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Lei em Campo

MP vai muito além das transmissões. E atletas não se deram conta do risco

12/07/2020 10h52

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Andrei Kampff

No direito e na vida, nada "menor" deixa de ser importante. Muitas vezes alguém pode se dar muito bem - e outros se prejudicarem - com essa ideia perigosa. A MP 984, por exemplo, vai além dos direitos de transmissão. Ali no meio, quase escondido, trata de outra questão importantíssima para os atletas, mas que muito pouca gente tem discutido: o repasse para os atletas do percentual legal sobre esses direitos de transmissão deixa de ser via sindicato, e volta a ser responsabilidade dos clubes.

Funcionava assim, conforme a Lei Pelé, 5% dos valores da negociação dos direitos de transmissão iam direito para os sindicatos, que repassavam para os atletas.

O dinheiro estava no sindicato, e os atletas recebiam esse direito. Há uma discussão sobre tempo para repasse e uma devida correção monetária, mas o dinheiro eles recebiam.

O procurador de Justiça e colunista do Lei em Campo, Martinho Miranda, lembra que "essa intermediação dos sindicatos é importante, porque o jogador fica protegido do desconfortável processo de cobrança dos valores devidos junto ao seu empregador, enquanto lhe presta os seus serviços."

E agora?

Agora, o clube vai fazer esse pagamento.

Todo mundo sabe que muitos clubes brasileiros não estão classificados como bons pagadores.

E esse artigo da MP traz um agravante.

A verba, de acordo com a Lei Pelé, tem natureza civil, não é considerada salário. E isso muda muita coisa.

O clube que não repassar esses valores não fica sujeito a perder o jogador por inadimplemento, como acontece se não pagar o salário, na forma do art. 31 da Lei Pelé (é verdade que é raro a gente ver isso acontecer, mas existe caminho legal).

Martinho também está preocupado: "Se ainda assim são costumeiros os atrasos salariais, imagine o que farão com o direito de arena? Nessa hipótese, só restará ao atleta recorrer à justiça cível, numa ação ordinária de cobrança, que se andar rápido, não deverá durar menos de dez anos".

E ele faz um alerta, que também me causou preocupação: " pior de tudo é que, na prática, esse direito dos jogadores certamente irá desaparecer, uma vez que os clubes deverão, ao celebrarem os contratos de trabalho, exigir que os atletas abram mão dessa verba, pois como se trata de uma remuneração de cunho civilista, ela é renunciável por parte de seu titular."

A MP 984 provocou um tsunami no direito esportivo e no negocio do esporte. Basta ver como o futebol tem sido discutido na justiça nos últimos dias. Mas ela pode provocar também perdas de direitos aos atletas.

E se ela não tinha nada de urgente quando da sua edição, passou a ser urgente que se debata e se entenda tudo que ela pode alterar.

Nessa hora, mobilização é a palavra de ordem. Para todos do movimento esportivo. A discussão esta no Congresso, e ela não pode se dar sem os mais atingidos pela MP.

Entender o que está em jogo com essa MP, inclusive perdido no meio de outras questões "maiores", é fundamental nessa hora.

Depois de aprovado, qualquer discussão perde força.

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