Um mês com Dilma: candidata "relaxa" e fica mais acessível que presidente

Leandro Prazeres

Do UOL, no Rio

Ao longo de um mês viajando pelo Brasil "atrás" da candidata à reeleição, Dilma Rousseff (PT), foi possível observar "in loco" o que as pesquisas de opinião pública mostraram ao longo de toda a eleição. Durante a cobertura, viajei por oito Estados e três regiões diferentes e em cada lugar era possível sentir a reação das pessoas em relação a ela.

A primeira coisa que me chamou atenção no início da jornada foi a facilidade para ter acesso à candidata durante a campanha. Não houve a necessidade de nenhum tipo de credenciamento específico e a segurança em torno da candidata era bastante 'flexível'. Quem esperava uma vigilância ao estilo "FBI" se decepcionou.

Mais tarde, fui informado de que, a pedido da presidente, a segurança no seu entorno havia sido "relaxada". Além disso, se Dilma-presidente ficou conhecida por ser uma presidente pouco afeita a dar a entrevistas, na reta final da campanha, a Dilma-candidata adotou uma agenda de entrevistas coletivas quase diárias, algumas delas em sua residência oficial, o Palácio da Alvorada.

Reação de Norte a Sul

Apesar de atualmente morar em São Paulo, passei a maior parte da minha vida na Amazônia. Não era surpresa para mim, portanto, que sua popularidade fosse maior quanto mais próximo do Equador estivéssemos.

O que impressionou, no entanto, foi como a divisão do suporte a Dilma era, realmente, também, geograficamente bem marcada.

UOL
Repórter Leandro Prazeres trabalha de hotel onde Dilma daria entrevista no Rio

Às vezes, por descuido, deixava de tirar o crachá que me identificava como repórter que cobria a campanha de Dilma ao final da jornada de trabalho a caminho do hotel ou de um restaurante.

Em Salvador, Recife ou Teresina, quando alguém me via com o crachá, a reação era mais ou menos na linha: "Você trabalha com Dilma?", indagavam ansiosos. Em São Paulo e Brasília, por exemplo, a reação era diferente: "Você não trabalha para a Dilma, trabalha?", perguntavam meio decepcionados.

A migração de votos do PT dos grandes centros urbanos para o interior do Nordeste e outras cidades, apontada pelo ex-porta-voz do governo Lula, André Singer, se materializava todos os dias.

Pesquisas

Um dos elementos mais curiosos da cobertura foi perceber a "mão-não-tão-invisível" do marketing eleitoral influenciando a campanha.

Já no final do primeiro turno, com inúmeras pesquisas de opinião captando o desejo de mudança do eleitor brasileiro, Dilma nos chamou para uma entrevista coletiva em que ela começou a citar a frase que virou slogan durante todo o segundo turno: "Governo novo, ideias novas".

A poucos dias do primeiro turno e com as revelações sobre o esquema de desvio de dinheiro vindo à tona diariamente e com a percepção do público bastante sensível ao tema, Dilma convocou outra entrevista coletiva, desta vez no Palácio da Alvorada, para lançar um "pacote de medidas anticorrupção". A partir de então, a presidente passa a adotar, mais ostensivamente, a tática de se defender das acusações de corrupção na base do ataque.

A mudança mais drástica no comportamento de Dilma se deu na última semana da campanha. Enquanto estava atrás nas pesquisas de opinião, Dilma não poupou ataques diretos ao tucano. O ponto alto da estratégia que ficou conhecida como 'desconstrução' do candidato, foi o debate realizado por UOL, SBT e Joven Pan, no dia 16.

Dilma questionou sobre o episódio em que Aécio teria dirigido sob o efeito de álcool e supostos casos de nepotismo praticados pelo ex-governador de Minas Gerais. Confrontada, Dilma ouviu Aécio chamando-a de 'leviana' e 'mentirosa'. Dilma chegou a passar mal no final do debate.

A estratégia do ataque pessoal vindo de Dilma parece ter acabado ali. Pesquisas de opinião indicaram que o eleitor não gostou da forma como Aécio tratou Dilma no debate. O debate seguinte, realizado pela Record, não teve ataques e, em suas entrevistas coletivas, Dilma mudou o tom visceral de suas declarações para algo mais próximo com o "Dilminha paz e amor".

Convívio

Após um mês acompanhando a presidente -- comecei a rotina no dia 25 de setembro --, foi possível notar seu gosto por roupas sóbrias, um sotaque que mistura suas raízes mineiras e suas influências gaúchas e uma aparente dificuldade em concatenar rapidamente ideias e sua fala. São famosas as longas pausas que ela faz no meio de uma frase ao conectar uma ideia à outra.

A tão falada 'rispidez' com que ela trata os integrantes do seu estafe, pelo menos durante a campanha (ou nos momentos em que ela estava diante dos repórteres), não ficou visível. 

O episódio de tensão mais claro que presenciei nos bastidores da campanha foi durante uma entrevista coletiva em São Paulo. O tema era a crise hídrica no Estado. Dilma dizia que a imprensa tinha responsabilidade na forma como a crise era percebida pela população.

Ela disse que todos os elementos sobre a crise estavam disponíveis um mês antes das eleições que deram mais quatro anos de mandato a Geraldo Alckmin (PSDB).

Um repórter rebateu a afirmação e disse que havia um fato novo que justificaria a mudança na cobertura do assunto apenas depois do pleito: o depoimento da presidente da Sabesp, Dilma Pena, dado três dias depois das eleições, em que Pena admitiu que faltaria água em São Paulo. Dilma olhou fixo para o repórter, respirou e, ironicamente, disse: "sei".

Política

Vê-la no palco ao lado de Lula, em um comício, também mostra a enorme diferença entre as duas maiores estrelas do Partido dos Trabalhadores. Não sei se por força do hábito ou do marketing, Dilma adora falar sobre siglas e números, e dificilmente dá mais de três passos para um lado ou para o outro enquanto discursa.

Lula, ao contrário, talvez até por não ser candidato, quase não cita siglas ou dados estatísticos e diferentemente de Dilma, ele ocupa todo o espaço do palco enquanto discursa.

Apesar disso, foi curioso perceber o impacto de sua passagem por cidades do Nordeste ou mesmo pelo ato com intelectuais realizado no Tuca, em São Paulo, na última semana. Em Goiana, no interior de Pernambuco, um palanque foi montado no centro da cidade.

Para separar os moradores dos convidados, placas de metal foram colocadas nas calçadas. Do lado de fora, milhares de moradores se espremiam em janelas para tentar ver Dilma e Lula discursando. De repente, o alambrado montado pela equipe da campanha deu sinais de que poderia cair.

Dezenas de pessoas, em frenesi, subiam umas nas outras para tentar se apoiar na estrutura de metal e conseguir ver a candidata. Preocupado, me posicionei para fazer uma foto do desastre que, para mim, era iminente.

Foi aí que um homem mulato, usando boné, camiseta e sem quatro dentes na mandíbula superior, abriu um sorriso, tirou um smartphone do bolso e fotografou o palco. 

Alguns políticos ficaram famosos por gestos ou frases de efeito. Ao longo dos últimos trinta dias, não vi nada que pudesse virar um ícone a não ser a despedida de Dilma nas entrevistas coletivas. Quando o tempo se esgota ou o clima da entrevista fica tenso demais (para os padrões dilmistas), a presidente olha de soslaio para o grupo, franze a testa, leva a mão direita aos lábios e manda um beijo como quem diz: "Deu. Inté".

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