalha de ouro e Campbell com a prata.

Consequentemente, Saneyev perderia a prata e ficaria em quarto lugar.

Orlando Duarte, primeiro a falar sobre a trapaça que os russos fizeram com João do Pulo em Moscou/1980. Na foto, ele está ao lado de Milton Neves, em 1984. A dupla, então na Rádio Jovem Pan-SP, posou com os seus troféus Aceesp, conquistados naquele ano. Foto: Portal Terceiro Tempo

Pobre João!

Nunca se conformou.

Era meu amigo.

Foi até Muzambinho-MG comigo dias depois de voltar consagrado do México em 1975, trocando grande homenagem que receberia da Rede Globo na Praça Marechal Deodoro por minha pequena cidade.

Milton Neves, com apetite, se serve do bandejão do Colégio Agrícola de Muzambinho ao lado de João do Pulo e do diretor do colégio, José Rossi. Em pé, à esquerda, Scarlett Abrão Borelli. A outra moça é Ester Rondinelli Anderson. Foto: Portal Terceiro Tempo

Sempre assombrado pelo "Roubo de Moscou", João decaiu em seus pulos, separou-se, largou a farda, acidentou-se como vítima em seu Passat em 1981 entre São Paulo e Campinas, na Via Anhanguera, quando bateu em uma Variant conduzida por um motorista alcoolizado, na contramão.

João do Pulo perdeu a perna, a carreira e vieram a política, o alcoolismo e a morte.

O Passat de João do Pulo, destruído após o acidente na Rodovia Anhanguera. Foto: Reprodução

Culpa dos russos, esses indecentes que hoje roubam no doping e que ontem roubaram João do Pulo e o Brasil.

E é exatamente essa a bandeira a ser levantada e repetida pela mídia brasileira e mundial.

Quem ousa roubar hoje descaradamente no doping, desafiando toda a alta tecnologia atual de combate a esta maldição do esporte limpo, e mesmo com o VAR, não teria mesmo, como não teve, temor, despudor e a falta de vergonha na cara de roubar, no "olhômetro" e no achismo visual desonesto, um saltador "lá daquele tal Brasil distante".

Ordinários!

Mataram o João!

Frustraram os seus sonhos.

Emudeceram o Brasil.

Brasil que parou pela TV quando daqueles saltos do João em Moscou, como parava nas voltas de Ayrton Senna, nos socos de Eder Jofre ouvidos pela Rádio Bandeirantes, nos backhands e drop-shots de Maria Esther Bueno e Guga e nos gols maravilhosos de Pelé.

Ave, Orlando Duarte.

Abraços, João do Pulo, também no céu!

E xô, apito-amigo que insiste em prejudicar nossos atletas, como fizeram com João em 1980!

E peça desculpas quando encontrá-lo lá no céu, Saneyev, mesmo você tendo sido um atleta exemplar e sem envolvimento com a arbitragem vergonhosa de 1980.

detran

Em 1975, João Carlos de Oliveira foi ao Detran para tirar sua carteira de motorista. E Milton Neves aproveitou para "tirar um retrato" com ele. Foto: Portal Terceiro Tempo

VEJA A IMAGEM DO TAMBÉM SAUDOSO ORLANDO DUARTE EM 2020. ELE RELEMBROU O OCORRIDO EM MOSCOU/1980:

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