'Ar-condicionado natural' e peixinhos: casa-esponja gasta só R$ 40 com água

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Em tempos de chuvas torrenciais e enchentes, como as que atingem o país desde a última semana, o que fazer com tanta água? Quando a jornalista e ambientalista Cláudia Visoni decidiu construir uma cisterna vertical em sua casa há mais de uma década, ela queria muito mais do que simplesmente captar água da chuva para enfrentar uma escassez hídrica: sua ideia era criar um espaço que aproveitasse ao máximo todos os recursos naturais.
Esse foi o primeiro passo dela na construção de sua "casa-esponja", no bairro de Pinheiros, em São Paulo. O local se destaca pela captação e uso inteligente da água das chuvas.
A cisterna vertical - um reservatório construído em alvenaria que armazena 2.500 litros de água - ocupa uma parte do quintal aos fundos da casa. A água captada e armazenada no local e utilizada em diversas atividades domésticas, como regar plantas, lavar roupas e o quintal, reduzindo significativamente o consumo de água que vem pela rede pública.
"Eu aumentei muito o meu período de autonomia hídrica. Nos últimos três anos, não consumi toda a água que é captada e armazenada. Isso resultou em economia na conta de água. Moramos em três pessoas e gastamos em média 8 mil litros, menos de R$ 40", conta Visoni, que não soube estimar os gastos totais com as reformas.
Além disso, a casa conta com três jardins de chuva, um sistema projetado para absorver o excesso de água que escorre pelo terreno em dias chuvosos.
Em vez de deixar a água ir direto para os bueiros, sobrecarregando a drenagem urbana, esses jardins retém essa umidade, filtrando impurezas e permitindo que a água infiltre no solo de maneira natural.
Outro elemento essencial na casa-esponja é um lago artificial no corredor lateral do imóvel. O espaço tem um papel duplo: estético e ecológico.
Além de trazer beleza ao espaço, ele ajuda a regular a temperatura e a umidade do ambiente. Sendo também, mais um ponto de captação de água da chuva.
"Minha casa é muito mais fresca e úmida quando comparada aos outros imóveis do bairro, o lago funciona como um ar-condicionado natural. Ainda tem o benefício paisagístico, que é lindo", diz.
Para evitar que o local sirva de criadouro de dengue, Cláudia mantém no lago peixes que se alimentam de larvas do mosquitos, como o Aedes aegypti.
O conceito de casa-esponja implementado por Cláudia em sua residência é inspirado nas cidades-esponjas, desenhadas e pensadas para que se possa absorver grande volume de água. Apesar de ser uma atitude isolada no bairro, pode servir de inspiração para outros moradores e, assim, ampliar os benefícios.
"Embora as intervenções que busquem construir ou adaptar uma edificação tenham uma contribuição específica pequena, devemos valorizar a atitude e reconhecer o potencial pedagógico dessas iniciativas pontuais em influenciar a mudança no olhar e na consciência das pessoas", avalia explica Luis Madeira Domingues, doutor em Urbanismo, Coordenador de Saúde Urbana da Fiocruz Mata Atlântica e Coordenador do Programa Institucional Territórios Sustentáveis e Saudáveis da mesma entidade.
O que são as 'cidades-esponja'
Repensar em como as cidades são construídas e buscas alternativas para absorção da água da chuva são atitudes que passaram a ganhar destaque com as mudanças climáticas, que resultam em fenômenos naturais extremos, como as enchentes.
Na maioria dos centros urbanos, o concreto usado na pavimentação de ruas e avenidas é impermeável, fazendo com que a água não chegue ao subsolo de maneira rápida. O investimento em áreas verdes, telhados verdes e até mesmo em concretos que permitam a passagem da água são algumas das alternativas que podem amenizar o problema das enchentes.
"O conceito de cidade esponja se refere à capacidade que uma cidade oferece de absorver as águas de chuva, seja recarregando os lençóis freáticos e aquíferos, seja retardando seu escoamento em áreas passíveis de serem alagadas sem prejuízos sociais e ambientais", detalha Domingues.
Outra característica importante das cidades esponja é a adaptação para que elas tenham áreas alagáveis para onde a água possa escorrer sem causar destruição. Ou seja, é necessário criar grandes estruturas naturais alagáveis, como piscinões e jardins de chuvas, para que a chuva possa ser contida por um tempo e, depois, absorvida pelo lençol freático sem invadir as casas.
Qualquer cidade pode aprimorar progressivamente sua capacidade de absorver as águas de chuva e se tornar uma 'cidade esponja'. Para isso, segundo o especialista, é necessário um processo de planejamento e gestão sobre o uso e ocupação do solo, que compreenda a dinâmica hídrica original da área e atual de suas bacias hidrográficas.
"A preservação e a criação de novas áreas verdes em sistemas de espaços livres públicos, sejam parques, praças, jardins de chuva e arborização viária em passeios de pedestres, assim como a transformação de superfícies impermeáveis em coberturas verdes e permeáveis sempre que possível, podem ter um papel relevante para amenizar os impactos dos eventos naturais", acrescenta Domingues.
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