Topo

Bala na Cesta

Cinco razões que explicam como basquete feminino regrediu tanto em 25 anos

13/02/2020 05h01

Você tem lido aqui nesta semana inteira sobre o basquete feminino brasileiro, assunto sempre debatido e escrito por esse blog. A perda da vaga olímpica no domingo passado em Bourges, na França, uma análise sobre o trabalho de José Neto, a falta de um planejamento estratégico por parte da Confederação Brasileira e muito mais.

O que não está claro é como uma modalidade que conquistou um título mundial em 1994, uma medalha de prata olímpica em 1996, outra de bronze em 2000 e que teve participações honrosas no Mundial de 2006 (quarto lugar) e Olimpíada de 2004 (semifinalista) decaiu tanto em menos de 30 anos, amargando péssimas campanhas olímpicas (último lugar no Rio-2016 por exemplo), Mundiais (não foi à Espanha em 2018), perda da hegemonia continental (derrotas para Argentina, Porto Rico e afins) e tudo mais. Vamos lá:

1) Gestão da Confederação Brasileira -> É, disparado, o principal ponto. A CBB teve uma geração magistral nas mãos (Paula, Hortência, Janeth, Alessandra etc.) para massificar o esporte, desenvolver novos polos, criar uma cultura de basquete feminino por aqui, pensar no longo prazo e nada fez. Nada é nada mesmo. Grego, que presidiu a entidade até 2009, tinha pouco dinheiro nas contas da entidade máxima e talento de sobra nas quadras. Carlos Nunes, mandatário até 2017, tinha muito dinheiro no caixa da CBB e menos talento. Em comum: ambos são péssimos gestores e NUNCA tiveram um mínimo planejamento para o basquete feminino brasileiro. Confiaram que surgiriam, por milagre, novas craques, não trabalharam e hoje o resultado está aí. Milagres acontecem uma vez a cada 50, 100 anos. O do basquete feminino já veio e esperar por um novo é um devaneio absurdo.

2) Federações inoperantes -> Se a CBB é fraquíssima em termos de gestão, as Federações não ficam atrás, não. Em um modelo de negócios falido, são elas que elegem o presidente da Confederação e nada fazem para fomentar a modalidade em suas regiões. Com exceção da Catarinense, eu não vejo NENHUM trabalho minimamente razoável das Federações de Basquete por aqui. Nem em São Paulo, onde quase tudo sempre aconteceu no basquete feminino, mostra algo perto do básico em relação a iniciação, massificação, campeonatos do adulto e tudo mais.

3) Comodismo das atletas -> Aqui entra um fator muito importante. Paula, Hortência e companhia demoraram uma década para começar a ganhar alguma coisa (o Pan-Americano de 1991, depois Mundial e Olimpíada). Depois de todas as derrotas, uma única certeza: elas precisavam evoluir. Hoje em dia o que se vê é uma estagnação, um comodismo, um conformismo, uma vontade absurda de se manter como está. Das redes sociais à forma como gerenciam suas carreiras, passando pela ambição quase nula, as atletas cobram pouco dos dirigentes melhores condições de trabalho, se contentam com troféus nacionais e ligam pouquíssimo para desenvolvimento pessoal. O resultado é uma geração (Z, X, Y, Z, sei lá eu em qual estamos) mimadíssima, que tem um zelo quase nulo em relação a aspectos mentais e físicos de suas carreiras, sem nenhum espaço no mercado externo (e elas estão tranquilonas em relação a isso...) e que acha que sempre está tudo muito bem. Um reflexo disso? Dois dias depois do fracasso em Bourges já há anúncios mega animados sobre os times pelos quais elas jogarão a próxima LBF. Alienação pouca é bobagem...

4) Cada vez menos clubes na formação de atletas -> Outro ponto mega fundamental. Quem cuida da base hoje em dia? A Confederação desde sempre é fraca neste sentido. Antes, porém, havia Piracicaba, Jundiaí, Americana, times que mantinham a chama do desenvolvimento de jovens valores acesa. Os técnicos que lapidavam os nossos diamantes também sumiram. Com exceção dos projetos de Santo André e Osasco, mantido há mais de 20 anos, eu não conheço um outro polo que esteja fazendo um excelente trabalho de base, não. O incrível disso tudo é que nem todos os times que participam da LBF possuem categorias de formação. De onde sairão as atletas para os próximos cinco, dez, 20 anos mesmo? E a CBB ainda fala em projeto visando Paris-2024. Desculpem, mas isso é impossível.

5) Capacitação dos técnicos -> Se as atletas são conformadas, o mesmo pode-se dizer dos técnicos. O nível deles piorou demais de 15, 20 anos para cá em todos os aspectos - tático, técnico, gestão, liderança, emocional, tudo. A queda é abissal. Em uma época tínhamos aqui Maria Helena Cardoso, Paulo Bassul (assistente dela por muito tempo), Mila Rondon (uma das melhores formadoras do país), Antonio Carlos Vendramini, Antonio Carlos Barbosa, Miguel Ângelo da Luz (campeão mundial e medalhista olímpico). O que aconteceu nos últimos 30 anos é resultado de muitos treinadores terem ido treinar o masculino (maior visibilidade, mais grana, mais clubes etc.), péssima reciclagem, bagagem de estudos muito baixa, senso crítico abaixo do aceitável e nenhuma cobrança ao status-quo.

Concordam comigo?