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Julio Gomes

Absolvição do Manchester City desmoraliza fair play financeiro da Uefa

13/07/2020 09h07

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O TAS (Trbunal Arbitral do Esporte) decidiu nesta segunda cassar a punição da Uefa ao Manchester City, que tirava o clube inglês das próximas duas edições das competições europeias (ou seja, da Champions League). No lugar da pena esportiva, uma multa de 10 milhões de euros - valor três vezes menor que o estipulado inicialmente.

A decisão coloca em xeque as regras do fair play financeiro da Uefa. Vamos, falando o português bem claro, é a desmoralização completa. Na Inglaterra, já há comentaristas defendendo que sejam revistas as leis. Afinal, se é para ter e não valer... ou o pior, valer só para alguns...

"A credibilidade do fair play financeiro está em frangalhos", analisou o editor de esportes da BBC, Dan Roan. "Como a regra vai sobreviver após um dos clubes mais ricos do mundo ser culpado de atrapalhar as investigações da Uefa e se sair só com uma multa de 10 milhões de euros?", questionou. "A decisão mostra como ficou difícil aplicar as regras".

Os especialistas sobre o tema estão aqui, no blog Lei em Campo, que deu a notícia em primeira mão nesta segunda-feira. Mas o meu questionamento é o mesmo que faz a mídia inglesa. Como agir a partir de agora? Ou vão precisar endurecer ou flexibilizar o fair play, porque, do jeito que está, serve só para alguns - os menos poderosos e influentes - e não atinge outros tantos, que são os que realmente precisam ser controlados.

Quando a punição foi anunciada, eu chamei de "hipocrisia" aqui neste blog. Muitos interpretaram de forma equivocada, achavam que eu estava defendendo a picaretagem praticada pelo City. Não era isso. Eu apenas dizia que, em um futebol recheado de picaretagem, era hipócrita a decisão de punir apenas um, e justamente um que incomoda outros players importantes da Europa.

Eu acabei aquele texto dizendo:

"Não acho, muito longe disso, que o Manchester City seja santo. Também não gosto de como o dinheiro vindo de sacos sem fundo interfere em competições desse jeito. Não sou contra o fair play financeiro. Mas ou libera geral o capitalismo selvagem no futebol ou controla melhor, muito melhor, que é o desejável. Ficar nesse meio caminho, a serviço das marcas já consolidadas, a serviço de um grupinho, é apenas hipocrisia."

Vamos lembrar do que o City é acusado? Basicamente de inflar no orçamento o dinheiro recebido por um patrocinador que, na real, pertence ao dono do clube. E de não contribuir com as investigações. Ele foi absolvido da primeira, que é a mais grave, e vai pagar uma multa pela segunda. Dinheiro de pinga.

Aliás, melhor dizendo. Não é que ele foi exatamente absolvido da primeira acusação, o TAS anunciou que há provas inconclusivas e que tratam de fatos fora do período de investigação. O tribunal irá explicar a sentença nos próximos dias. Ainda por cima, deixou no ar que o City cometeu, sim, irregularidades, mas que a investigação da Uefa foi, digamos, juridicamente frágil. O City argumenta que o caso foi uma "perseguição" e montado em provas "obtidas ilegalmente".

No meu ponto de vista, ao fazer o que fez, o TAS praticamente jogou no lixo o fair play financeiro da Uefa. Eu esperava uma redução da pena para, talvez, uma Champions de punição em vez de duas. Nem o clube esperava uma notícia tão favorável nesta segunda.

A Uefa ficou literalmente sem palavras. Em um seco e curto comunicado oficial, apenas disse que "o fair play financeiro tem um importante papel na proteção dos clubes para dar a eles sustentabilidade financeira e seguirá fiel aos seus princípios".

Vamos ver quais serão os próximos passos. Mas os grandes "gastões" do futebol europeu, que colocam nos clubes rios de dinheiro de procedência discutível, estão gargalhando no momento. A Uefa, se é mesmo que esteja interessada em combatê-los, ficou com a casca de banana na mão.