Emissões de metano disparam, e cientistas pedem ação imediata
As emissões globais de metano (CH4), o segundo mais importante gás causador do efeito estufa (GEE), atrás apenas do dióxido de carbono (CO2), estão aumentando na taxa mais alta em décadas, de acordo com um estudo publicado na Frontiers in Science.
O metano (CH4) é considerado o segundo maior vilão do aquecimento global.
É o segundo GEE mais abundante na atmosfera.
Atividades humanas provocam mais da metade das emissões de metano no mundo.
De acordo com os pesquisadores, as emissões antropogênicas de metano desde o período pré-industrial (1850-1900) até 2019 foram responsáveis pelo equivalente a 65% do aquecimento causado pelo dióxido de carbono (CO2) até hoje.
As emissões de metano têm aumentado significativamente desde cerca de 2006 e continuarão a crescer ao longo do restante da década de 2020, e medidas drásticas são necessárias para limitar o aquecimento global a 1,5°C ou 2°C, como prevê o Acordo de Paris, conclui o artigo, assinado por 15 cientistas de diferentes países.
Quase 580 milhões de toneladas de metano são emitidas a cada ano, das quais 60% são atribuíveis à atividade humana (principalmente a agricultura) e quase um terço às áreas úmidas naturais.
Embora o mundo tenha se concentrado no dióxido de carbono como o principal motor do aumento das temperaturas globais, pouco foi feito para combater o metano, apesar de ele ter um potencial de aquecimento 80 vezes maior que o dióxido de carbono em um período de 20 anos.
Qual é o papel do metano na crise climática e por que o Brasil precisa se preocupar?
O aumento da emissão de gases do efeito estufa (GEE) nas últimas décadas como resultado de atividade humana é o responsável pelo agravamento do efeito estufa, que aquece a Terra e provoca as mudanças climáticas que já estão impactando seriamente todo o planeta. O gás carbônico (CO2) é o principal responsável pela crise que o mundo enfrenta atualmente, por ser o GEE emitido em maior volume. Mas outros gases também têm papel fundamental no cenário atual.
Seu potencial de esquentar o planeta é cerca de 80 vezes maior do que o CO2. Porém, ele é um gás que tem vida curta (SLCP, em inglês "short-lived climate pollutant"), permanecendo na atmosfera de 12 a 14 anos, enquanto o gás carbônico pode continuar por mais de um século no ar. Assim, seu efeito é mais intenso, mas breve.
Por isso, cientistas defendem que reduzir drasticamente as emissões de metano é tão importante quanto descarbonizar as economias e trará resultados mais imediatos, dando mais tempo para a redução de outras emissões, para a transição energética e a adaptação climática.
Quais são as atividades que mais emitem metano?
A natureza em equilíbrio possui diferentes fontes de emissão de CH4, como a ação de bactérias metanogênicas (que produzem metano durante seu metabolismo), presentes em diversos tipos de ambientes, e em processos como as erupções vulcânicas. Atualmente, as atividades humanas já provocam mais da metade das emissões de metano no mundo.
O aumento nas últimas décadas está associado principalmente a três fontes:
Extração e uso de combustíveis fósseis
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Aterros sanitários
Na indústria de combustíveis fósseis, o metano é o principal componente do gás natural e também é emitido em diversas etapas da exploração e uso de carvão e petróleo, no que é chamado de "emissões fugitivas".
Já nos aterros sanitários e na agropecuária, o CH4 é resultado da ação das bactérias metanogênicas. Elas estão presentes em ambientes úmidos (podendo proliferar, por exemplo, em áreas de cultivo de arroz), no sistema digestivo de animais ruminantes, como vacas e ovelhas, e são também predominantes nos processos de decomposição de matéria orgânica.
Apesar de a ação dessas bactérias ser um processo natural, o impacto do aumento das emissões de metano na temperatura do planeta é resultado da grande expansão da pecuária e do aumento da produção de resíduos orgânicos muito acima dos níveis pré-industriais, por conta do rápido crescimento da população nas últimas décadas.
Como estão as emissões de metano do Brasil atualmente?
A maior fonte no país é a agropecuária. O setor soma mais de 70% das emissões nacionais, em dados de 2020, com a pecuária respondendo por mais de 90% principalmente pela fermentação entérica (o "arroto do boi"). Naquele ano, o IBGE indicou que o rebanho brasileiro bateu recorde, passando de 234 milhões de animais. Ou seja, no Brasil vivem hoje mais vacas e bois do que pessoas, e todos eles estão eliminando gás metano diariamente. O manejo de dejetos animais, cultivo de arroz irrigado e queima de resíduos da cana-de-açúcar também são fontes relevantes.
O setor de resíduos fica em segundo lugar como fonte de emissões de CH4, com 15,8%, em 2020, e as mudanças de uso da terra, em especial as queimadas, representam 9%. O setor de energia corresponde a menos de 3% no país, com destaque para a queima de lenha e a exploração e produção de petróleo e gás natural.
O que o Brasil tem feito para reduzir suas emissões de metano?
Em 2021, durante a COP26 em Glasglow, o Brasil assinou o Compromisso Global do Metano, no qual mais de 100 países se comprometeram a reduzir as emissões deste GEE em 30% até 2030 (em comparação com níveis de 2020).
Meses depois, o governo federal lançou o Programa Nacional de Redução de Emissões de Metano - Metano Zero, com foco especial no reaproveitamento do gás emitido por resíduos sólidos urbanos e agrícolas para produção de biometano. No campo, o tema é tratado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária dentro do Plano de Adaptação e Baixa Emissão de Carbono na Agricultura - ou Plano ABC+, que visa estimular uma produção mais sustentável.
Mas, na prática, especialistas afirmam que poucas ações têm sido colocadas em prática de forma efetiva e em grande escala, e com a urgência necessária para que o país cumpra suas metas climáticas.
O que deveria ser feito para reduzir as emissões de metano no Brasil?
Para conseguir atingir seus compromissos, é fundamental que o país foque no seu principal emissor: a pecuária.
A ciência vem trabalhando no melhoramento genético e no desenvolvimento de suplementos alimentares que facilitam a digestão e, dessa forma, reduzem a produção do gás.
Outra mudança que teria grande impacto é a redução no tempo de abate. "Animais mais jovens emitem menos metano. Portanto, o abate precoce (com 24 a 30 meses de idade) pode reduzir as emissões em até 12% em comparação com o abate de animais com 36 meses ou mais", explica Camila Genaro Estevam, bióloga pesquisadora do Observatório de Bioeconomia da Fundação Getúlio Vargas.
A adoção de terminação intensiva (técnica relacionada à fase final de engorda do animal) é mais uma estratégia que se provou eficaz. Além disso, é fundamental ampliar a adoção de tecnologias mais eficientes no manejo de dejetos, como o uso de biodigestores e compostagem.
Por fim, a recuperação de pastagens degradadas e a implementação de sistemas agrossilvipastoris (associação de pastagem e cultivos agrícolas e florestais na mesma área) trariam grandes benefícios ambientais, e teriam também impacto indireto na redução das emissões.
No setor de resíduos, especialistas apostam na expansão do aproveitamento do metano para geração de biogás. E na frente de energia, é necessário controlar as emissões fugitivas da indústria de petróleo e gás do país.
Segundo análise do SEEG, com essas e outras práticas e usando tecnologias que já existem, o Brasil conseguiria reduzir suas emissões de metano em 36,4%, cumprindo assim o compromisso assinado e contribuindo para o enfrentamento ao aquecimento global.
Fontes: Camila Genaro Estevam, bióloga pela Unesp-Rio Claro e pesquisadora do OCBio (Observatório de Bioeconomia da Fundação Getúlio Vargas) com foco no tema de mensuração de emissões, remoções e estoque de carbono; Renata Potenza, especialista em Ciência do Clima do Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola); SEEG (Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima).
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