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Brasil deve se preocupar com onda de calor? Europa bate recorde de 47ºC

Temperatura alta atinge países europeus; na casa da Rainha, guarda precisa de ajuda para se refrescar Imagem: REUTERS/John Sibley

Antoniele Luciano

colaboração para Ecoa, de Curitiba (PR)

23/07/2022 06h00

Roupas leves, chapéu, óculos escuros e muita água. Esse tem sido o kit do empresário curitibano Michel Prado, de 34 anos, para vencer o calor durante as férias na Europa.

Embora tivesse visto notícias de que as temperaturas estavam mais altas em Londres nesse verão, ele não imaginava o que encontraria na cidade.

Por lá, os termômetros ultrapassaram os 40ºC, uma marca histórica, de acordo com o serviço nacional de meteorologia, o Met Office. Em Portugal foi pior: 47ºC. "Mesmo para quem está acostumado com o calor do Brasil é difícil. É um clima muito seco", conta Prado.

Ao longo desses dias, o brasileiro viu desde pessoas andando com leques e pequenos ventiladores portáteis em locais de grande circulação, como metrôs, a alertas locais, no interior do Inglaterra, para que os moradores só saíssem caso fosse realmente necessário. E a jornada em altas temperaturas não terminou ao deixar o país.

Na Espanha, as noites quentes em Girona chamaram a atenção do rapaz. "Eram 20h30 e ainda estava 29ºC. Como a cidade tem ruas com muitas pedras e não venta, à noite tudo ainda estava muito quente", lembra.

Britânicos tentam se refrescar durante forte onda de calor no Reino Unido Imagem: Rasid Necati Aslim/Anadolu Agency via Getty Images

Esse cenário acompanhado por Prado é provocado por ondas de calor que têm preocupado cientistas e autoridades mundo afora. Somente em Portugal e na Espanha, mais de mil pessoas já morreram em decorrência das temperaturas acima da média. Houve ainda o registro de uma série de incêndios na França.

O que causa esse tipo de fenômeno? Qual a sua relação com o aquecimento global? Ecoa ouviu especialistas para responder essas e outras questões sobre o assunto.

Por que tanto calor?

Na França, termômetros chegam a marcar 42ºC Imagem: Valentine CHAPUIS/AFP

Basicamente, uma onda de calor ocorre quando se tem uma massa de ar quente estacionária sobre uma determinada localidade, explica o cientista do Clima Alexandre Araújo Costa, professor na Universidade Estadual do Ceará (UECE). Essa situação bloqueia a chegada de massas de ar polar e mantém a temperatura elevada na região.

Ainda que esse seja um fenômeno que existe naturalmente, o deslocamento para temperaturas mais altas tem tornado a situação mais preocupante.

"Não podemos mais chamar de fenômeno natural porque essa onda de calor vem turbinada pelo aquecimento global, que joga o pico de temperatura alguns graus acima. Uma onda que não seria mortal há décadas, hoje, traz riscos mais acentuados".

Alexandre Araújo Costa, cientista do clima

Bombeiro francês frita ovo no chão quente Imagem: Thibaud Moritz/AFP

E o Brasil? Vai ter onda de calor?

Pelo Brasil, embora seja inverno, há um efeito parecido.

"A princípio, deveríamos esperar no máximo alguns veranicos no inverno. Às vezes as pessoas se surpreendem com eventos de frio extremo, mas não deveriam. Todas as estáticas mostram nitidamente que os recordes de frio estão mais raros que os de calor. No conjunto das estações meteorológicas no mundo, os eventos de calor extremo estão mais frequentes", reforça o professor.

Clima quente faz lotar praias européias Imagem: Daniel Leal/AFP

Doutorando no Programa de Meteorologia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IGA/USP), o pesquisador Isaque Saes Lanfredi acrescenta que as ondas de calor podem ocorrer tanto no hemisfério sul quanto no hemisfério norte.

A diferença é que por ter uma região com mais terra essas mudanças são mais intensas no hemisfério norte do que em comparação ao hemisfério sul.

Nesse ano, além de países europeus, os Estados Unidas, Índia e Paquistão também já registraram temperaturas acima da média.

Calor intenso também chegou aos Estados Unidos Imagem: Spencer Platt/Getty Images

O que as mudanças climáticas têm a ver com isso?

Lanfredi analisa que são diversos os fatores envolvidos na ocorrência de ondas de calor. O aquecimento global é um deles e não deve ser descartado, uma vez que o que se tem verificado não são fenômenos isolados.

"Se começamos a ter várias ondas de calor pipocando ao longo do hemisfério norte ou atingindo áreas muito grandes, temos um componente natural, mas também temos ação antropogênica", diz.

Costa observa que a situação crítica no hemisfério norte já vinha sendo motivo de alerta de cientistas há anos em função do aquecimento global.

Em Londres, população inventa formas de tentar aliviar o calor Imagem: Niklas Halle'n/ AFP

O professor sustenta que relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) mostram isso de forma nítida ao apontar um aquecimento, em média, de 1,8ºC em regiões continentais.

"Mudanças que parecem modestas na temperatura média já implicam alterações substanciais na probabilidade estatística de eventos de onda de calor", argumenta.

Animais de um zoológico em Chester ganharam comida congelada e banho frio para se refrescarem Imagem: REUTERS/Phil Noble

Mais onda de calor para o futuro

Segundo Costa, eventos que poderiam acontecer a cada 50 anos estão cinco vezes mais frequentes, com uma ocorrência a cada década, em média. "O mais dramático é que a cada décimo de grau que a temperatura avança, essa proporção aumenta exponencialmente", salienta.
Quais os riscos desse tipo de cenário?

Ondas de calor intenso podem levar a problemas como desidratação severa, desequilíbrio de biomas, secas, incêndios e mortes.

"Os incêndios envolvem um efeito devastador na fauna e flora, além de mais emissão de carbono. A ausência de enfrentamento do problema pode nos colocar em um momento em que o aquecimento global ganha força própria", destaca Costa.

Por causa da alta temperatura, florestas pegam fogo na Europa Imagem: Philippe Lopez/AFP

Qual o caminho para frear essas mudanças?

Ambos os pesquisadores consultados acreditam que faltam políticas públicas para reduzir emissões de gases e, logo, frear o aquecimento global. A mudança precisa vir urgentemente.

"A população mundial está aumentando e a necessidade de energia como um todo vai aumentar também", alerta Lanfredi.

Costa, por sua vez, afirma que o melhor que se pode fazer agora é contenção de danos, o que significa abandonar combustíveis fósseis e encerrar outras fontes de emissão, como o desmatamento.

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