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Fábio Seixas

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Pílulas do Dia Seguinte: F1 de 2022 é um drama bom de acompanhar

O holandês Max Verstappen, da Red Bull, no pódio do GP de Miami - Fórmula 1
O holandês Max Verstappen, da Red Bull, no pódio do GP de Miami Imagem: Fórmula 1

Colunista do UOL

09/05/2022 11h07

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Passadas cinco etapas, o 73º Campeonato Mundial de F1 ganhou um roteiro bem delineado. De um lado, uma Red Bull mais veloz, mas com um carro que vive quebrando. Do outro, uma Ferrari consistente, marcando pontos com regularidade, mas que peca em ritmo de corrida. Não existe ainda a equipe perfeita em 2022, como já vimos em tantas temporadas. Os dois times que disputam o título têm seus defeitos, e isso cria um drama bom de acompanhar;

Verstappen foi de uma frieza admirável ao analisar a vitória em Miami. Não se deixou levar pela festa, pelas serpentinas no pódio, pelos tapinhas nas costas. Foi preciso: "Ainda há problemas que precisamos resolver. Fomos rápidos, mas minha sexta-feira foi terrível e o Checo teve problemas na corrida. O carro tem potencial, mas precisa ser confiável";

Na sexta, o holandês completou apenas 15 voltas. Sofreu com superaquecimento no primeiro treino, teve de trocar o câmbio, e foi vítima de uma pane hidráulica na segunda sessão. Cenário ruim em qualquer lugar, pior ainda num circuito novo para todos. "Eu não sabia o que esperar da largada porque não consegui fazer nenhuma simulação", contou. No domingo, Pérez sofreu com a falha de um sensor num cilindro do motor e perdeu ritmo justamente quando tentava ultrapassar Sainz pelo terceiro lugar. "Perdi sete segundos em duas voltas. A diferença nas retas ficou enorme. Aquilo acabou com a minha corrida", explicou o mexicano;

É a sina do "tudo ou nada", como escrevi antes da corrida. Verstappen venceu todas as corridas que conseguiu terminar, incluindo a sprint de Ímola. Quando não venceu _Bahrein e Austrália_, é porque ficou pelo caminho, com problemas no carro. Não existe meio termo, e isso incomoda o campeão. Ele sabe que esses pontos podem fazer falta no fim do ano;

Já a Ferrari tentou manter a cabeça em pé, assimilar o baque. Não é fácil digerir uma derrota sacramentada em apenas nove voltas quando se tem o domínio da primeira fila. A escuderia levou uma nova asa traseira a Miami para tentar ser mais competitiva nas retas, mas não foi suficiente. Ficou claro nas primeiras voltas: na tentativa de fugir de Verstappen, Leclerc esbagaçou o pneu dianteiro direito. No mano a mano, o F1-75 ainda deve para o RB18;

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Charles Leclerc, da Ferrari, com o troféu pela segunda posição no GP de Miami
Imagem: Fórmula 1

A Ferrari poderia ter tentado uma cartada no fim da corrida, após o acidente entre Norris e Gasly: chamar Leclerc para os boxes e colocar pneus novos para um ataque nas últimas voltas. Mas deu azar. Quando o safety car foi acionado, ele tinha acabado de passar pela entrada dos pits. Horner admitiu, após o GP, que o pitwall da Red Bull ficou apreensivo com a possibilidade;

"Temos que continuar trabalhando. É importante manter as evoluções no carro. Hoje eles tinham mais ritmo", disse Leclerc, visivelmente abalado. "Não podemos estar completamente felizes. Nossos adversários eram décimos de segundo mais velozes a cada volta. Somos líderes dos dois campeonatos, mas está claro que precisamos reagir", completou seu chefe, Binotto.;

A escuderia não falou publicamente sobre o assunto, mas a moleza de Sainz teve um papel importante na corrida. Como teria sido se ele tivesse conseguido segurar Verstappen por duas ou três voltas? E não adianta alegar falta de ritmo de prova ou de velocidade nas retas. A vantagem do espanhol sobre o holandês no grid durou pouco metros. Faltaram agressividade, vontade, competência. Depois que renovou o contrato _ou justamente por causa disso, não sabemos os termos do acordo_, Sainz murchou como piloto;

E a Mercedes? Wolff disse após a prova que sua equipe é hoje a terceira força e que, de certa forma, está isolada nessa condição. Sim, o W13 evoluiu, os treinos e a corrida mostraram isso, e tenho a impressão de que Hamilton pegou a mão do carro. Para completar, um grande pacote de mudanças aerodinâmicas está saindo do forno e vai estrear em Barcelona. Talvez seja tarde demais para tentar fazer alguma graça em 2022, mas é vital entender este carro para se preparar para o futuro. Foi o que a Ferrari fez no ano passado, e deu muito certo;

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Lewis Hamilton e George Russell disputam posição no GP de Miami, quinta etapa do Mundial de F1
Imagem: Mercedes

Hamilton saiu da corrida bravo com Peter Bonnington, seu engenheiro. Quando o safety car entrou, Bono perguntou ao piloto o que ele queria fazer. Hamilton imediatamente chiou pelo rádio: "Este trabalho é de vocês!". Mais tarde, explicou: "Eu não tinha ideia de onde os outros pilotos estavam, eu não tinha as informações para tomar a decisão. Eles tinham os detalhes, eles deveriam ter tomado a decisão por mim", disse o heptacampeão após a corrida;

A bronca não é apenas por Miami. É pela recorrência. O heptacampeão terminou os quatro últimos GPs atrás de Russell. É um fato. Mas apenas em Jeddah foi por culpa exclusiva dele: tentou um acerto diferente e não passou do Q1. Em Melbourne e Miami, viu o companheiro ser agraciado por safety cars exatamente quando precisava, uma sorte danada. E, em Imola, Russell deu um salto na largada ao conseguir driblar o acidente entre Sainz e Ricciardo e fechar a primeira volta em sexto. Hamilton sabe de tudo isso. Mas é competitivo até o último fio de cabelo e está inconformado com a situação;

Boa parte do isolamento da Mercedes como terceira força do Mundial tem a ver com a McLaren. Em Miami, Norris estava em 14º quando acertou Gasly. Ricciardo, cada vez mais chocho, terminou em 13º. É muito meme em redes sociais e pouca efetividade;

Dois coadjuvantes merecem todos os aplausos em Miami. Ocon arrebentou o chassi no terceiro treino livre, não foi pra classificação, largou em último e terminou em oitavo. Albon largou em 18º e acabou em nono lugar;

Sobre Albon, uma história saborosa. Antes do GP da Austrália, ele foi pra Tailândia. Lá, visitou um orfanato e as crianças pintaram o cabelo dele de vermelho. Correu assim em Melbourne e marcou seu primeiro ponto no ano. Em Ímola, com o cabelo normal, bateu na trave, mas não pontuou: foi 11º. Em Miami, então, resolveu fazer um "teste": pintou o cabelo de vermelho de novo. Foi nono. Acho que vai ser assim, agora, até o fim do ano _ou da carreira;

Havia uma importante competição paralela ao GP de Miami: a corrida do marketing. Os EUA são o maior mercado da Ferrari, que queria muito triunfar ali, diante de um público que só faz crescer. Mas quem levou a melhor foi a Red Bull, líder na venda de energéticos naquele país, numa disputa direta contra a Monster, que patrocina Hamilton e a Mercedes;

Já que fomos por este caminho, vale uma avaliação do que vimos durante a semana em Miami. Na sanha para mostrar aos europeus que entendem de entretenimento, os organizadores do GP cometeram exageros. Aquela praia de mentirinha, com um monte de gente pouco ligando para o que acontecia na pista, passou uma mensagem errada. E o que eram aqueles "batedores" fantasiados de Jon Baker e Frank Poncherello antes do pódio? Nos números, o evento foi um sucesso: todos os ingressos vendidos, uma procissão de VIPs pelo paddock, uma "mistura de Grammy com Oscar", como alguém definiu. Na pista, há muito trabalho a ser feito para que as próximas edições sejam melhores. Mas não, Miami nunca será um palco digno de aplausos. Nenhuma pista em estacionamento de estádio jamais será.