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Homicídio de primo inspira PM a ensinar bodyboard a pessoas com deficiência

Projeto oferece aulas de bodyboard a pessoas com deficiência em Sergipe - Divulgação
Projeto oferece aulas de bodyboard a pessoas com deficiência em Sergipe Imagem: Divulgação

Ed Rodrigues

Colaboração para Ecoa, do Recife

01/08/2022 06h00

"Ser feliz fazendo o outro feliz é contagiante", diz a policial militar Anne Bastos. Anne e o marido Byron Silva, também PM, deram início ao projeto filantrópico que promove a inclusão de pessoas com deficiência por meio de aulas gratuitas de bodyboard, em Sergipe. Ele dá a chance de conhecer o prazer de descer uma onda a quem não teria essa oportunidade.

O Estrelas do Mar conta com 122 voluntários, e já alcançou a marca de três mil pessoas assistidas. O projeto tem parceria com universidades, que aproveitaram o trabalho polo de estágio para estudantes de educação física, fisioterapia e psicologia.

A Ecoa, Anne conta que o marido é atleta de bodyboard e que em 2011 deu início a uma escola especialista no esporte. A escola acolhia algumas crianças carentes. Eles decidiram colocar o projeto no papel e apresentar à Apae de Sergipe (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais).

"Byron solicitou que a Apae reunisse as mães/pais das pessoas com síndrome de down para que apresentasse a proposta do projeto: dez vagas disponíveis na escola de surfe para pessoas com síndrome de down. Nascia um projeto de inclusão social, desenvolvido por uma organização sem fins lucrativos que registramos oficialmente como Organização Beneficente Estrelas do Mar", disse.

Em nome do primo

Segundo a militar, Byron surfava desde criança e incentivava os irmãos, primos e amigos a praticarem o bodyboard. Um primo, em especial, Ailton "Kostela", dedicou-se imensamente ao esporte e acabou "superando o mestre". Os dois surfavam juntos e costumavam incentivar crianças de rua e da comunidade a praticar o surfe.

"Por vezes, quando iam surfar levavam meninos moradores de rua que encontravam pelo caminho. No ano de 2010, dia 17 do mês de maio, quando Ailton Kostela estava na Atalaia, bairro litorâneo onde morava, presenciou um assalto a um adolescente. Na tentativa de impedir o assalto foi atingido por três tiros no abdômen e, no dia 18 de maio veio a falecer. Após o falecimento dele, Byron passou um ano sem surfar e, como um agente da segurança pública, alimentava uma imensa frustração por ter perdido seu primo para a violência humana", diz Anne.

Um ano após a morte de Kostela, Byron "teve coragem" de voltar à praia e surfar. Nesse dia, Byron pegou suas pranchas e as pranchas de Kostela, decidindo por levar os dois filhos de Kostela, os seus sobrinhos, irmãos menores, sua esposa e filha para o mar. Com as pranchas na areia e com aquele aglomerado de crianças acabou sendo questionado se se tratava de uma escola de bodyboard. Naquele momento Byron lembrou da intenção do primo de criar uma Escola para crianças carentes.

"O Estrelas do Mar não é um projeto para pessoas com deficiência. É um projeto de inclusão social. As aulas acontecem todos os sábados, das 8h às 12h, na área verde do Restaurante Solarium, na Praia de Atalaia, faça chuva ou faça sol. O encontro semanal é dividido em quatro fases: recepção, parte lúdica - interativa, aquecimento e surfe. Atualmente, 160 pessoas são cadastradas no projeto. Dessas, 50 famílias são participantes ativas", ressaltou Anne.

Em parceria com universidades, estudantes participam como voluntários, em um estágio supervisionado ou atividade de extensão de diversos cursos. Os encontros contam com atividades lúdicas, elaboradas pelos estagiários das universidades ou pelos voluntários permanentes do projeto, bem como contam com a atividade física realizada através do surfe. No fim do encontro, os presentes são convidados a agradecer a Deus pela oportunidade de fazer o bem e é servido um lanche para todos.

Alguns alunos chegaram ao projeto com quadro depressivo, bem como seus pais ou mães. Eles costumam dizer que frequentar o Estrelas do Mar é, entre outras coisas, uma terapia emocional.

A função do voluntário, explica Anne, é interagir com o aluno e acompanhá-lo no momento do surfe. Se a pessoa novata não tiver experiência com o surfe, ela segue para o mar acompanhada com um voluntário experiente ou com um dos alunos que não praticam o surfe, mas ainda assim frequentam o projeto.

"Sim, alguns alunos não participam do momento do surfe, mas não perdem um encontro sequer. Percebemos com isso o quanto o acolhimento que ofertamos no projeto é importante e indubitavelmente valorizado pelos assistidos", ressaltou.

O menino e o mar

A dona de casa Eliene de Araújo tem um filho com paralisia cerebral. Jefferson dos Santos participa do projeto e diz que é o melhor do mundo.

"Eu conheci através de uma mãe que já frequentava. Levei meu filho e nos apaixonamos. Ele tinha medo de entrar no mar. Agora, ele só está feliz quando está no projeto. Eu acho que ele gosta, mas de estar lá do que em casa. Esse casal e todos que faz parte do projeto são anjos que Deus mandou para a nossa vida", disse a Ecoa.

Quando iniciaram o projeto, o casal não tinha dimensão da sensação e do sentimento gerado por fazer o outro ser feliz. A alegria, continua Anne, é o ponto referencial dos encontros e uma meta comumente atingida.

"Cada grito de alegria, cada sorriso gerado pela troca mútua de carinho e amor é impagável. Acreditamos que, mais do que vir ao mundo para brilhar, viemos para sermos luz na vida de outras pessoas", diz a PM.