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Eliana Alves Cruz

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Jogos Olímpicos: Lembranças de um futuro feliz

Cristo Redentor, cartão-postal do Rio de Janeiro, é representado por dançarinos durante a cerimônia de encerramento da Olimpíada - FABRIZIO BENSCH/REUTERS
Cristo Redentor, cartão-postal do Rio de Janeiro, é representado por dançarinos durante a cerimônia de encerramento da Olimpíada Imagem: FABRIZIO BENSCH/REUTERS

23/03/2021 04h00

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"Buscando um novo rumo que faça sentido / nesse mundo louco com o coração partido/ Eu tomo cuidado pra que os desequilibrados não abalem minha fé/ pra eu enfrentar com otimismo essa loucura (...)"
Charlie Brown Jr.

Semana passada não escrevi. Não tinha sentido escrever sobre esporte, que é corpo em movimento, vigor, potência, alegria de compartilhar o mesmo campo, a mesma piscina, a mesma quadra. Nada fazia sentido para falar sobre esporte.

Nada fazia sentido, pois os recordes mundiais batidos pelo Brasil atual não celebram vida e sim o desencanto, a falência da nossa civilização. Semana passada me permiti olhar passivamente a tragédia como público de uma partida surreal em que de um lado está um país inteiro e de outro apenas um jogador: a morte.

No entanto, este não será um texto para falar o que já sabemos ou para mastigar ainda mais o amargor que espectadores de um genocídio sentem, vendo o obituário aumentar e a asfixia generalizar. Não! Vamos pensar no dia em que o mundo voltará a celebrar com estádios cheios e que ouviremos aquele uníssono som de vozes em êxtase pelo espetáculo das possibilidades do corpo vivo, muito vivo! Pode não parecer, mas falta menos do que faltava.

E nesta semana em que me permiti não escrever, mudei de casa e achei fotos, souvenires, documentos de sete ciclos olímpicos, desde Barcelona 1992. Pins, mascotes, ingressos de tribuna de imprensa, assinaturas de atletas, crachás (centenas!), fotos com colegas jornalistas. Memórias de um tempo que começou quando eu contava apenas 23 anos e veio até a meia idade. O mundo e a vida se transformando junto com a maior competição do planeta. O público e o privado se misturando no testemunho de uma época.

Os objetos vão se tornando raros conforme o tempo passa. Algumas das minhas muitas recordações já valem alguma coisa neste museu formado pelo fetiche de lembranças dos Jogos. Descobri que existe um mercado ávido por estes itens, mas o que mais guardo da maior competição do planeta é imaterial. O som, o barulho da massa nas arquibancadas, o grito pela vitória ou pela derrota, a lágrima compartilhada de alegria ou tristeza, as histórias compartilhadas com gente totalmente desconhecida do outro lado do globo, a vibração de um mundo que se mistura em sotaques, traços fisionômicos, cores e texturas nos estádios, aeroportos, ruas...

Em Tokyo este ano acontecerá uma competição, mas de Olimpíadas terá apenas o nome, a grife e direitos de transmissão, pois este evento que assistiremos carece de um elemento essencial para ser Jogos Olímpicos: povo do mundo todo, pois o povo do mundo está de luto.

Minhas lembranças são de um passado que voltará a ser presente e futuro. Este momento nefasto passará e vai depender de nós construir, como diz o título da música do Charlie Brown Jr, "Pontes Indestrutíveis" para um planeta mais feliz.

"... Quem é de verdade sabe quem é de mentira /
Não menospreze o dever que a consciência te impõe/
Não deixe pra depois, valorize a vida /
Resgate suas forças e se sinta bem, rompendo a sombra da própria loucura/
Cuide de quem corre do seu lado e de quem te quer bem/
Essa é a coisa mais pura"