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Proibição para russos competirem sob bandeira neutra pode gerar ação no TAS

01/07/2020 04h03

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Por Thiago Braga


Nesta quarta-feira (1º), chega ao fim o prazo dado pela World Athletics para que a Federação Russa de Atletismo (RusAF) pague a primeira metade da multa imposta pela entidade que rege o atletismo por causa das inúmeras violações russas às regras antidoping. Se a parcela de U$S 5 milhões não for paga, a World Athletics ameaça impedir que os atletas russos que não foram flagrados em exames antidoping participem da Olimpíada de Tóquio, em julho do ano que vem, sob bandeira neutra.

A punição tem origem no esquema de doping institucional patrocinado pelo governo russo e que em dezembro do ano passado fez com que a Agência Mundial Antidoping (Wada) decidisse excluir a Rússia de grandes competições esportivas durante quatro anos por falsificação de dados dos controles entregues à entidade.

"A exclusão da participação de atletas sobre os quais não recai nenhuma condenação por violação às regras antidopagem, especialmente aqueles que tem cumprido com as exigências impostas pela federação internacional, expõe a cruel face do sistema piramidal e exclusivista do sistema esportivo. A corda arrebenta no lado mais fraco", analisa o especialista em direito esportivo Vinícius Calixto.

Embora a decisão da World Athletics seja polêmica, ela não pode ser interpretada como uma violação aos Direitos Humanos.

"Esse atleta é oriundo daquele país. A Federação Internacional tem a prerrogativa de decidir quais países estão autorizados a participar a partir de um compromisso ético e, se aquele atleta, faz parte daquela confederação e aquela confederação foi suspensa, ele vai ser suspenso junto. Isso não é uma violação dos Direitos Humanos. A gente pode concluir que isso é uma injustiça porque você acaba penalizando os bons atletas, penalizando as pessoas que não estavam envolvidas nesse tipo de ação ilícita, mas aí é o preço que se paga quando essas relações são nacionais. Não é uma uma violação dos Direitos Humanos, porque essa condição de pertencimento tem bônus e tem ônus. Nós não temos mecanismos suficientes para garantir a esses atletas a condição de competirem mesmo não sendo responsáveis", explica a advogada Monica Sapucaia Machado, Direito Político e Econômico e pesquisadora do grupo de pesquisa Mulher, Sociedade e Direitos Humanos.

O preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos esclarece a questão ao dizer "que os Estados-Membros se comprometeram a promover, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades humanas fundamentais e a observância desses direitos e liberdades".

A Federação Russa de Atletismo alega não ter fundos para pagar a multa e, por isso, encaminhou nesta terça-feira carta para a World Athletics pedindo que a entidade adie indefinidamente o pagamento da multa.

"Nossos apelos, que foram enviados ao Mundial de Atletismo, permaneceram sem resposta, infelizmente", disse o presidente da RusAF, Yevgeny Yurchenko, em uma carta dirigida ao corpo governante mundial de atletismo. "É por isso que hoje estamos dirigindo nosso apelo não apenas ao chefe do atletismo mundial, Sebastian Coe, mas também ao Conselho Mundial de Atletismo, em nossa carta aberta em nome de todos os membros da RusAF."

Também no dia 30, uma Comissão de Atletas russos enviou carta à Comissão de Atletas do COI, à Comissão de Atletas da WADA e à World Athletics, pedindo que as entidades reconsiderem a decisão.

"O direito de atletas puros de participar de competições é a base do esporte internacional e do movimento olímpico. No entanto, no momento, o direito legal dos atletas russos depende diretamente do pagamento de uma multa pela federação nacional. O princípio da responsabilidade coletiva por incidentes se aplica a eles, com o qual os atletas não têm nenhuma relação. Finalmente, a seletividade e os critérios pelos quais não mais de 10 atletas puros da Rússia podem participar de partidas internacionais são inexplicáveis. Acreditamos que as sanções por violações cometidas pela liderança da federação nacional não podem e não devem infringir os direitos básicos dos atletas puros e constituem motivos para privá-los da prática competitiva", diz trecho do documento.

Se nenhum dos apelos surtir o efeito esperado pelos atletas, a única saída para quem se julgar prejudicado será entrar com uma ação no Tribunal Arbitral do Esporte (TAS), na Suíça, para poder competir na Olimpíada do ano que vem.

"Condicionar a participação de atletas a uma prestação pecuniária não deverá ser uma prática tolerada pelo TAS, caso a discussão chegue até lá", resume o advogado especialista em direito esportivo Jean Nicolau.

Vale lembrar que a Agência Antidoping Russa (Rusada) já entrou com uma ação na corte suíça contra a proibição de quatro anos do país para as Olimpíadas e outros grandes eventos esportivos. A apelação russa será julgada no início do próximo de novembro deste ano, segundo informou o TAS. A sanção também impede que a Rússia sedie qualquer evento esportivo pelos próximos quatro anos.

Outra aliada de peso dos atletas russos que não se doparam é a bicampeã olímpica e sete vezes campeã mundial Yelena Isinbayeva. A ex-saltadora escreveu um manifesto ao presidente da World Athletics, Sebastian Coe, e ao presidente do COI, Thomas Bach, ressaltando que a suspensão de todos os atletas russos seria uma "violação grave do princípio esportivo e dos direitos dos esportistas limpos".

"Em nossa opinião, o castigo deve ser aplicado para a Federação, não para os atletas. Privar-nos da oportunidade de atuar em competições internacionais é uma punição inaceitável e excessiva, aplicando o princípio da responsabilidade coletiva, forçando-nos a assumir erros cometidos por terceiros", disparou a russa, em um dos trechos do comunicado que foi assinado por outros atletas.

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