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Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Milly: Qual será a próxima inovação no futebol?

24.maio.2018 - Em Havana, Cuba, crianças jogam futebol na rua - Alexandre Meneghini/Reuters
24.maio.2018 - Em Havana, Cuba, crianças jogam futebol na rua Imagem: Alexandre Meneghini/Reuters

Colunista do UOL

03/01/2022 16h27

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Desde que foi criado, o futebol não para de se transformar. As regras mudam conforme o jogo em campo também muda. No começo, não havia goleiro nem árbitros. Não havia impedimento nem escanteio. Não havia expulsões nem bandeirinhas. Assim como na vida, as mudanças são as únicas constantes do jogo.

Recentemente, as mudanças têm sido feitas para acomodar não o que pede o jogo enquanto arte e espetáculo, mas para acomodar desejos, interesses e necessidades de quem nele hoje manda: magnatas, bilionários, sheiks, patrocinadores, canais que têm o direito de transmissão.

Com o crescente aumento dos interesses financeiros por trás do esporte, que agora manifestam desavergonhadamente via casas de aposta, aumenta-se a necessidade de provar que o jogo é honesto, íntegro, correto.

Para tanto, abrem as portas para que uma partida seja assistida por mais árbitros, oficializa-se o VAR e, com ele, a ilusão do controle sobre o que é a verdade e o justo dentro de um jogo.

Já ficou evidente que, com ou sem VAR, não há justiça total possível porque o futebol tem camadas e camadas de subjetividades e de plasticidade, que é o que, afinal, também pode salvá-lo.

Outras mudanças dizem respeito aos protocolos, esses também motivados pela sanha de ter controle sobre o que é incontrolável. Tudo parece ser feito de uma mesma substância, os estádios têm hoje todos a mesma cara e devem ser chamados de arenas, as entrevistas são rigorosamente iguais e realizadas num cenário escolhido pelos patrocinadores, os times "espelham" o posicionamento tático do rival a fim de "travar" o jogo.

A constante elitização do futebol também é uma dessas transformações modernas. Hoje, quem é pobre já não consegue mais ir ao estádio nem pagar duplamente para ver seu time pela TV: paga-se para ter acesso aos canais a cabo e, depois, paga-se outra vez para ver seu time jogar.

Quem passar só pela primeira etapa de pagamentos ou espera o domingo à tarde para assistir a uma partida gratuita na TV aberta e torce para que seja o jogo do seu time, ou vai ter que ver Novo Horizontino x Linense no sábado à noite e acompanhar o seu time pelo rádio ou pelo minuto-a-minuto de algum portal.

Nada de novo surge em termos técnicos, táticos, estratégicos. Não surge uma nova revolução social como foi a Democracia Corintiana, não se pensa num novo carrossel, num outro futebol-total e nem mesmo nas divertidas trocas que começaram na década de 70 com o presidente tricolor Francisco Horta que achou um caminho para trocar com rivais os jogadores que ele achava que não mais serviam ao Fluminense. A última dessas trocas foi a de Pato por Jadson e agora, especula-se, Liziero, do São Paulo, por Patrick, do Inter. Mas esse puro escambo não permite que intermediários ganhem dinheiro com as transações, então elas, obviamente, não interessam.

Todas as inovações citadas acima vêm estranhamente do passado. As do presente se restringem a deixar o futebol mais "controlável", protocolado, rígido e careta. Só que o futebol é tinhoso e resiste ao desencanto da rigidez que se impõe sobre ele. O que ele fará para se reinventar a gente ainda não sabe. Mas é certo que ele dará o seu jeito de driblar tanto conservadorismo para, assim, evitar a própria morte por tédio.