Presidente da COP30 defende discurso menos abstrato sobre crise climática

O presidente da COP30, André Corrêa do Lago, defendeu a necessidade de transformar as decisões climáticas das reuniões multilaterais em ações concretas. Ele reconheceu que as negociações internacionais muitas vezes resultam em declarações abstratas e destacou a importância de conectar os acordos com impactos reais na sociedade, de acordo com uma carta aos quase 200 estados participantes, divulgada hoje.

Faremos o nosso melhor para vincular a abstração dessas negociações e as decisões da COP à vida real, porque às vezes há uma certa percepção de que essas coisas não produzem os resultados necessários. André Corrêa do Lago, presidente da COP30

A próxima conferência do clima da ONU será realizada em Belém, entre 10 e 21 de novembro, e terá como um dos principais desafios avaliar os planos climáticos globais até 2035.

"Precisamos de uma nova era além das negociações: devemos ajudar a colocar em prática o que decidimos", escreveu o presidente da COP30 na carta pública.

No entanto, o cenário internacional é desfavorável, com a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris e a mudança de prioridades da Europa, que agora direciona seus olhares para a defesa. Como as decisões precisam ser tomadas por consenso, o diplomata brasileiro alertou para a dificuldade das negociações.

Corrêa do Lago também destacou os limites das instituições ligadas à Convenção da ONU sobre Mudança Climática. Para ele, a questão ambiental deve ser abordada de forma mais ampla, envolvendo diferentes setores e esferas da sociedade.

Na tentativa de impulsionar a cooperação global, o presidente da COP30 fez um apelo ao que chamou de "mutirão", palavra que deriva de uma palavra indígena que designa "uma comunidade que se reúne para trabalhar junto em uma tarefa comum". Ele convocou setores como finanças, autoridades locais, empresas e sociedade civil a se engajarem no combate às mudanças climáticas.

Entre as iniciativas da conferência, a presidência pretende reunir um "círculo de presidências" das COPs anteriores, de 2015 a 2024, além de incluir lideranças indígenas no evento. O objetivo é garantir que os debates resultem em compromissos práticos e efetivos para enfrentar a crise climática.

Como reagiram organizações ambientais

Greenpeace Brasil. "Apesar das contradições internas na busca por expandir a exploração de petróleo, o Brasil se mostra em posição privilegiada e relativamente confortável para liderar um movimento também urgente apresentado pelo balanço global: o fim do desmatamento e degradação florestal até 2030. Em se tratando de uma COP na Amazônia, a defesa da pauta florestal pode ser elemento essencial para que o Brasil desempenhe uma liderança forte e que apresente resultados históricos de implementação na COP30", disse a especialista em política internacional Camila Jardim.

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Observatório do Clima. "A carta tem momentos inspiradores. De vários pontos que merecem ser lidos com especial atenção, destacamos dois: o reconhecimento de que Belém acontece num momento em que a crise climática "chegou à nossa porta" e precisa ser tratada como a emergência que é; e o chamado ao multilateralismo, no momento em que este enfrenta sua pior crise desde pelo menos o fim da Guerra Fria, em 1989. Numa indireta à política externa da lei do mais forte implementada por Donald Trump, Corrêa do Lago afirma que "ao entendermos que somos todos interdependentes na luta contra a mudança climática, precisamos reconhecer que a comunidade internacional só pode ser tão forte quanto seu elo mais fraco".

ClimaInfo."A Carta da COP30 reflete as dificuldades de seu tempo. Ela acerta ao afirmar que toda liderança do século 21 será definida pela capacidade de liderar em clima. Para que sua liderança seja crível, o Brasil precisará enfrentar debates delicados e garantir que a implementação da agenda climática seja ampla e coerente. Se a COP30 pretende ser lembrada como a COP da implementação, a transição para longe dos combustíveis fósseis terá de ser o assunto central no dia 21 de novembro de 2025."

WWF-Brasil. "A carta do presidente da COP30 é uma mensagem contundente de defesa do multilateralismo, de que apenas saídas individuais não bastam para enfrentar o desafio global das mudanças climáticas. Só a partir do diálogo e da cooperação (e a COP é um espaço privilegiado para que isso aconteça) é que podemos adotar saídas e soluções coletivas para um problema que afeta diretamente a vida das pessoas em todos os lugares do mundo. Trata-se também de um chamado à ação: essa será a COP da implementação, destacando a essencial participação de lideranças indígenas, mostrando que ciência, tecnologia e conhecimentos tradicionais devem caminhar juntos para o enfrentamento das crises climática e de biodiversidade", disse Alexandre Prado, líder de mudanças climáticas do WWF-Brasil.

350.org. "A natureza proativa e detalhada dessa carta da presidência da COP30 é um sinal encorajador - especialmente em contraste com a COP29. No entanto, a COP30 deve ser marcada por ações concretas, não apenas discussões e anúncios de compromissos sem maneiras claras de implementá-los. Embora a carta reconheça a importância das NDCs, dos povos indígenas e das energias renováveis, ela não chega a exigir metas concretas de energia renovável e a eliminação gradual dos combustíveis fósseis. A presidência da COP30 não deve seguir os discursos contraditórios em torno da expansão dos combustíveis fósseis com os quais o governo brasileiro tem brincado ultimamente", disse Ilan Zugman, Diretor para a América Latina e Caribe da 350.org.

Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira): "O presidente da COP acerta ao ver as florestas como uma resposta importante para a urgência climática. No entanto, embora a proteção das florestas seja fundamental, a verdadeira solução para a crise climática está em mudar as causas que a geram. A preservação das florestas só será eficaz se ampliarmos a demarcação das terras indígenas, tivermos um bom financiamento direto e fizermos a transição para uma sociedade de baixo carbono — e isso precisa ser rápido. Não podemos mais adiar a eliminação dos combustíveis fósseis. A cautela na carta sobre esse assunto exige mais coragem e ambição. Caso contrário, como diz a própria carta, 'a falta de ambição será julgada como falta de liderança'. A Amazônia não vai aguentar, por mais que façamos a nossa parte, se o planeta continuar pegando fogo", Toya Manchineri, coordenador-geral da Coiab.

* Com informações da AFP

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