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Pernambuco avança no combate ao preconceito dentro de arenas esportivas

14/12/2021 11h30

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Por Gabriel Coccetrone

O Estado do Pernambuco deu um importante passo no combate ao preconceito nos estádios de futebol. Mais do que isso, reforçou que não é um espaço onde a legislação está ausente. Na última sexta-feira (10), foi publicado no Diário Oficial do estado uma lei que pune quem praticar racismo, LGBTfobia ou misoginia em lugares onde são realizados eventos esportivos. Para o torcedor, a penalidade se dá na aplicação de multa que pode chegar até R$ 1 mil, enquanto para os clubes o valor vai até R$ 20 mil.

Mônica Sapucaia, advogada especialista em direito humanos, elogia a medida e reforça que além da punição financeira também há previsão de sanções na esfera penal.

"É uma excelente iniciativa, porque coloca em debate a questão das ofensas em atividades esportivas e rechaça essa ideia que xingamentos preconceituosos são parte do evento. Vale ressaltar que o crime de racismo é inafiançável e essa penalidade civil não impede as ações penais, assim como as relacionadas as violências contra mulher e a homofobia, apenas reforça que a sociedade não irá aceitar que o esporte seja utilizado como vitrine para violação de direitos humanos", afirma.

"Mais uma vez o Estado de Pernambuco dá um belo exemplo a ser seguido pelos demais estados da federação, promulgando a Lei Nº 17.522. Foi em Pernambuco que surgiu um dos primeiros Juizados Especiais do Torcedor (Juizado Cível e Criminal do Torcedor de Recife), criado em 2006 e pioneiro no tratamento de pequenas infrações em eventos esportivos. Bastante atuante, foi responsável direto pela redução dos índices de violência nos estádios, fato que afastava o público, especialmente as famílias, das partidas de futebol", ressalta Eric Azeredo, advogado especializado em direito trabalhista.

"O jargão popular de que 'o que acontece em campo, fica no campo', no que de forma extensiva entende-se como a estrutura do estádio como um todo, nunca foi tão absurdo e ultrapassado! O futebol pertence à sociedade, ao povo, no que tais atos e manifestações ali presentes ecoam de uma forma muito mais rápida e com uma visibilidade muito maior do que em outros eventos públicos. Em muitas vezes, a voz 'das arquibancadas' reflete uma parte da sociedade e seus anseios, seu grito de esperança e inconformismo, mas invariavelmente há ainda uma outra parte considerável que se mantém preconceituosa, ultrapassada e que não acompanhou as transformações que ocorreram ao longo de décadas em nossa sociedade", acrescenta.

A Lei 17.522 também apresenta diretrizes para o poder público agir no combate ao assédio sexual nesses ambientes. A legislação, promulgada pelo presidente da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), deputado Eriberto Medeiros (PP), considerada racismo qualquer tipo de manifestação "ofensiva, violenta, constrangedora, intimidatória ou vexatória, de ordem moral, ética, filosófica ou psicológica, resultante de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, ainda que não seja dirigida a pessoa ou grupo determinado".

De acordo com a legislação, a punição para LGBTfobia será aplicada para quem realizar "qualquer tipo de manifestação ou ação ofensiva, violenta, constrangedora, intimidatória ou vexatória", enquanto para violência contra a mulher haverá sanção a atos de "preconceito de gênero ou da condição feminina".

É preciso destacar ainda que a lei também é válida para manifestações não verbais, como cartazes, bandeiras e símbolos.

Casos de discriminação viram pauta no STJD

Neste ano, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) passou a dar mais atenção para casos de preconceito nos estádios brasileiros. Recentemente, o tribunal puniu o Flamengo com uma multa de R$ 50 mil por conta de cantos homofóbicos de torcedores durante a partida contra o Grêmio, pela Copa do Brasil.

O caso foi parar no STJD depois que o Coletivo de Torcidas Canarinhos LGBTQ apresentou uma Notícia de Infração dias após a realização da partida, apresentando imagens mostrando torcedores do Flamengo cantando músicas com teor discriminatório contra a equipe gaúcha. A Procuradoria então deu procedência para a denúncia e enquadrou o clube no artigo 243-G do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD).

O que diz o art. 243-G do CBJD?

Art. 243-G. Praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: (Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009).

PENA: suspensão de cinco a dez partidas, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão pelo prazo de cento e vinte a trezentos e sessenta dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural submetida a este Código, além de multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais).

§ 1º Caso a infração prevista neste artigo seja praticada simultaneamente por considerável número de pessoas vinculadas a uma mesma entidade de prática desportiva, está também será punida com a perda do número de pontos atribuídos a uma vitória no regulamento da competição, independentemente do resultado da partida, prova ou equivalente, e, na reincidência, com a perda do dobro do número de pontos atribuídos a uma vitória no regulamento da competição, independentemente do resultado da partida, prova ou equivalente; caso não haja atribuição de pontos pelo regulamento da competição, a entidade de prática desportiva será excluída da competição, torneio ou equivalente.

§ 2º A pena de multa prevista neste artigo poderá ser aplicada à entidade de prática desportiva cuja torcida praticar os atos discriminatórios nele tipificados, e os torcedores identificados ficarão proibidos de ingressar na respectiva praça esportiva pelo prazo mínimo de setecentos e vinte dias.

§ 3º Quando a infração for considerada de extrema gravidade, o órgão judicante poderá aplicar as penas dos incisos V, VII e XI do art. 170.

No julgamento, a Procuradoria relembrou o emblemático caso em que o próprio Grêmio, em 2014, foi excluído da Copa do Brasil porque seus torcedores proferiram gritos racistas contra o goleiro Aranha, na época do Santos.

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