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O que diz o premiado plano de Bogotá contra as mudanças climáticas?

Claudia Lopez, prefeita de Bogotá, ao lado de frota de ônibus elétricos, aposta para reduzir a poluição na cidade - Jhon Paz
Claudia Lopez, prefeita de Bogotá, ao lado de frota de ônibus elétricos, aposta para reduzir a poluição na cidade
Imagem: Jhon Paz

Luana Lourenço

Colaboração para Ecoa, de Brasília

15/07/2022 06h00

Conhecida por suas ciclovias e citada em vários rankings de sustentabilidade, Bogotá, capital da Colômbia, recebeu recentemente mais um prêmio ambiental, o One Planet City, do WWF Global. Dessa vez, o reconhecimento tem a ver com o Plano de Ação Climática da cidade, que coloca a metrópole de quase 8 milhões de habitantes na vanguarda latino-americana do enfrentamento da crise climática.

O prêmio foi dividido com a cidade sueca Lund, em uma competição com 280 representantes de 50 países. Segundo o WWF, Bogotá se destacou pelo compromisso político com o combate à crise climática, a avaliação detalhada dos riscos por região e objetivos ambiciosos a longo prazo.

Com 30 grandes metas de mitigação e adaptação, o plano climático de Bogotá quer reduzir as emissões da capital em 15% até 2024, em 50% até 2030 e tornar a cidade carbono neutro em 2050.

"O plano foi construído sobre conhecimento científico e as ações estão enfocadas em aumentar as áreas verdes, implementar soluções baseadas na natureza e promover a produção e consumo responsável, mobilidade sustentável e mudança de hábitos. Estamos muito orgulhosos desse reconhecimento, mas seguimos fazendo nossa tarefa para que essa ação se converta em política pública e perdure independente de quem esteja no governo", disse a Ecoa a secretária do Ambiente de Bogotá, Carolina Urrutia.

O plano

Cada meta do plano traz uma descrição detalhada com os objetivos a curto, médio e longo prazo, a zona de impacto, os benefícios diretos e indiretos, os órgãos responsáveis pela execução e uma escala de viabilidade que mostra o nível de envolvimento de autoridades, apoio, financiamento e tecnologia disponíveis para o cumprimento da ação.

Uma das apostas do plano é atacar a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa da cidade, o setor de transportes, responsável por 48% do total de 11 milhões de toneladas de CO². Entre as metas para essa área está a substituição total da frota de ônibus da cidade por veículos elétricos. A transição já começou e até o fim deste ano, cerca de 1,5 mil estarão nas ruas.

Bogotá - iStock - iStock
1,5 mil novos ônibus elétricos estarão nas rua de Bogotá até o final do ano
Imagem: iStock

Também foi anunciada a construção de uma usina de termovalorização de resíduos, que vai produzir energia por meio da queima de lixo inorgânico. "A ação climática não é apenas importante, mas urgente, por isso avançamos em planejar ações enquanto implementamos outras", afirma Carolina Urrutia.

As medidas de mitigação também incluem metas para as emissões ligadas à energia, com a substituição de lâmpadas comuns por LED - que consomem menos - em 90% dos prédios públicos e privados; a redução do uso de gás nas residências, com estímulo à energia solar; e a melhora em até 71% da eficiência energética da indústria.

Na área de resíduos, os desafios de Bogotá são complexos, porque a cidade ainda tem aterros onde o lixo é queimado. Algumas das metas do plano para essa área são o aumento gradativo do percentual de reciclagem de papéis e plástico, e a universalização do tratamento de água e esgoto até 2050.

Para salvar a população

Já os objetivos de adaptação previstos no plano de Bogotá querem preparar a cidade para os riscos relacionados a eventos climáticos extremos, como grandes tempestades e aumento da temperatura, e seus impactos sobre a qualidade de vida da população e a biodiversidade.

A avaliação de riscos climáticos por zona nos permitiu saber que, provavelmente, em 2040, inundações, incêndios florestais, cheias súbitas e ilhas de calor urbanas poderão ser mais intensas e frequentes em diferentes zonas da cidade", explica a secretária municipal.

Para isso, o governo local quer investir na recuperação de áreas degradadas, na criação de novas unidades de conservação e de manejo sustentável e na construção de corredores ecológicos para ligar as áreas verdes da cidade, conhecida pelo entorno montanhoso e pelos humedales, zonas úmidas ricas em biodiversidade.

As metas de adaptação também incluem ampliar o percentual de obras públicas que adotem técnicas de construção sustentáveis, fortalecer o sistema de alertas de risco de eventos climáticos extremos e reassentar famílias que vivem em áreas mais vulneráveis a essas ocorrências.

Cidades e mudança do clima

Com 55% da população mundial e responsáveis por cerca de 70% das emissões globais de gases de efeito estufa, de acordo com o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), as cidades são ao mesmo tempo agentes das mudanças climáticas e locais onde os impactos do aquecimento poderão ser mais catastróficos. Por isso iniciativas como a de Bogotá são importantes, segundo Felipe Barcellos e Silva, analista de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA).

Bogotá - As cidades são responsáveis por 70% das emissões globais de gases de efeito estufa, que causam as mudanças no clima - As cidades são responsáveis por 70% das emissões globais de gases de efeito estufa, que causam as mudanças no clima
Bogotá
Imagem: As cidades são responsáveis por 70% das emissões globais de gases de efeito estufa, que causam as mudanças no clima

"As cidades têm papel importante para redução dos gases de efeito estufa porque várias das ações para isso estão sob atribuição do poder municipal, como transporte e trânsito, planejamento territorial, gestão dos resíduos sólidos. Mesmo a redução do desmatamento e mudança do uso da terra, mais ligadas a estados e governo federal, também podem ser feitas pelos municípios, com incentivo ao reflorestamento, à criação de parques, pagamento por serviços ambientais", destaca.

Na edição deste ano, o prêmio do WWF Global não teve nenhuma cidade brasileira entre as 85 finalistas. A ausência é um reflexo do baixo engajamento do país no enfrentamento da crise climática, com perda de protagonismo nos fóruns globais e falta de compromisso claro do governo federal com o tema.

"Vários sinais do governo atual vão na contramão da redução de emissões, como o desincentivo aos órgãos ambientais, colocar em xeque a validação do monitoramento do desmatamento por órgãos oficiais, como o Inpe. E claro que essas ações e sinais do governo federal se refletem a nível municipal, principalmente em um país em que os municípios dependem muito de verbas da União", pondera Silva.

Metrópoles como Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Salvador têm planos municipais de combate às mudanças do clima e outras cidades do país contam com leis específicas sobre medidas anti-aquecimento. Os instrumentos, segundo Silva, são importantes para conhecer o cenário e mapear os passos para limitar as emissões, mas as ações precisam sair do papel.

O plano climático da capital paulista, por exemplo, assim como o de Bogotá, prevê a redução das emissões em 50% até 2030 e a neutralidade de carbono em 2050, em consonância com o objetivo definido no Acordo de Paris de limitar em 1,5° C o aumento da temperatura do planeta até 2100.

"Com os planos as cidades podem ser cobradas, porque colocam seus compromissos em um documento formal e, claro, que as soluções listadas sejam colocadas em prática. Melhor ainda quando eles estão conectados com outras políticas municipais e também do estado e nacionais", finaliza Felipe.