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Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Moro vai usar a prancha da hipocrisia para surfar a onda da ameaça de morte

Moro cochicha com Bolsonaro - Foto Evaristo Só/AFP
Moro cochicha com Bolsonaro Imagem: Foto Evaristo Só/AFP

Colunista do UOL

22/03/2023 10h08

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A Polícia Federal revelou plano do PCC para que algumas autoridades fossem assassinadas.

Dos nomes que estariam em uma lista constaria o de Sergio Moro.

É o rosto do ex-juiz que já estampa a maioria dos espaços de noticiário que falam do plano descoberto pela PF.

Ele é apenas um dos nomes e não "o" nome, e isso seria fundamental reforçar.

Digo aqui da forma mais clara do mundo: qualquer ameaça de morte deve ser condenada, mesmo aquelas feitas contra pessoas peçonhentas.

O britânico John Locke —ou outro ícone liberal qualquer— achava que o tiranicídio fazia parte do jogo.

Não faz.

Faz parte do jogo processar, condenar, prender.

Mas matar —tiranos ou democratas— não é do jogo.

Ameaças de morte não podem jamais ser relativizadas.

Quem escreve é uma pessoa ameaçada de morte e cuja vida foi alterada por essas ameaças.

Amigos deixaram o país por causa de ameaças recebidas nesse período bolsonarista de nossas vidas.

Outros, mais privilegiados, hoje andam com escolta.

Jair Bolsonaro falava em fuzilar a petralhada e mandar esquerdistas para a ponta da praia - gíria da ditadura que significava dizer onde os corpos de pessoas assassinadas deveriam ser descartados.

Jair Bolsonaro e Sergio Moro são parceiros de ideias, valores e caráter.

Essa apologia à morte feita regularmente por Bolsonaro nunca incomodou Sergio Moro. Muito pelo contrário.

O caso Marielle está sem resolução até hoje. Jair Bolsonaro e Sergio Moro nunca ligaram para ele. Marielle não foi apenas ameaçada; ela foi executada.

As autoridades ameaçadas pelo PCC andam todas com escolta - coisa que Marielle não tinha. Moro anda com escolta.

Sabe quem não tem escolta? Quem mora nas favelas e todos os dias é ameaçado —e morto— por homens fardados.

Sergio Moro, enquanto ministro de um governo de inspirações nazifascistas, quis aprovar o excludente de ilicitude.

O que era isso? O direito da polícia matar sem prestar contas. Matar, matar, matar. Mais. Mais fartamente do que já faz hoje em favelas e periferias.

O projeto que Moro apoiava dizia: "não há crime quando o agente pratica o fato: em estado de necessidade; em legítima defesa; em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito" (Fonte: Agência Câmara de Notícias).

Mas vejam: na prática já é assim hoje por conta de um tal auto de resistência, que diz o seguinte:

"Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas."

Sergio Moro queria elevar o auto de resistência a um status ainda mais tirânico.

Poderia - mas não vou - falar do comportamento de Moro quando o neto de Lula morreu, ou do que ele fez com dona Marisa e de como a opressão lavajatista que usava de métodos ilegítimos e ilegais contra suspeitos e suas famílias acabou levando a ex-primeira dama à morte. Deixemos isso pra lá agora.

Mas o fato é que esse é o homem que está prestas a começar um chororô sem fim em relação a ameaças que resvalam em seu nome e nos nomes dos seus afetos.

É de fato horroroso ser ameaçado de morte.

Em Brasília, nos sinais do Leblon, em carros blindados, em nossas casas construídas em bairros chiques, nas favelas e nas periferias. Vale para todo e qualquer um.

É preciso se indignar contra ameaças de morte até mesmo quando elas atingem pessoas que trabalham para promover a legalidade do assassinato de corpos que elas consideram descartáveis.