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Alicia Klein

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Jornalista de futebol pode revelar para quem torce?

Torcedores do Bahia na Arena Fonte Nova durante partida de fevereiro de 2020 - Jhony Pinho/AGIF
Torcedores do Bahia na Arena Fonte Nova durante partida de fevereiro de 2020 Imagem: Jhony Pinho/AGIF

18/07/2021 11h57

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Sim.

Como tudo neste espaço, mas mais do que nunca, importante deixar claro que esta é a minha opinião. Não só não reflete, necessariamente, a do UOL, como provavelmente não refletirá a de muitos colegas. Que bom, viva a diversidade.

Quem habita a tuitosfera futebolística já deve ter notado um movimento cada vez maior em direção à cobertura de nicho. Torcidas optando por seguir jornalistas ou portais dedicados aos seus clubes, com opiniões muitas vezes mais favoráveis do que a mídia em geral. Na prática, escolhendo o clubismo aberto para fugir do clubismo mascarado de imparcialidade.

Nunca acreditei na imparcialidade. Foi uma luta constante na faculdade de jornalismo, afinal se trata de um pilar da profissão: a isenção, a neutralidade, a capacidade de abordar assuntos sem favorecer um ou outro lado. Ou time.

Se essa ilusão existia vinte anos atrás, quando entrei na universidade, acho que hoje ela está praticamente desacreditada. Seres humanos têm bagagens, histórias, religiões, famílias, vieses, preconceitos, inúmeros fatores que pesam em suas opiniões. Ser imparcial não é humano. Ser justo é. Mas é também muito difícil.

No futebol, isso fica ainda mais claro. Toda e todo jornalista começou a vida torcendo. Frequentou o seu estádio, gritou com a sua torcida, cantou o seu hino, xingou os seus adversários, a sua diretoria, os próprios jogadores, dividiu emoções com amigos e parentes, encheu o saco dos coleguinhas na escola. Todas e todos tivemos ao menos vinte anos de parcialidade, antes de recebermos a unção sagrada do periodismo desapaixonado. Isso não se apaga.

Isso, sem dúvida, influencia nosso trabalho. Em alguns casos, numa cobertura explicitamente favorável, de maneira quase cômica; em outros, numa curiosa cobertura forçosamente desfavorável, como se tentando disfarçar o coração. Há os raros casos dos sobre-humanos que pairam acima da média, quase neutros. Quase.

Eu, enquanto mera mortal, admito que nunca vou saber tanto sobre um outro clube quanto o meu do coração. Ponto. E acho importante que leitoras e leitores saibam disso. Ainda que pesquisasse infinitamente sobre todos os times brasileiros, que me tornasse uma enciclopédia, nunca sentiria as mesmas emoções, não apagaria as memórias de infância, as lágrimas de alegria e tristeza que já senti na arquibancada. Nem quereria.

Quem somos tem peso enorme sobre o que dizemos. Por que não compartilhar os elementos dessa equação com quem consome nosso conteúdo? Pelo espaço que o futebol ocupa na minha vida, quem eu sou passa pelo meu time, para o bem e para o mal.

E isso não me impede de fazer como jornalista um trabalho honesto, equânime e não clubista (ou quase).