Palmeirense narra clima tenso em chegada aos EUA: 'Revista seletiva'
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O relato a seguir me foi enviado na manhã desta quinta (12) por um brasileiro, palmeirense, que vive nos Estados Unidos. Ele tem Green Card e, por isso, com medo de sofrer retaliação, pediu para que eu publicasse sua história anonimamente.
Voltei ontem de Londres para Orlando e vivi uma cena no desembarque que nunca tinha presenciado nos meus mais de seis anos morando aqui.
Assim que o avião pousou, seguimos normalmente pelo finger em direção à imigração. Mas, quando chegamos à porta que dá acesso ao terminal do aeroporto, ela estava trancada. O calor dentro do finger era insuportável, parecia facilmente uns 50ºC naquele tubo metálico. Depois de alguns minutos de confusão e olhares perdidos entre os passageiros, a porta se abriu.
As primeiras pessoas — provavelmente americanas — começaram a entrar naturalmente. Mas imediatamente quatro agentes do CBP (Customs and Border Protection, da Imigração) começaram a gritar com elas, mandando voltar. Fecharam a porta de novo, num clima tenso. Só depois reabriram e começaram a liberar um por um, literalmente. Gritando que era "one at a time". Inclusive crianças. O clima era de vigilância total, como se estivéssemos entrando numa área de segurança máxima.
Classificação e jogos
Logo atrás de mim estavam torcedores do Palmeiras vindos de Campinas, todos vestidos com a camisa do clube. Um grupo inteiro foi direto para a "salinha", sem qualquer explicação. Mais à frente, conversei com torcedores do Fluminense, que escaparam da triagem, mas ficaram quase uma hora presos na fila, enquanto viam dezenas de outros passageiros (americanos e europeus) passando à frente com facilidade. Era uma seletividade óbvia. E desconfortável.
Agora conecte isso ao que li depois no The Athletic: a Fifa está vendendo ingressos por US$ 3,50 para partidas em que eu paguei US$180. Um movimento desesperado para tentar encher os estádios. E o motivo é claro: o público internacional não conseguiu nem chegar.
Segundo o jornal USA Today, a ICE (agência de controle de imigração) e o CBP estão fazendo triagens pesadas com torcedores estrangeiros, especialmente sul-americanos. Muitos estão sendo barrados, interrogados, ou simplesmente desestimulados a vir. O resultado? Fracasso de público. Estádios vazios
E o presidente da Fifa? Em vez de defender os torcedores, está alinhado com Trump, em plena corrida eleitoral, ignorando completamente o impacto que essa política de exclusão tem sobre o evento que ele próprio promove como "celebração global do futebol".
Mas que global é esse?
A verdade é que os americanos nunca ligaram muito para o futebol — e nem chamam o esporte por esse nome. O sucesso da liga masculina aqui se deve, em grande parte, à presença de imigrantes latinos. E muitos desses fãs hoje vivem em processo de documentação, o que em teoria não os tornava ilegais, mas agora a ICE quer capturá-los antes que seus processos sejam aprovados. Estão vulneráveis, podendo ser classificados como criminosos, abordados, ou até deportados. E pior: presos antes.
E o reflexo disso? Eles têm medo de ir ao estádio. Medo de serem detidos em nome de "segurança".
Esse não é só um problema de vendas ou de marketing. É um reflexo de um sistema que hostiliza o público que sustenta o futebol por aqui.
A FIFA pode colocar luzes, drones, telões e vender a narrativa de evento global. Mas enquanto não se resolver o básico — deixar as pessoas entrarem no país e no estádio — tudo isso vira teatro.
A verdade é dura: não adianta fazer um torneio mundial se o mundo não pode entrar.
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