Especialistas não acreditam em exclusão da Copa por afastamento de Ednaldo
Ler resumo da notícia
O afastamento de Ednaldo Rodrigues da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) pela Justiça do Rio de Janeiro provoca repercussões internacionais. Fifa e Conmebol acompanham de perto a movimentação jurídica que ainda não terminou. Nos regulamentos do futebol, é proibida a interferência externa em assuntos do futebol, o que poderia gerar punições.
O afastamento de Ednaldo Rodrigues da presidência da CBF - em tese - poderia trazer consequências diretas para o futebol brasileiro, como por exemplo, a exclusão da Copa do Mundo de 2026 e outras competições organizadas pela FIFA. Isso porque a entidade proíbe expressamente qualquer interferência da Justiça Comum na administração das confederações.
"A FIFA governa um sistema associativo privado e insere em seus regulamentos a ameaça de desfiliação das federações vinculadas em caso de interferência da justiça estatal em questões internas, o que comprometeria sua autonomia. Com a CBF desfiliada, o Brasil ficaria impedido de participar de competições da FIFA. Aliás, foi exatamente esse risco que motivou a concessão, por parte da Corte, da liminar mantendo o dirigente no cargo no início do ano", afirma o advogado especialista em direito desportivo e professor de direito Carlos Henrique Ramos.
A advogada Fernanda Soares, mestre em direito e colunista do Lei em Campo, concorda, mas lembra que uma decisão como afastamento de uma seleção como a brasileira depende também de outras questões: "A FIFA pode, em teoria, punir a CBF com a exclusão do Brasil de competições internacionais, incluindo a Copa do Mundo, caso considere que o afastamento de Ednaldo Rodrigues da presidência da CBF por decisão judicial constitui uma "interferência indevida de terceiros". Isso está previsto nos artigos 14 e 19 do Estatuto da FIFA, que exigem que as federações filiadas, como a CBF, gerenciem seus assuntos de forma independente, sem influência de entidades externas, incluindo a Justiça Comum. No entanto, a probabilidade e os desdobramentos dessa punição dependem de vários fatores, como o contexto político, os interesses comerciais e as ações da CBF e da FIFA", diz ela.
Todos os advogados ouvidos lembram que a situação é delicada e expõe um paradoxo: como exigir lisura na governança do futebol sem recorrer ao Judiciário, quando a própria entidade não garante mecanismos internos eficazes de controle?
"Existe um paradoxo: a CBF, que deveria ter mecanismos internos de integridade e autorregulação, não age — e a omissão da própria entidade abre espaço para que o Estado atue. Nesse cenário, o que está em jogo não é a independência do futebol, mas a legalidade que sustenta qualquer gestão democrática", afirma Gustavo Lopes, advogado e professor de direito desportivo.
Essa não é a primeira vez que o futebol brasileiro se encontra 'ameaçado' por uma punição da FIFA. No fim de 2023, a entidade máxima do futebol enviou um comunicado à CBF alertando sobre artigos do seu estatuto, entre eles, o que proíbe suas federações membros de sofrerem interferência de terceiros na resolução de conflitos internos.
O ofício da FIFA foi enviado às vésperas do julgamento da Justiça do Rio de Janeiro de uma ação liderada pelos ex-presidentes Marco Polo Del Nero e Ricardo Teixeira que questionavam a legalidade do TAC celebrado entre a entidade e o MP-RJ que alterou as regras eleitorais da confederação. Após essa alteração, houve a eleição em que Ednaldo Rodrigues foi escolhido presidente.
Relembre casos recentes de punições da FIFA em confederações nacionais
Federação do Chade (África)
Em 2021, os chadianos foram suspensos após interferência governamental na federação de futebol. O governo do país retirou os poderes da associação de futebol local e criou um comitê nacional para comandar a pasta, o que contraria o regulamento da FIFA. Na época, o governo de Chade alegou falhas na comunicação e preocupação sobre a forma com que a entidade é comandada.
Em março do mesmo ano, a Confederação Africana de Futebol excluiu Chade da Copa Africana de Nações por conta da interferência.
Federação do Paquistão (Ásia)
No caso do Paquistão o problema foi ainda mais grave. A federação do país vivia uma disputa de dois grupos políticos. Em setembro de 2019, a FIFA havia criado um comitê de normalização para controlar a situação e coordenar eleições na entidade.
Porém, em março de 2021, o grupo do candidato Syed Ashfaq Hussain Shah invadiu a sede da federação, em Lahore, alegando vitória nas eleições e tomou os poderes do presidente do comitê, Haroon Malik.
A FIFA chegou a dar um prazo para que o grupo deixasse o comando da entidade, mas a determinação foi ignorada e a federação acabou sendo punida. Na época, a entidade máxima do futebol afirmou que a suspensão só será retirada se o comitê de normalização informar a retomada completa das "premissas, contas, administração e canais de comunicação" da federação.
Como está a CBF
Com o afastamento de Ednaldo nesta quinta (15), Fernando Sarney assumiu como interventor e prometeu convocar eleições o "mais rapidamente possível"em comunicado oficial.
Ainda na noite de quinta, Ednaldo Rodrigues entrou com pedido de medida cautelar no Supremo Tribunal Federal para suspender os efeitos da decisão do TJ-RJ, que o afastou da presidência da entidade. E mais: caso o pedido não seja acolhido, ele solicita que o ministro Gilmar Mendes reconheça como ilegal a nomeação de Fernando Sarney como interventor da CBF. A disputa pelo comando do futebol brasileiro ganhou novo capítulo — e agora envolve diretamente a mais alta Corte do país.
No próximo dia 28, o Supremo Tribunal Federal (STF) dará continuidade ao julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7580, em que avalia a legitimidade do Ministério Público para firmar Termos de Ajuste de Conduta (TACs) com entidades esportivas. A decisão também é importante para o futuro da CBF.
Nos siga nas redes sociais: @leiemcampo
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.