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Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Tentativas de golpe seguirão acontecendo: vem mais delinquência por aí

Manifestantes golpistas invadem Congresso Nacional - Leticia Casado/UOL
Manifestantes golpistas invadem Congresso Nacional Imagem: Leticia Casado/UOL

Colunista do UOL

12/01/2023 14h42

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Seria prudente não pensar que os atos golpistas de 8 de janeiro encerraram uma fase da política recente no Brasil. Sob muitos aspectos, eles inauguram um recomeço para a extrema-direita e o recomendável é que assim fossem entendidos.

Sem essa compreensão, não poderemos desarticular o que ainda é um movimento insurrecional organizado da extrema-direita brasileira.

O que sabemos até aqui é suficiente para nos deixar preocupados e atentos.

A insurreição tem apoio de parte do empresariado, de parte da polícia, de parte de governos estaduais e de parte das forças armadas.

É gente demais, e gente cheia de poder. Podem não ser a maioria - não são - mas trata-se de uma minoria endinheirada e armada.

Se por um lado o novo governo age corretamente na continuidade de suas funções - empossando um ministério representativo, voltando a operar a partir dos prédios depredados e já funcionais na medida do possível e articulando encontros com aqueles que se colocam fazem oposição democrática -, por outro a consciência de que um golpe de estado ainda é uma ameaça nos ajudará a aniquilá-lo pela raiz e não apenas na aparência.

Hora de reformar uma polícia que se entende como militar e que opera militarmente contra minorias políticas desde a escravidão.

Hora de punir exemplarmente empresários que estejam financiando as tentativas de golpe.

Hora de colocar na reserva qualquer membro das forças armadas que participem direta ou indiretamente da insurreição. Especialmente os do alto comando.

Hora de tirar das forças armadas qualquer papel político e recolocá-las em seu devido lugar.

O estado brasileiro precisa ser desmilitarizado. Sem isso não haverá possibilidade de futuro e ficaremos reproduzindo no presente a golpes e massacres passados.

Sem isso, viveremos nessa guerra civil que se disfarça de guerra às drogas, sequestrados por quem opera o poder mesmo à distância.

Isoladamente, as imagens produzidas desde 8 de janeiro ficam entre o ridículo e o absurdo, passando pelo hilário e pelo odioso.

Mas pensar de forma isolada não nos ajudará nesse momento tão tenso de nossa história.

É preciso que se analise a totalidade dos acontecimentos, recorrendo a atos de um passado recente.

A extrema-direita mundial tem o Brasil como laboratório.

Não hesitarão em investir em novos atos, em inteligência, em potenciais rebeldes sociais, em aprendizes de terroristas e em atos de terrorismo para chacoalhar a retomada do poder pelos interesses do povo.

Seria preciso levá-los muito a sério. Eles seguem organizados e têm estratégias de atuação.

Nada do que fazem os Bolsonaro é por acaso.

Nem publicar vídeos golpistas e na sequência apagar, nem debochar da quebra de sigilo dos gastos feitos com cartões corporativos.

Eles de fato sabem que seu séquito não se importa em saber que gastaram nove mil reais em uma mesma padaria por dias seguidos.

Esse séquito está mobilizado messianicamente e, em nome da salvação de nossas almas e da pátria, acreditarão em qualquer coisa e serão levados a cometer qualquer tipo de crime.

Esse entendimento também é necessário: existe uma multidão de pessoas altamente engajadas nessa luta.

Eles acreditam honestamente estar em missão sagrada. Até onde você iria se achasse que suas ações salvarão uma nação inteira?

A extrema-direita brasileira está amparada por esse tipo de engajamento messiânico e por uma rede internacional que vê o Brasil como laboratório.

O aparente apatetamento de Jair Bolsonaro, sua conhecida ignorância tosca e sua popular escatologia verbal funcionam como a liderança ideal porque, se por um lado fica fácil ridicularizá-lo, por outro essa combinação ajuda a fazer com que o risco que ele representa seja negligenciado.

Infelizmente, não acabou e teremos que seguir atentos contra as tentativas de golpe.

Levar a sério a articulação da extrema-direita, punir rápida e rigorosamente todos os envolvidos, de cidadãos amalucados da terceira idade a empresários e generais, desmilitarizar o estado e berrar todos os dias "sem anistia": essa é a única chance de de vencermos a guerra.