Goleiro vence no TST e garante direito a adicional noturno. Entenda decisão
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O Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu, de forma unânime, que o goleiro Roberto Volpato, ex-Ponte Preta, tem direito a receber adicional noturno pelo período em que atuou entre 2012 e 2014. A decisão da Segunda Turma representa um marco jurídico importante: mesmo com a existência de uma legislação específica — a chamada Lei Pelé (Lei 9.615/1998) —, o tribunal aplicou diretamente a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ao caso.
Importante entender que o processo é anterior a entrada em vigor da nova Lei Geral do Esporte, de 2023.
A especialista em Direito Desportivo Ana Mizutori destaca que a nova Lei Geral do Esporte (Lei 14.597/2023) trouxe avanços importantes nesse tema. "A Lei Geral do Esporte trouxe uma inovação importante ao prever, de forma expressa, o direito ao adicional noturno para atletas profissionais de futebol. Agora, o atleta profissional que atuar entre 23h59 e 6h59 terá direito a um acréscimo de 20% sobre a hora normal, além de ter o tempo noturno computado com base em 52 minutos e 30 segundos por hora, seguindo o padrão da CLT", explica.
Até a decisão do TST, tribunais inferiores costumavam negar esse tipo de pedido com base na lógica de que o futebol possui regras próprias e que a Lei Pelé, como norma específica, deveria prevalecer sobre a CLT. Foi o que ocorreu com o próprio Volpato: tanto a sentença de primeiro grau quanto o julgamento no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região haviam rejeitado sua demanda.
A reviravolta no TST, porém, pode abrir caminho para uma nova interpretação sobre os direitos trabalhistas dos atletas — sobretudo nos casos em que a legislação esportiva é omissa. Ou seja, anteriores à Lei de 2023. E isso pode ter desdobramentos importantes, já que é comum que jogadores disputem partidas em horários noturnos, definidos em grande parte por exigências da grade televisiva.
Para o advogado Rafael Teixeira, especialista em Direito Desportivo, o tema é complexo e longe de ser pacificado. "Há anos as decisões de instâncias diversas da Justiça do Trabalho divergem quanto a conceder ou não o adicional noturno aplicando a CLT subsidiariamente."
Segundo ele, mesmo a doutrina especializada tem opiniões distintas. "Entendíamos em nosso livro Curso de Direito do Trabalho Desportivo que o adicional noturno com aplicação subsidiária da CLT existe somente para os atletas hipossuficientes da escala de Série C do Brasileiro para baixo ou se o empregador submete os seus jogadores, mesmo de Séries A e B, a fazerem treinos ou jogos no horário noturno sem partidas oficiais", detalha.
Ainda assim, Teixeira considera que a decisão do TST está longe de ser absurda. "Não é absurdo quando a Justiça do Trabalho decide conceder o adicional noturno conforme a CLT, já que a Lei Pelé não detém norma específica e abre total interpretação sobre a aplicação do adicional ou não nos termos da Consolidação."
Ele ressalta, no entanto, que a decisão não deve ser aplicada automaticamente a todos os casos. "Esta decisão não deve ser precedente para os casos ajuizados após o vigor da Lei Geral do Esporte, pois esta regulamenta detalhadamente outro tipo de adicional noturno para os atletas, diferente do previsto na CLT", conclui.
E os clubes, como ficam?
Na prática, a decisão não impede a realização de partidas noturnas, mas exige atenção dos clubes às normas da CLT, tradicionalmente ignoradas no contexto esportivo sob o argumento de um "regime especial" garantido pela Lei Pelé. Para garantir segurança jurídica, pode ser necessário revisar contratos ou até mesmo ajustar a legislação esportiva.
"Trata-se de um tema controverso, uma vez que a derrogada Lei Pelé não faz menção expressa sobre o tema, o que ocasionou inúmeros litígios e divergências sobre a aplicação da CLT aos atletas. Alguns tribunais já vinham reconhecendo esse direito com base na habitualidade do trabalho em horários noturnos", reforça Mizutori.
Com a vigência da nova Lei Geral do Esporte, ela acredita que haverá mais clareza. "Espera-se maior segurança jurídica, tanto para atletas quanto para clubes. Contudo, ainda assim, há discussões sobre a possibilidade de aplicar esse adicional a outras modalidades esportivas, o que pode ser decidido por acordos coletivos", conclui.
Atleta é trabalhador?
Embora pareça uma resposta óbvia, essa não foi uma unanimidade no meio jurídico por muito tempo. A Lei Pelé criou um contrato especial de trabalho esportivo, com regras próprias que convivem — nem sempre de forma pacífica — com as disposições da CLT.
A decisão do TST reforça a interpretação de que, na ausência de norma específica, aplicam-se as garantias gerais da legislação trabalhista. Em outras palavras, o atleta profissional é sim, um trabalhador — ainda que sua atividade tenha especificidades.
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