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Mulher celebra reabilitação facial em casamento da filha: 'Mãe mais feliz'

Denise Vicentin no casamento da filha Jéssica, em dezembro de 2021 - Arquivo pessoal
Denise Vicentin no casamento da filha Jéssica, em dezembro de 2021 Imagem: Arquivo pessoal

Maiara Marinho

Colaboração para Ecoa, em São Paulo

12/04/2022 06h00

Aos 55 anos, Denise Vicentin se sente realizada por ter ido ao casamento dos filhos sem medo de como as pessoas olhariam para ela. Isso lhe pareceria inimaginável algum tempo atrás: durante sete anos, não se sentiu confortável para socializar e muitas vezes criava desculpas para não sair à rua com familiares, os únicos com quem manteve contato nesse período.

É que, após uma cirurgia para retirada de um carcinoma epidermoide — um tumor maligno — no céu da boca, outras regiões de seu rosto acabaram sendo afetadas pelo procedimento. Com isso, perdeu o olho esquerdo e uma parcela do nariz e da mandíbula. "Espelho já não existia mais em minha casa e, para me proteger de preconceitos, de olhares que machucam, criei um mundo particular fora do convívio social", conta ela.

As coisas começaram a mudar há menos de três anos, quando Denise começou uma reabilitação bucomaxilofacial no Instituto Mais Identidade. O local é especializado em casos como esse e foi criado para atender pacientes de maneira gratuita. "Fui reabilitada com a prótese ocular no final de 2019. No ano passado, em 2021, dois dos meus filhos casaram. Eu era a mãe mais feliz e mais socializada, vivendo com plenitude cada detalhe. Reabilitação é vida!", relata.

Aperfeiçoando o que já existe

Kit cirúrgico para realização dos implantes pelo Instituto Mais Identidade - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Kit cirúrgico para realização dos implantes pelo Instituto Mais Identidade
Imagem: Arquivo pessoal

O Instituto é resultado de um trabalho de mais de 30 anos de pesquisa e desenvolvimento de técnicas de implantes para a reabilitação de pessoas que perderam parte de algum membro da face em decorrência do câncer ou de traumas. "Desde 1995, a gente vem criando aqui no Brasil diversas revoluções na forma de fazer as reabilitações, usando conceitos tradicionais e modernizando com algumas técnicas", relata um dos fundadores, o cirurgião dentista Luciano Lauria Dib.

Luciano é professor da Faculdade de Odontologia na Universidade Paulista (UNIP) e desenvolve pesquisas na área com estudantes dos cursos de mestrado e doutorado. "Em 2015, uma pesquisa nossa modificou bastante a técnica usada para fazer as próteses. Passamos a usar conceitos de tecnologia 3D e barateamos os custos", diz ele.

Desenvolvida pelo aluno Rodrigo Salazar, que também atua no Instituto, a técnica inovou ao criar o "Método +ID", que faz o escaneamento facial com o uso de smartphones e usa impressoras 3D para a produção das próteses. "Isso repercutiu no mundo todo", conta ele. Paralelo a isso, o grupo fazia trabalho assistencial na Escola Paulista de Medicina.

Com a crise econômica, no entanto, ficou difícil dar sequência aos projetos. Na busca por alternativas para dar continuidade ao trabalho assistencial, em 2015, Luciano se juntou a um grupo de profissionais e criou formalmente o Instituto Mais Identidade, uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos (OSCIP) com a ideia de buscar formas de captar recursos para continuar com as ações.

Mais atendimentos

clinica - Divulgação - Divulgação
Da esquerda para a direita: Dr. Flavio Bezerra (cirurgião dentista especialista em prótese bucomaxilofacial), Dr. Luis Eduardo Barbalho (médico cirurgião e coordenador do serviço de cirurgia de cabeça e pescoço da Liga contra o Câncer de Natal) e Dr. Luciano Dib (presidente e fundador do Instituto Mais Identidade). A foto foi tirada na clínica do Dr. Flávio, que a cedeu para os trabalhos de instalação das próteses, em Natal (RN), em abril deste ano
Imagem: Divulgação

Em 2018, a UNIP entrou como parceira do projeto e possibilitou a construção de um espaço físico, localizado no campus de Indianópolis, na zona sul de São Paulo. "Mas quando a gente tinha o nosso espaço para abrir, modernizado, veio a pandemia e gerou uma restrição", conta Luciano. Com o apoio do programa VOA, da Ambev, em 2021, o Instituto recebeu mentoria e conseguiu realizar atendimentos a distância. Com isso, a equipe pôde fazer 10 atendimentos em Natal, no Rio Grande do Norte, além dos que já haviam sido realizados em São Paulo.

Atualmente, são feitos 20 atendimentos por ano na capital paulista. Mas a expectativa é de, em breve, realizar ao menos 50 nesse mesmo período, já que a equipe será expandida. Na sede do Instituto, são feitos os atendimentos e as próteses. As cirurgias para implantes são feitas em parceria com os hospitais onde o paciente tratou o câncer ou o trauma facial.

A fim de fazer um trabalho interdisciplinar, serão contratados também profissionais da área da psicologia e assistência social. "Às vezes a pessoa recebe a prótese, mas não se sente apta a se inserir na sociedade. Então esse suporte psicológico é fundamental", diz Luciano. Através do apoio do Programa Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência (PRONAS/PCD), a equipe de profissionais será expandida de 4 para 12.

Luciano está animado com a possibilidade de fazer mais atendimentos gratuitos e de poder desenvolver ainda mais as pesquisas na área. Mas o mais importante, diz ele, é o impacto na vida das pessoas reabilitadas: "Eles demonstram felicidade e plenitude, mostram como a família melhorou e se reintegrou, as possibilidades de trabalho que surgiram". Denise é um bom exemplo: "Ali eu fui curada de dentro para fora."

É possível ajudar fazendo uma doação por meio do site oficial do projeto.