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Diogo Silva

Judô chegou ao Brasil pelo Pará e foi ao topo com três mulheres

A judoca Ketleyn Quadros com o bronze conquistado na Olimpíada na categoria até 57 kg - Toshifumi Kitamura/AFP
A judoca Ketleyn Quadros com o bronze conquistado na Olimpíada na categoria até 57 kg Imagem: Toshifumi Kitamura/AFP

08/07/2020 04h00

Jigoro Kano criou a arte marcial judô no Japão. Seu primeiro aluno matriculou-se em 1882 em sua escola, chamada Kodokan. Nela, ensinava-se cultura intelectual, entendendo que esse seria o meio para educação do físico e do espírito.

É dentro desse conceito que o judô passou a ser difundido pelo mundo. E, não diferente das outras artes marciais, foi assim também que chegou ao Brasil.

No fim da primeira Guerra Mundial, na década de 1910, o fluxo de imigração japonesa para o Brasil cresceu de forma impressionante. Chegavam ao país navios lotados e, a cada desembarque, mais de 700 pessoas partiam para trabalhar em lavouras no interior de São Paulo ou nas fazendas de borrachas do norte do país. Mitsuo Maeda, discípulo de Jigoro Kano na escola Kodokan, chegou ao Brasil em uma dessas travessias, exercendo um cargo diplomático.

Conhecido por aqui como Conde Koma, ele foi o difusor do jiu-jitsu e do judô no Brasil. Sua primeira escola foi no Pará, por intermédio de Gastão Gracie — seu filho mais velho era Carlos Gracie, um dos primeiros discípulos de Koma em sua nova jornada. Assim, nascem duas grandes potências das artes marciais brasileiras: o judô e o jiu-jitsu, que beberam da fonte de ensinamentos da matriz japonesa e alcançaram o topo da cadeia esportiva e dos negócios.

Diferentemente do jiu-jitsu, o judô estreou no programa olímpico em 1964, nos Jogos de Tóquio, como esporte de demonstração. Passou a contar para o quadro de medalhas em 1972, em Munique, na Alemanha. O primeiro medalhista olímpico brasileiro foi Chiaki Ishii, justamente em 1972. A medalha de bronze que ele conquistou foi a primeira de muitas na história do esporte brasileiro. Neste ano, Ishii foi indicado para o Comitê Olímpico do Brasil (COB) a ser o primeiro judoca no hall da fama da entidade.

Judoca Aurélio Miguel conquista a medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Atlanta-1996 - Arquivo/Folhapress - Arquivo/Folhapress
Judoca Aurélio Miguel conquista a medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Atlanta-1996
Imagem: Arquivo/Folhapress

Desde sua estreia em olimpíadas, o judô vem conquistando uma medalha atrás da outra. Em 1988, saiu a primeira de ouro, com Aurélio Miguel, nos Jogos de Seul. Após conquistar um bronze nos Jogos de Atlanta-1996, Aurélio se tornou o judoca mais vitorioso do país. Em sua transição de carreira, tornou-se político, vereador de São Paulo por 12 anos.

Em Barcelona-1992, veio o segundo ouro, com Rogerio Sampaio, hoje diretor-geral do COB. Foi nessa mesma edição que as mulheres estrearam no judô, 20 anos depois que os homens.

Soraia André foi uma das representantes do Brasil, a primeira mulher negra do país a participar de uma edição olímpica de modalidades de lutas. Em seu livro "JapaNegra", Soraia conta a história dos seus grandes feitos, do protesto com quimono preto e das humilhações que sofreu por ser uma lutadora nessa época.

Dando continuidade ao processo de conquistas, como as guerreiras de Daomé (hoje o território de Benin), o exército feminino mais temido da África, Ketleyn Quadros conquista a primeira medalha olímpica do judô feminino, em Pequim-2008. A conquista do bronze, veio para honrar histórias como a de Ednanci Silva, uma das maiores judocas do Brasil e primeira brasileira a subir duas vezes ao pódio em Campeonatos Mundiais (foi bronze em 1997 e 2003).

Em Londres-2012, a piauiense Sara Menezes fatura a primeira medalha de ouro do judô feminino. Tal feito coloca o judô como uma das modalidades esportivas brasileiras mais vitoriosa. Quatro anos depois, Rafaela Silva conquista mais um ouro, protagonizando uma das imagens mais marcantes dos Jogos Olímpicos do Brasil em 2016 e coroando as mulheres como a maior força esportiva do Brasil.

Rafaela Silva chora no pódio ao receber a medalha de ouro da categoria leve no judô nas Olimpíadas do Rio - Getty Images - Getty Images
Rafaela Silva chora no pódio ao receber a medalha de ouro da categoria leve no judô nas Olimpíadas do Rio
Imagem: Getty Images

Com esse know how, o judô brasileiro torna-se o carro chefe do COB, principalmente depois da entrada de Paulo Wanderley Teixeira, presidente da Confederação Brasileira de Judô por 16 anos, na entidade. Ele foi vice-presidente durante o último mandato de Carlos Arthur Nuzman, preso em 2017. Com a queda de Nuzman, Wanderley assumiu a presidência do COB.

Outro grande atleta foi Tiago Camilo, com quatro participações olímpicas e duas medalhas, prata em Sidney-2000 e bronze em Pequim-2008. Hoje, Tiago é o presidente da Comissão dos Atletas do COB e atua no instituto que leva seu nome em Paraisópolis, região de vulnerabilidade social na zona sul de São Paulo.

Assim como o de Tiago, outro grande projeto é o Instituto Reação, fundado por Flávio Canto, bronze nos jogos de Atenas-1996. Seu instituto revelou a campeã olímpica e mundial Rafaela Silva, fruto de um projeto social na Cidade de Deus, no Rio de Janeiro. Flávio, em sua transição de carreira, se tornou apresentador na Rede Globo. Primeiro, assumiu a apresentação do Corujão e, com o destaque, foi escolhido para comandar o Esporte Espetacular. Hoje, é o principal nome das lutas do Grupo Globo e comanda programas no SporTV e no Canal Combate.

Hoje, o judô é a modalidade olímpica brasileira mais vitoriosa. São 22 medalhas conquistadas. Em seguida aparecem a vela, com 18, e o atletismo, com16.

A vela ainda tem mais medalhas de ouro (sete contra quatro), mas talvez em Tóquio-2021, na terra de Jigoro Kano, o judô brasileiro demonstre força e o Brasil abandone as chuteiras para colocar seus quimonos.