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Fábio Seixas

REPORTAGEM

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"Precisamos de heróis", diz professor de pilotos da F-1 e da Indy

Primeira turma da Escola de Pilotagem Interlagos, em janeiro de 1977, com carros Fórmula Fitti Vê - Arquivo pessoal
Primeira turma da Escola de Pilotagem Interlagos, em janeiro de 1977, com carros Fórmula Fitti Vê Imagem: Arquivo pessoal

Colunista do UOL

11/06/2021 04h00

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Quanto vale uma vitória brasileira numa das maiores corridas do automobilismo?

Para Toninho de Souza, vale a esperança de dias melhores. Uma luz no fim do túnel. O sonho de voltar a ver sua escola funcionando.

"Só no domingo da vitória do Helinho em Indianápolis, foram 270 mensagens pelo Facebook. Muita molecada perguntando como faz para ser piloto", conta. "Tinha muito menino de 10, 11 anos, mas tinha até adulto de 70. A diferença que faz uma vitória numa prova de alto nível..."

toninhoso - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Toninho de Souza, da Escola de Pilotagem Interlagos
Imagem: Arquivo pessoal

Toninho é figura conhecida, e fundamental, do automobilismo brasileiro. Desde 1977 é dono da Escola de Pilotagem Interlagos, na avenida de mesmo nome, na boca do autódromo. Pelos seus carros, passaram nomes como Felipe Massa, Ricardo Zonta, Christian Fittipaldi, Bruno Junqueira, Cristiano da Matta, André Ribeiro...

"De um jeito ou de outro, acho que quase todos os pilotos que foram para as grandes categorias do automobilismo mundial passaram por aqui. Ou fazendo aulas ou usando nossos carros para treinar, para manter a forma. O próprio Rubinho, que morava aqui do lado, estava sempre brincando com um buggy que a gente tinha", conta.

Há 15 meses, porém, a garagem está silenciosa. Os negócios já não vinham muito bem, e a pandemia foi a gota d'água para a decisão de baixar as portas. Parte dos equipamentos está guardada, parte foi alugada para outras escolas, como a Alpie, que teimam em continuar.

Sim, teimosia é a palavra. Segundo Toninho, a procura de jovens por curso de pilotagem começou a despencar há mais ou menos dez anos. E não é coincidência. Tem ligação direta com a seca de resultados do Brasil nas principais categorias do automobilismo.

Na F-1, já são quase 12 anos de jejum. A última vitória do Brasil aconteceu em 2009, com Barrichello, no GP da Itália. Na Indy, a última grande conquista foi em 2013: a vitória de Tony Kanaan nas 500 Milhas.

"Eu já havia falado disso até com o Tamas e o Bernie", diz Toninho.

Tamas Rohonyi foi, por décadas, o promotor do GP Brasil. Bernie Ecclestone comandou comercialmente a F-1 até quatro anos atrás, quando a Liberty Media assumiu.

"O dia em que ficássemos sem pilotos na F-1, o automobilismo brasileiro iria despencar. Até dez anos atrás, tínhamos mais de 150 brasileiros correndo no exterior. Hoje são pouquíssimos", completa.

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Helio Castroneves comemora sua 4ª vitória nas 500 milhas
Imagem: USA TODAY Sports

Esta é a quarta temporada seguida sem um brasileiro na F-1. Nunca, desde a estreia de Emerson Fittipaldi, em 1970, o país havia passado um ano sem representantes na categoria.

Na Indy, nenhum brasileiro disputa neste ano o campeonato completo, apenas corridas pontuais.

O que (não) acontece lá fora, nas categorias de ponta, tem reflexo aqui, na base. Segundo Toninho, por todos os anos 80 e 90 sua escola manteve médias anuais de 200 a 250 alunos.

Na última década, esse número nunca passou de 100. "Tivemos anos com apenas 50, 60 alunos", diz.

Aos 78 anos, recuperado de duas paradas cardíacas que sofreu em 2019 —"tive que trocar todas as peças", conta, rindo—, o professor de gerações de pilotos brasileiros agora torce para que o aumento da procura por cursos de pilotagem agite o mercado. A ponto de ele e seu filho poderem, em breve, voltar a subir as portas da sua escola.

"Precisamos de heróis", resume Toninho.

Ah, sim: Castroneves, que há dois domingos venceu pela quarta vez as 500 Milhas de Indianápolis, também foi seu aluno.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Ao contrário do que a matéria informava, a última vitória brasileira na Indy foi de Tony Kanaan em 2013; não de Hélio Castroneves em 2009. O erro foi corrigido.