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Declaração dos Direitos Humanos faz 73 anos. Você sabe o que ela significa?

BrianAJackson/iStock
Imagem: BrianAJackson/iStock

Paula Rodrigues

de Ecoa, em São Paulo

10/12/2021 06h00

Foi em um 10 de dezembro como hoje que a Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), em Paris, apresentou o resultado de um trabalho longo em busca de normas e valores civilizatórios a serem seguidos por países democráticos comprometidos em promover a liberdade, igualdade, dignidade, paz e justiça para todos os seus cidadãos.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, a preocupação de que cenas como as vistas nessa e na guerra anterior (1914-1918) pudessem se repetir mobilizou 50 autoridades de nações diferentes a tentar selar a paz e encontrar caminhos para evitar novos conflitos, destruições e genocídios de populações.

Três anos depois, em 1948, um documento foi elaborado por uma comissão especial formada por diversos agentes para transferir essa mobilização para o papel. Nascia assim a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), que marcou a primeira vez que se reuniu valores e princípios fundamentais para alcançar a garantia dos direitos humanos em todos os países.

"Direitos humanos são a garantia que nos protege da barbárie completa. É um marco civilizatório da nossa sociedade brasileira e global. A ideia de que a gente tem um conjunto de direitos inerentes a todas e todos serve como mecanismo de proteção dessas pessoas em relação à violência, abusos e violações que elas possam estar experimentando. Eles são importantes para que a gente continue existindo enquanto sociedade", explica Sheila de Carvalho, Advogada internacional de Direitos Humanos e membro da UNEafro e da Coalizão Negra por Direitos.

Mas o que são e quais são os direitos humanos?

Segundo a própria ONU, direitos humanos são "garantias jurídicas universais que protegem indivíduos e grupos contra ações ou omissões dos governos que atentem contra a dignidade humana." Em outras palavras, Ivo Cípio Aureliano, advogado indígena e assessor jurídico do CIR (Conselho Indígena de Roraima) diz que são "direitos fundamentais e básicos para se ter uma vida."

Ao todo, são 30 os pontos estabelecidos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. Cada um representa algo fundamental para que todo e qualquer ser humano tenha uma vida digna, priorizando o bem-estar social, a fraternidade, o respeito mútuo e a segurança de que todos, independentemente de raça, classe social, gênero ou orientação sexual devem possuir os mesmos direitos e deveres.

O primeiro deles, por exemplo, diz respeito à consciência de que "todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos". O documento segue discorrendo sobre a importância de assegurar a liberdade religiosa, de pensamento, opinião e expressão, além de direitos como alimentação, moradia, educação e trabalho para todas e todos. A própria ONU disponibiliza a declaração completa em seu site.

Direitos humanos para quem?

Não à toa, esses elementos também estão presentes nas Constituições Federais de democracias pelo mundo. Na do Brasil, promulgada em 1988, há influência clara da Declaração dos Direitos Humanos e todos os direitos citados acima passam, pelo menos na teoria, a ser garantidos pela Lei brasileira.

Mas mesmo antes disso, as Constituições que vigoraram no país já falavam de direitos básicos assegurados à população. Ou melhor, apenas a uma parte dela. Na prática, como ocorre até hoje, algumas contradições diferenciavam a teoria da prática. Em 1824, quando foi outorgada a primeira Carta Magna, o imperador Dom Pedro I pregava a importância de alguns desses direitos, enquanto a escravização de negros e indígenas ainda se fazia presente, garantindo o sustento das elites brancas e uma vida de trabalho, tortura e morte aos escravizados.

Até hoje, as violações ainda são muitas no Brasil - apesar de o país fazer parte do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, se comprometendo a garantir a todos esses direitos. "Quando a gente não garante o direito que povos indígenas têm à demarcação de terras, por exemplo, isso também é uma violação grave. A democracia aqui só será plena quando todos, indígenas ou não, tiverem acesso a esses direitos", afirma Ivo Cípio Aureliano, que, em setembro, durante a 48ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, denunciou o governo brasileiro por causa da proposta apresentada no Marco Temporal.

"A sociedade brasileira, em sua história, tem o processo de colonização e o de escravidão, que foram violações sistêmicas de direitos de pessoas e que nunca foram devidamente reparados. Esses fatores contribuem para que até hoje não consigamos assegurar os direitos humanos para todos. Basta ver como as populações negras e indígenas são tratadas no Brasil. Desde o período de escravidão há uma resistência em reconhecer a cidadania e humanidade dessas populações enquanto parte da sociedade. E se a gente fala em direitos humanos, como isso será aplicado para essas pessoas se a sociedade nem as reconhece como humanos?"
Sheila de Carvalho, advogada

E o que significa ser um defensor dos direitos humanos?

Apesar de ser algo que, pelo menos na teoria, deve beneficiar a todos, os direitos humanos ainda são vistos com maus olhos por boa parte da população brasileira. Em 2018, um estudo divulgado pelo Instituto Ipsos mostrou que seis em cada dez brasileiros acreditam que os direitos humanos apenas amparam pessoas que "não merecem", como criminosos e terroristas.

Há mais de 35 ajudando principalmente pessoas em situação de rua, o padre Júlio Lancellotti convive diariamente com esses tipos de acusações. "Quando você é um defensor dos direitos humanos, sempre te olham de um jeito errado. No Brasil, esses direitos erroneamente passaram a ser vistos como direitos do bandido, como se estivéssemos passando a mão na cabeça do criminoso. E isso acontece porque nós perdemos os limites e os parâmetros desde a colonização", diz.

Seguidor da teoria de que Jesus foi um dos principais defensores dos direitos humanos, para ele falta conhecimento sobre o que diz a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o que de fato são esses direitos.

"Para mim, ser defensor dos direitos humanos significa ser alguém que entende a importância desses direitos como salvaguarda da vida. As pessoas só terão vida digna quando tiverem esses direitos garantidos. Ser defensor dos direitos humanos é defender e lutar para que todos tenham um nome, tenham suas identidades respeitadas, é defender que todos possam exercer sua religiosidade ou não ter religião alguma também. É acreditar que todo mundo tem que ter moradia, educação, saúde e não ser submetido a torturas físicas e psicológicas", explica.