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André Rocha

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Palmeiras é mais um time que joga menos quando treina mais. Por quê?

Felipe Melo e Marquinhos disputam lance em São Paulo x Palmeiras no Brasileirão - Marcello Zambrana/AGIF
Felipe Melo e Marquinhos disputam lance em São Paulo x Palmeiras no Brasileirão Imagem: Marcello Zambrana/AGIF

Colunista do UOL Esporte

01/08/2021 07h18

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Abel Ferreira chegou ao Palmeiras com o time vencendo sob o comando do interino Andrey "Cebola" Lopes. Falou timidamente do calendário enquanto os resultados na Libertadores e na Copa do Brasil eram positivos.

Bastou o fracasso no Mundial e, no início da temporada 2021, as derrotas nos pênaltis para Flamengo e Defensa y Justicia na Supercopa do Brasil e na Recopa Sul-Americana, respectivamente, para começar a reclamar.

Com razão, é óbvio. Ainda mais na emenda do calendário atípico por conta da pandemia. E era direito do treinador português ter um breve recesso para visitar a família, Os Jogos Olímpicos estão ai para mostrar que pessoas envolvidas com esporte de alto rendimento não são máquinas. Têm sentimentos, afetos, saudades.

Sem tempo para trabalhar, resta apelar para outros recursos. A mobilização no Brasil costuma ser muito eficiente e Abel aprendeu rápido. O "contra tudo e contra todos" virou lema. A imprensa critica. A arbitragem, alvo de reclamações constantes, prejudica e a falta de um período ideal para descanso, recuperação e treinamento obriga a simplificar processos.

Mas mantém todos alertas, fortes mentalmente. Sem tanta responsabilidade de entregar desempenho e podendo usar as adversidades para criar o cenário preferido do jogador brasileiro: ser o Davi contra Golias, o que não desiste nunca e dá a volta por cima, mesmo que ninguém acredite.

Tudo isso perde força quando a equipe ocupa a liderança do Brasileiro, vira o time a ser batido e ganha uma semana "cheia" para fazer preparação completa. O Palmeiras foi para o clássico "Choque-Rei" por cima, como grande favorito. Mesmo no Morumbi.

E o que se viu foi uma atuação decepcionante, especialmente no primeiro tempo. Baixa intensidade, desconcentração, nenhuma fluência para trabalhar a bola, sofrendo novamente com os encaixes e perseguições do São Paulo de Hernán Crespo, que empurrou o rival para trás.

45 minutos de 59% de posse tricolor, com seis finalizações a quatro. Estatísticas que desconsideram o gol anulado de Rigoni e o pênalti que não foi ratificado pelo árbitro Luiz Flávio de Oliveira, após consulta ao VAR, de Gustavo Gómez sobre Marquinhos. Dois acertos da arbitragem, mas, no segundo caso, uma mudança simples de interpretação colocaria o Alviverde em apuros.

No segundo tempo, um pouco mais de controle. Assim como aconteceu contra o Fluminense no Allianz Parque na semana passada, a esperança era melhorar com as substituições, aproveitando o elenco mais homogêneo do país. Poderia ter ido às redes com Breno Lopes em rápido contragolpe.

No final, ao invés de usar a qualidade e o fôlego a mais para atacar um adversário desfalcado e desgastado por ainda estar envolvido em três competições, Abel preferiu trocar Raphael Veiga por Victor Luís, montando uma linha de cinco atrás para garantir o empate.

Quase foi punido pelo gol contra de Gustavo Gómez, anulado por Luiz Flávio depois de nova consulta ao VAR. Miranda estava mesmo impedido e a disputa com Patrick de Paula pode mesmo ter interferido na reação de Gómez. Lance de interpretação.

A discussão geral vai ficar em cima da arbitragem polêmica, mas a grande questão é; por que o líder do campeonato rendeu tão pouco?

É claro que há atenuantes. Abel não conta com Rony e Luiz Adriano, que há pouco tempo formavam a dupla de ataque que desequilibrava. Dudu, outra ausência por lesão, também poderia ter contribuído, mesmo ainda recuperando ritmo de competição. Viña foi embora e os contratados Jorge e Piquerez ainda não estrearam. Renan segue como lateral-zagueiro pela esquerda.

Mas com essas perdas importantes o time conseguiu render em casa contra a Universidad Católica pela Libertadores. Com Raphael Veiga saindo da direita para se juntar a Gustavo Scarpa na articulação e abrindo o corredor pela direita para Marcos Rocha. Trabalhando a bola, movimentando as peças e criando espaços. O que se espera de uma grande equipe.

A desculpa para a péssima atuação contra o Flu foi o cansaço e a vitória, mesmo com gol contra bizarro, foi o escudo para as críticas. Como sempre. E agora, qual é a justificativa?

O São Paulo, que ainda perdeu Marquinhos por lesão, finalizou 12 vezes, três no alvo. Dominou o clássico e, mesmo com o empate sem gols, sai fortalecido para os próximos encontros, pelas quartas da Libertadores.

O Palmeiras terá mais uma semana de trabalho até o jogo em casa contra o Fortaleza. Como será? Abel não é o primeiro, nem será o último no Brasil a reclamar da falta de tempo e entregar pouco quando ganha mais dias para treinar.

É claro que sete dias - ou seis, considerando a folga - não é o suficiente para fazer uma revolução. Mas tem que aparecer uma jogada ensaiada, uma ação ofensiva coordenada. O atual campeão da Libertadores e da Copa do Brasil foi um deserto de ideias.

Acontece o tempo todo por aqui. No ano passado, Flamengo e Atlético Mineiro foram times que perderam desempenho quando Rogério Ceni e Jorge Sampaoli tiveram semanas "cheias". A impressão que passa é que a ausência nas competições de mata-mata no meio da semana abala a confiança.

Ou a realidade é que, sem a sequência de jogos a cada três dias, fica mais difícil colocar o brilho da superação no olhar. Como se os atletas precisassem da adrenalina da competição sem grandes hiatos. Difícil entender. Assim como não dá para aceitar tão pouco de quem investe tanto.

(Estatísticas: SofaScore)