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'Curral' retrata os vícios políticos que persistem no Brasil

Cartaz de "Curral"; filme deve chegar às plataformas de streaming até o final do primeiro semestre de 2022 - Divulgação
Cartaz de 'Curral'; filme deve chegar às plataformas de streaming até o final do primeiro semestre de 2022 Imagem: Divulgação

Maiara Marinho

Colaboração para Ecoa, em São Paulo

14/01/2022 06h00

Na pequena Gravatá, uma cidade de Pernambuco que sofre com a escassez hídrica, a corrida pela eleição municipal é o tema central do filme "Curral". O nome da obra é uma referência a "curral eleitoral", termo usado por historiadores para se referir às regiões dominadas pelo coronelismo entre 1889 e 1930. Na época, o voto era aberto e os coronéis costumavam comprar os votos das populações sob sua influência para que elegessem seus candidatos.

O filme mostra que essa prática ainda está presente na cultura política de muitos lugares no Brasil. Nesse cenário, a campanha eleitoral é feita de porta em porta e tudo pode se transformar em moeda de troca: cesta básica, favores e, no caso de Gravatá, a água.

A produção é de Bárbara Maranhão e Marcelo Brennand, que dirige o filme e assina o roteiro junto com Fernando Honesko e Marcelo Müller. Em 2008, Brennand dirigiu o documentário "Porta a Porta - A Política em Dois Tempos". O material foi um prelúdio para "Curral" e documentou a eleição municipal em Gravatá em tempo real, mostrando o comportamento de candidatos e eleitores. O documentário foi lançado em 2010 e, em 2018, as gravações do filme tiveram início — um dia após o resultado da eleição presidencial que elegeu Jair Bolsonaro (PL).

"Quando o resultado das eleições saiu, o clima era fúnebre", comenta Bárbara Maranhão. "Mas a equipe focou na produção e deu o seu melhor. Foi surpreendente que a gente tenha conseguido produzir um filme sobre política depois de um golpe tão violento", relata.

Dilemas morais

Daniela Nader/Divulgação - Daniela Nader/Divulgação - Daniela Nader/Divulgação
Thomas Aquino e Rodrigo García em 'Curral'
Imagem: Daniela Nader/Divulgação

Em "Curral", o personagem Chico Caixa, vivido pelo ator Thomás Aquino, é um ex-funcionário da distribuidora de água da cidade e um jovem com princípios e sonhos que se vê diante da oportunidade de transformar sua angústia em ação política. Tudo começa quando um amigo de infância reaparece em sua vida, agora como um candidato a vereador que promete combater a velha política. Ele o convida para ajudar em sua campanha e a promessa de fornecimento de água cai como uma luva para angariar votos.

No decorrer do filme, no entanto, a exploração de uma necessidade básica da população para garantir a vitória nas eleições se transforma em um dilema moral para o personagem, que se vê dividido entre o Chico cidadão e o Chico político.

Segundo Bárbara, abordar a política dessa maneira é reconhecer que o sistema eleitoral é problemático. "Mostrar como o sistema corrompe até os mais bem-intencionados é essencial para que as mudanças aconteçam". Para ela, "as pessoas se afastam da política não porque ela é ruim e sim porque elas não sabem como mudá-la". Por esse motivo a produtora acredita que "mostrar o valor de cada voto e da importância que ele tem para quebrar esse círculo vicioso é muito importante e o filme pretende provocar essa reflexão".

Outro destaque é a personagem Mariana (Carla Salle), uma ativista que mora em um povoado ao redor de Gravatá e é bastante atenta ao jogo político, além de ser uma mulher com um papel de referência na defesa dos direitos dos moradores do município.

Reconhecimento internacional

Com distribuição da Pandora Filmes, "Curral" foi lançado nos cinemas de 13 estados brasileiros em novembro de 2021. O filme foi premiado no 46º Festival de Huelva, na Espanha, com Melhor Ator para Thomás Aquino e Melhor Contribuição Técnico-Artística. Nos Estados Unidos, recebeu o prêmio de Melhor Longa-metragem de Ficção no Festival de Cinema do Brooklyn, em Nova Iorque.

Para Bárbara, "ver um produto brasileiro, feito com recursos limitados, em um momento tão delicado, ser reconhecido internacionalmente mostra nosso potencial e nossa capacidade criativa e de produção". Ela explica que as premiações acabam sendo, também, uma oportunidade para agregar investidores e alavancar outras produções.

O elenco é composto também por Rodrigo García, José Dumont, Thardelly Lima, Clébia Sousa e Fernando Teixeira. A previsão é de que até o final do primeiro semestre de 2022 o filme seja distribuído por plataformas de streaming no Brasil e no exterior.