Seguir com o dérbi em SP é um crime

Continuo atualizando a primeira página do UOL na vã esperança de chegar a notícia: dérbi desta noite cancelado. Mas o que me chega é mais da realidade paralela em que vivemos. Cidades fecham e a bola rola.

Porto Alegre em bandeira preta recebendo a final da Copa do Brasil. São Paulo indo para a fase vermelha e o Centro de Contingência do Estado dizendo que o campeonato segue porque "a população precisa de diversão". Não, meus senhores, a população precisa de vacina. De auxílio emergencial. De leitos de UTI.

O Corinthians, como se sabe, sofre um surto de Covid-19 com 19 casos confirmados. Como também se sabe, testes negativos não garantem que uma pessoa não esteja infectada e possa contaminar muitas outras, especialmente com novas variantes à solta.

Como se sabe mais ainda — mesmo quem não quis saber —, o Brasil bateu ontem o recorde diário de óbitos pelo coronavírus. Todavia, estamos aqui falando de Flamengo e Nova Iguaçu, Boa Esporte e Pouso Alegre, Grêmio e Brasil de Pelotas, clássico, Copa do Brasil.

Em que momento conseguimos dissociar os dois Brasis? Um com 2,7% da população mundial e 12% das mortes por Covid. O outro com futebol cinco vezes por semana, debates infinitos e fogos de artifício?

Vivo, em parte, do esporte e acredito piamente na sua capacidade de promover melhorias sociais. O momento atual, porém, exige de nós sacrifícios imediatos para preservar o que temos de mais sagrado: a vida. A maioria dos brasileiros talvez não possa ficar em casa. O futebol pode.

Fazer um catado de jogadores com testes negativos e expor não apenas o time do Palmeiras, mas as centenas de pessoas direta e indiretamente envolvidas na realização de uma partida do campeonato paulista chega a ser criminoso. Mas o clube alvinegro não pediu o cancelamento do jogo porque a regra não prevê outra possibilidade além de um W.O.

W.O., meus senhores, é o que tomamos diariamente de um governo que não entra em campo para proteger sua população, mas não impede que o futebol entre em campo para distraí-la. Quando vamos nos levar a sério?