É hora de enfrentar a velha partida da lavagem de dinheiro no esporte
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Participei, a convite do especialista em conformidade, Fred Justo, do Legitimuz Day, em Brasília - um evento necessário e urgente. O tema central foi a prevenção à lavagem de dinheiro no contexto esportivo (PLD). E a constatação que emergiu do debate é clara: o problema não é novo. Apenas mudou de forma.
O esporte, desde os anos 1970 e 1980, tem sido um terreno fértil para a lavagem. Clubes e federações foram usados como estruturas de fachada para movimentar capitais de origem ilícita, especialmente em países onde o futebol se misturava à política e aos grandes negócios.
Durante décadas, a baixa transparência contábil, o grande volume de transações em espécie e a intermediação por agentes e empresas de fachada criaram um ambiente ideal para ocultação de recursos. O esporte oferecia liquidez, visibilidade e pouca fiscalização - a combinação perfeita para quem precisava dar aparência legal ao dinheiro sujo.
Nos anos 1990, com a globalização e o surgimento dos clubes-empresa, o risco se sofisticou. Empresas offshore passaram a adquirir direitos econômicos de jogadores, abrindo espaço para a triangulação de valores entre países. Clubes pequenos de Portugal e Espanha foram usados como pontes de lavagem, e o Parlamento Europeu chegou a tratar o tema em relatórios específicos antes mesmo da explosão das apostas esportivas.
O relatório do GAFI (FATF) de 2009, Money Laundering through the Football Sector, marcou o reconhecimento internacional do problema. O documento listou patrocínios fictícios, transferências artificiais e agentes sem licença como instrumentos típicos de lavagem. Desde então, o futebol passou a ser considerado um setor de alto risco.
No Brasil, o tema se repete com sotaque próprio. Desde os anos 1990, investigações revelam o uso de clubes e fundações esportivas para movimentar recursos ilícitos. Contratos de patrocínio superfaturados, direitos de imagem inflados e transferências simuladas foram — e ainda são — mecanismos de ocultação de valores. A Operação Bola de Ouro, deflagrada pela Polícia Federal em 2013, escancarou parte dessa engrenagem.
Hoje, o cenário muda de campo, mas não de lógica. A lavagem pode migrar do caixa do clube para o aplicativo de apostas, aproveitando a instantaneidade e o alcance global das plataformas digitais. A tecnologia apenas acelerou o mesmo roteiro: inserir recursos ilícitos, misturar com fluxos legítimos e reintegrar ao sistema com aparência lícita.
As apostas, em outras palavras, são o novo estágio da velha partida da lavagem de dinheiro.
Debate urgente
E há avanços importantes, como os trazidos nos debates que tive com Giovanni Rocco, Secretário Nacional de Apostas do Ministério do Esporte, Matias Mendez, Diretor Técnico de Integridade e Fernando Vasconcellos, diretor de Integridade do Rei do Pitaco.
Além de alinhar o setor às recomendações internacionais do GAFI/FATF, o Brasil incorporou mecanismos legais robustos para prevenir a lavagem de dinheiro por meio das apostas esportivas. As portarias SPA/MF nº 1.143 e MF nº 827/2024 e a Circular 3978 impuseram às operadoras a adoção de programas de PLD/FT com regras claras de identificação e verificação do apostador (KYC), obrigando a vinculação das contas de jogo ao CPF e a proibição do uso de cartões de crédito ou meios de pagamento anônimos. A medida visa impedir a utilização de recursos de origem ilícita e assegurar a rastreabilidade integral das transações. As operadoras devem ainda comunicar operações suspeitas ao COAF, manter auditorias independentes e estruturar programas de compliance com governança autônoma, aproximando o setor de apostas das exigências aplicáveis ao sistema financeiro. Trata-se de uma virada regulatória que insere o jogo legal no mesmo patamar de controle e transparência exigido de bancos e fintechs.
A operação Carbono Oculto
A Operação Carbono Oculto, deflagrada pela Receita Federal na última semana, reforça esse alerta. A investigação revelou que o PCC criou fintechs próprias, atuando como verdadeiros bancos paralelos, movimentando mais de R$ 40 bilhões em recursos ilícitos.
Essas plataformas, vendidas ao mercado como startups inovadoras, permitiam abertura instantânea de contas, pulverização de transferências e o uso de fundos de investimento e contas-bolsão que mascaravam a origem criminosa dos valores. Um sistema sofisticado, mas eficiente também para lavagem de dinheiro em larga escala, que pode atingir setores como o esportivo.
O futebol, com suas cifras milionárias e ainda baixa transparência em algumas operações, torna-se um alvo natural. Contratos de atletas inflados, patrocínios sem rigor de auditoria e investimentos em SAFs sem due diligence adequada criam a cortina perfeita para o capital de origem duvidosa. O caso é um lembrete de que o crime organizado é ágil, inovador e se antecipa às regulações — e o esporte não pode permanecer vulnerável.
A palavra é INTEGRIDADE
Combater esse risco exige mais do que leis ou investigações pontuais. Exige integração entre clubes, federações, plataformas, intermediários e órgãos financeiros.
A política de PLD no esporte precisa ser transversal e efetiva - baseada em governança, rastreabilidade e educação ética.
O esporte não pode continuar servindo de fachada para o dinheiro que não pode aparecer. Transparência é mais do que uma obrigação: é o que mantém o jogo limpo e digno de ser jogado.
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