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Para se 'blindar', TSE quer ampliar observadores nacionais nas eleições

Funcionários do TRE do Distrito Federal realizam teste e lacração de urnas eletrônicas  - Pedro Ladeira/Folhapress
Funcionários do TRE do Distrito Federal realizam teste e lacração de urnas eletrônicas Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Paulo Roberto Netto

do UOL, em Brasília

29/05/2022 04h00

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) quer ampliar o número de observadores nacionais nas eleições deste ano. A ideia é consolidar o modelo adotado pela primeira vez em 2020 e garantir uma nova camada de "blindagem" contra eventuais contestações de resultados, já sinalizadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição.

A estratégia faz parte do plano do ministro Edson Fachin, presidente do TSE, de garantir cerca de 100 observadores e convidados acompanhando as eleições.

Como mostrou o UOL, a meta ambiciosa já tem levado a Corte a procurar parcerias para financiar a vinda de representantes estrangeiros.

No Brasil, o TSE aposta em maior participação de organizações civis que queiram conduzir suas próprias missões de observação eleitoral. Em fevereiro, o tribunal aprovou a resolução sobre o tema e passou a aceitar a inscrição de entidades interessadas.

As missões nacionais funcionam de forma semelhante às conduzidas por órgãos internacionais, como a OEA (Organização dos Estados Americanos). Foi a própria entidade que sugeriu a ideia após acompanhar as eleições de 2018 e sugerir que o Brasil poderia se beneficiar com missões de observação nacionais.

Cada missão de observação é composta por um grupo técnico que acompanha as etapas do processo eleitoral, indo desde a campanha eleitoral até o processo de votação e totalização no dia da eleição. O TSE não tem qualquer ingerência sobre o grupo e as despesas são pagas pelas próprias entidades que atuam nas missões.

Ao fim das eleições, os técnicos elaboram um relatório final com suas impressões sobre as eleições e listam recomendações ao TSE.

Em 2020, o TSE testou o modelo pela primeira vez com a missão conduzida pela Transparência Eleitoral Brasil. A organização atuou em cinco capitais (João Pessoa, Fortaleza, Belém, Curitiba e Belo Horizonte) e acompanhou a totalização dos votos em Brasília.

Ao UOL a coordenadora-geral da Transparência Eleitoral Brasil, Ana Claudia Santano, disse que a organização se cadastrou para realizar uma nova missão neste ano e deve ampliar a cobertura para 11 capitais e uma cidade do interior.

A lista incluirá, além das cidades visitadas em 2020, as cidades de Manaus, Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e Passo Fundo.

"A nossa ideia é ter amplitude geográfica porque o Brasil é um país complexo, enorme e o máximo de regiões devem ser incluídas. Precisamos incluir todos os Brasis dentro do Brasil"
Ana Claudia Santano, a coordenadora-geral da Transparência Eleitoral Brasil

Segundo Ana Claudia, a ampliação de missões nacionais é uma agenda recente no país. A Colômbia, cita como exemplo, mantém a tradição há 30 anos, enquanto no Brasil a primeira missão internacional foi feita em 2018.

"Embora aparente que está usando isso para se blindar, o fato é que o TSE está procedendo de maneira institucionalmente respeitada porque a autoridade eleitoral pode convocar observadores", disse. "O TSE está em seu lugar e vejo isso como um avanço, mas volto a dizer que chegamos tarde na agenda."

Missão alertou sobre risco de "estratégia política de contestação"

O primeiro relatório da missão de observação feita pela Transparência Eleitoral Brasil em 2020 já alertava o TSE sobre a possibilidade de riscos de "estratégias políticas de contestação" das urnas neste ano, relatando acusações de fraudes — ainda que não comprovadas — por "altas autoridades", como Bolsonaro.

"Já há um ambiente de preocupação sobre as consequências do uso desse discurso deslegitimador da integridade da urna eletrônica, principalmente no que se refere ao momento pós-eleições 2022", alertou o documento. "Esta preocupação vem tanto da classe política quanto da sociedade civil, que vem atuando em diversas frentes para que um debate sobre o sistema eletrônico de votação não seja utilizado como forma de romper com a democracia brasileira".

Ainda no relatório, a organização disse ao TSE que os efeitos negativos das declarações contra as urnas, em 2020, poderiam ser sentidos nas eleições presidenciais deste ano e tornar o pleito um evento de "alta complexidade e instabilidade política".

A escalada, de fato, se agravou neste ano com Bolsonaro proferindo ataques semanais ao TSE e aos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes, atuais presidente e vice do tribunal. Ontem, o presidente acusou Fachin de ser "advogado do MST".

Na quinta-feira (26), ao ser questionado por jornalistas, o presidente se esquivou de dizer se aceitaria o resultado das urnas. "Democraticamente, eu espero eleições limpas", disse somente.

No último dia 16, em reunião com empresários, Bolsonaro disse que o Brasil poderia ter "eleições conturbadas". "Imagine acabarmos as eleições e pairar para um lado ou para o outro a suspeição de que elas não foram limpas? Não queremos isso", afirmou.

Dentro do TSE, Fachin adotou uma postura de defesa firme do sistema eleitoral, mas evitando citar Bolsonaro nominalmente. Na sexta-feira (27), disse que acatar o resultado das urnas é uma "expressão inegociável" da democracia. Ao anunciar o plano de ter mais de 100 convidados e observadores nas eleições, o ministro deixou claro que o país não vai tolerar "aventuras autoritárias".

"O mundo observa, com atenção, o processo eleitoral brasileiro de 2022. Somos, hoje, uma vitrine para os analistas internacionais, e cabe à sociedade brasileira garantir que levaremos aos nossos vizinhos uma mensagem de estabilidade, de paz e segurança, e de que o Brasil não mais aquiesce a aventuras autoritárias"
Edson Fachin, presidente do Tribunal Superior Eleitoral