Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Milly Lacombe: Fortaleza, meu amor
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O escritor uruguaio Eduardo Galeano costumava dizer que o futebol é uma alegria que doi. Acho uma definição precisa. O jogo está inserido na memória de alguns de meus maiores sofrimentos e de minhas maiores felicidades na vida. O time para o qual escolhemos torcer - ou o time que nos escolhe como torcedores - sai da categoria de objeto e passa a ser sujeito. Com esse sujeito construímos uma relação profunda, dilacerante, penetrante, intensa. Eu, por exemplo, já senti saudade de ver o Corinthians em campo, e aqueles que não gostam de futebol, ou não ligam para o jogo, certamente acreditam que sentir saudade de um time é uma espécie de alucinação, de delírio, de enfermidade. Talvez seja, e nesse caso não me interessa estar sã.
Mas existem outras dimensões de afetos que o futebol movimenta e sobre as quais pouco se fala. Por exemplo: o ambiente que escondemos bem guardado em nosso peito onde vivem uma espécie de respeito silencioso pelo eterno rival e a admiração pelo craque do adversário. Difícil alcançar esse lugar, mas ele existe e pulsa. E existem ainda as emoções que pegam a gente de surpresa, e é sobre essa que quero falar.
Quem está atento ao que acontece em campo está, de alguma maneira, se deixando encantar pelo Fortaleza. O time que até outro dia estava na série C hoje está entre os quatro melhores do Brasil. Um time sem estrelas e sem mimos. Um time organizado para atacar, que ocupa os espaços do campo com velocidade, que joga lealmente, que respeita o torcedor e a audiência. Um time que tem deixado gigantes no chão e que rola a bola com alegria e humildade. Um time que sabe perfeitamente que o lugar de onde viemos e pelos quais passamos devem ser celebrados, honrados, reverenciados. Nada em nossas histórias deve ser jogado fora porque esse foi o caminho que nos trouxe até aqui. O Fortaleza não se envergonha da série C, muito pelo contrário.
Num cenário dentro do qual cair é uma humilhação e onde começamos a ver apenas três times se destacarem dos demais e formarem uma pequenina elite que ameaça se revezar no levantamento de troféus, o Fortaleza é o intruso e a resistência. É na história do tricolor cearense que podemos nos reconciliar com o sonho de ver uma espécie de resgate do futebol acontecer. O Fortaleza é a esperança de que possamos perceber que um time é mais do que um elenco estrelado. Mais do que um seleto grupo de times sudestinos endinheirados. Mais do que uma lógica altamente empresarial aplicada a todas as coisas da vida e do jogo. É a certeza de que futebol é união, entrega, intensidade, respeito, atenção, amor, paixão.
Que o Fortaleza possa continuar sua jornada heroica. Que siga com esse encantamento. Que nos presenteie a todos e a todas com o maior dos presentes: o direito de sonhar com dias em que viveremos num mundo mais inclusivo, democrático e colorido. Voa, Fortaleza.
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