Como TFFF, fundo proposto pelo Brasil, quer inovar financiamento climático

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Em novembro, o governo vai apresentar uma nova modalidade de financiamento para tentar salvar as florestas tropicais durante a COP 30: o Fundo Florestas Tropicais para Sempre, ou TFFF, na sigla em inglês (Tropical Forest Forever Facility).
A proposta é criar um fundo de investimento em que países e investidores privados aportam quantias iniciais que serão investidas em ativos de baixo risco. Os lucros gerados pelo fundo pagarão os investidores, e o valor que sobrar será repassado para países de florestas tropicais. Cada país receberá um montante proporcional à área preservada. O Banco Mundial será o administrador e trustee da iniciativa.
A meta é ousada: captar US$25 bilhões de investidores públicos e US$100 bilhões de privados. Se alcançar a meta, as estimativas são de que, depois que pagar os investidores, o fundo terá ainda US$4 bilhões por ano para investir na preservação de florestas. Além disso, o alto capital inicial garantiria pagamentos permanentes sem precisar de reinvestimento.
A ideia do fundo é "remunerar financeiramente os serviços ambientais prestados pelas florestas", diz o texto do governo brasileiro.
Qual a diferença para outros fundos de conservação?
A principal diferença entre o TFFF e outros mecanismos de financiamento ambiental é a origem do dinheiro: enquanto fundos existentes recebem recursos de doações, o TFFF é uma opção de investimento. Isso muda o papel dos países, que passam de doadores a investidores, e também a maneira como o recurso é inserido no orçamento das nações, explica Maurício Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil.
As doações também subordinam, em certa medida, a sobrevivência dos fundos à agenda política e geopolítica. "Tem sido cada vez mais difícil manter os países doando para esses fundos. A gente tem visto isso no Global Environment Facility", diz Voivodic.
Há também diferenças em relação às métricas. Enquanto mecanismos como o REDD+ remuneram a redução de emissões de carbono, o TFFF privilegia a conservação florestal.
"Essa diferença é crucial. Países que já conseguiram conter o desmatamento, mas enfrentam pressões econômicas e sociais para expandir fronteiras agrícolas, passam a ter um incentivo real para manter a floresta", ressalta Juliana Lopes, Diretora de Natureza e Sociedade do CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável).
O fundo prevê monitoramento padronizado internacionalmente via satélite. Para Maurício Bianco, vice-presidente da Conservação Internacional, isso cria "um desafio e uma oportunidade de continuar aprimorando os métodos de monitoramento e medição" ao longo do tempo.
Dependência do mercado financeiro
Mesmo que em menor escala do ponto de vista político, o fundo também estará sujeito a flutuações econômicas e volatilidade geopolítica - como qualquer instrumento financeiro.
Os especialistas ressaltam o risco de que os investimentos não rendam o suficiente para remunerar os investidores e repassar recursos aos países que conservam as florestas.
"Em um ano de crise econômica ou global, pode não haver o rendimento necessário", diz Maurício Voivodic. Mas, de acordo com o diretor, os responsáveis pelo fundo estão tentando criar mecanismos para que isso não aconteça, ou pelo menos para mitigar impactos de possíveis recessões.
"Nesse sentido, é importante que ele permaneça atrativo para os investidores, a fim de gerar a escala de financiamento necessária para conservar as florestas tropicais. Para isso, a participação dos países é fundamental para garantir confiança e atrair investidores privados," explica Maurício Bianco.
Participação e distribuição
Em que medida o mercado vai achar esse investimento atrativo e colocar recursos nele? Esse é o principal risco à eficiência do fundo.
Por ser voluntária, a participação tanto de governos quanto investidores privados - e até beneficiários - é ainda uma questão sem resposta. Wendell Andrade, especialista do Instituto Talanoa, ressalta conversas avançadas do governo brasileiro com Reino Unido, Noruega e Alemanha, além de tratativas contínuas com França e China.
"A gente só vai saber ao longo do tempo, nos primeiros anos de implementação. E claro que tem um risco também de que alguns países simplesmente não queiram recurso, não entrem no mecanismo e continuem o desmatamento, inclusive utilizando isso como vantagem competitiva para atrair investimentos", levanta Voivodic.
O dinheiro vai ser distribuído a países ao invés de projetos. Por um lado, isso dá liberdade de estratégia de investimento em soluções de longo prazo, segundo Andrade. "Mas se o país aplicar o dinheiro em algo que não seja para conservação ou condições de estrutura para que o meio ambiente se mantenha funcionando, ele perderá dinheiro no próximo ciclo", explica.
Por outro, isso pode levar a uma falta de regulamentação complementar, diz Karen Oliveira, diretora de Políticas Públicas da TNC Brasil. Ela destaca a "necessidade de fiscalização e governança robusta para que os recursos sejam bem aplicados."
Soluções complementares
Os especialistas concordam que o valor estimado para ser gerado pelo fundo não é suficiente para suprir toda a demanda de financiamento existente, mas é maior do que mecanismos atualmente disponíveis.
Segundo a modelagem feita pela WWF-Brasil, há países que, se conseguirem zerar o desmatamento, podem receber "mais do que toda a soma que recebem atualmente somando todos os projetos de cooperação internacional", segundo o diretor-executivo Maurício Voivodic.
"O nível de lacuna que existe para chegar no 1,3 trilhão de dólares por ano, que é o proposto pelo Mapa do Caminho de Baku a Belém, é enorme. Estamos muito longe disso, então qualquer coisa que seja justa, fácil e monitorável é positiva no caminho de diminuição dessa lacuna", reforça Maurício Bianco, vice-presidente da Conservação Internacional.



























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