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Projeto de declaração final da COP26 força países a aumentar ambição

Manifestantes do Extinction Rebellion exibem faixa com a mensagem "Estamos de olho em vocês", em protesto durante a COP26 - ANDY BUCHANAN / AFP
Manifestantes do Extinction Rebellion exibem faixa com a mensagem "Estamos de olho em vocês", em protesto durante a COP26 Imagem: ANDY BUCHANAN / AFP

Lúcia Müzell

Enviada especial da RFI a Glasgow

10/11/2021 09h38

O texto inclui um trecho no qual os países se comprometem a revelar novos compromissos para limitar o aquecimento do planeta já em 2022, três anos antes do que estava inicialmente previsto. A pressão aumenta também sobre os países em desenvolvimento, que poderiam ser forçados a revisar os seus compromissos no mesmo ritmo que os desenvolvidos.

A pressa ocorre porque os objetivos prometidos até agora são insuficientes para limitar uma alta de temperatura inferior a 2°C até o fim deste século, considerado o limite para que as consequências climáticas sejam menos catastróficas para o planeta. A meta ainda mais ambiciosa, de limitar o aquecimento a 1,5°C, já é considerada quase impossível de ser cumprida, no ritmo atual de emissões mundiais de CO2.

Um relatório divulgado ontem (9) pela Climate Action Tracker afirmou que as promessas de redução de emissões até 2030 acertadas até agora levariam a uma elevação de 2,4°C dos termômetros, em relação ao período pré-industrial. Os cientistas advertem que essa nova realidade significaria uma maior frequência e intensidade de fenômenos climáticos extremos, como enchentes, incêndios e furacões, além da alta do nível do mar.

"A gente ainda está muito longe do que a gente deveria estar, então achei o texto bastante positivo porque cria mais uma oportunidade para os países aumentarem a sua ambição", analisa Stela Herschmann, especialista em negociações climáticas do Observatório do Clima.

Para os países conseguirem atingir metas mais ambiciosas, o rascunho - revelado pelo presidente da COP26, o britânico Alok Sharma - propõe a aceleração da transição energética, com o abandono progressivo do uso de energias fósseis, em especial o carvão, altamente poluente. Mesmo com a pandemia de coronavírus, os índices globais em 2021 gerados pela energia devem voltar ao patamar anterior ao aparecimento da Covid-19, com um aumento de 4,9%, puxado principalmente pela retomada das atividades na China, que ainda utiliza intensamente o carvão na sua matriz energética.

Financiamento insuficiente

Para dezenas de países em desenvolvimento, entretanto, a transição energética só será possível com financiamento externo. A ONU reconhece que os países industrializados, maiores responsáveis históricos pelo aquecimento global, têm a obrigação de bancar a conta da crise climática. Mas a promessa firmada no Acordo de Paris, de US$ 100 bilhões ao ano a partir de 2020, sequer foi cumprida - e já é vista como insuficiente.

"Além do financiamento, que está bastante travado, o texto também tem questões importantes como o reconhecimento dos povos indígenas e da juventude neste debate", ressaltou Hershmann, à RFI. "Dificilmente o texto ficará assim até o fim da conferência, conforme andarem as negociações. Ele pode sofrer muitas transformações até sexta."

Posição do Brasil

O primeiro rascunho da declaração final é revelado no décimo dia da COP26, agora que a conferência encontra-se na chamada fase de alto nível, com as delegações encabeçadas pelos ministros dos países. O brasileiro Joaquim Leite, à frente da pasta do Meio Ambiente, advertiu nesta terça que "nem sempre a gente cede alguma coisa" na negociação e que o Brasil já atualizou a sua NDC (sigla em inglês para Contribuição Nacionalmente Determinada) no início da conferência. A nova meta de redução de emissões passou de 43% para 50% até 2030, em relação aos índices de 2005 - que foram, também atualizados para cima, o que na prática limita o efeito do anúncio.

"É importante que o mundo venha na mesma direção que o Brasil já tem, de políticas de redução de emissões de desmatamento e redução de emissões, tanto na atividade industrial quanto na atividade agropecuária", disse Leite. "O Brasil contribuiu sendo mais ambicioso nos primeiros dias e colocando pressão agora aos países mais emissores que o Brasil. Falta mais ambição financeira dos países industrializados", frisou.