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O que é a Seguridade Social? E por que esses direitos são importantes?

Fantasia CLT reforma trabalhista Paraíso do Tuiuti - Reprodução
Fantasia CLT reforma trabalhista Paraíso do Tuiuti Imagem: Reprodução

Antoniele Luciano

Colaboração para Ecoa, de Curitiba (PR)

10/08/2021 06h00

A crise gerada pela pandemia do novo coronavírus escancarou no último ano as desigualdades sociais no país e a necessidade de amparo, por parte do Estado, de milhões de brasileiros. De um lado, o Brasil contabiliza mais de 550 mil mortes por covid-19 - muitas de responsáveis pelo sustento de seus núcleos familiares. De outro, há dificuldade em conseguir trabalho - já são mais de 14,8 milhões de pessoas desempregadas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É nesse cenário que a Seguridade Social, um conjunto de ações do poder público para proteger o cidadão, mostra-se ainda mais necessária.

Prevista na Constituição Federal de 1988, a Seguridade Social compreende três facetas: a Saúde, a Assistência Social e a Previdência. Na Saúde, o atendimento ocorre por meio do Sistema Único de Saúde (SUS); na Assistência Social, por meio de suporte financeiro a brasileiros em situação de vulnerabilidade. Em ambos os casos, esses direitos não exigem contribuição do beneficiário. Foi por meio da assistência social, por exemplo, que houve o pagamento de auxílio emergencial a 68 milhões de brasileiros em 2020, totalizando R$ 295 bilhões em repasses, conforme o Ministério da Cidadania.

Com 36 milhões de segurados, a Previdência atua através de um pacto intergeracional para proteção da renda em caso de aposentadoria, doença, acidente de trabalho, maternidade, reclusão ou mesmo pensão por morte aos beneficiários de quem contribuiu com o sistema. Por se tratar de um sistema integrado, os contribuintes da Previdência também subsidiam a assistência social no país.

A Seguridade Social seria, portanto, uma forma de justiça social? Qual a importância de direitos advindos da Previdência Social? Ecoa conversou com especialistas para entender e explicar o assunto.

Por que a informalidade é um gargalo para os direitos dos trabalhadores brasileiros?

Embora possam ser uma forma de sobrevivência para milhões de brasileiros, os empregos informais deixam o trabalhador desamparado diante de imprevistos, alerta o advogado Fábio Luiz de Queiroz Telles, professor de direito do trabalho na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). "Por não contribuir com a Previdência, ele fica desamparado de todo o sistema previdenciário, o que inclui direitos relativos a um auxílio-doença, à licença maternidade ou paternidade. Essa pessoa estaria alheia ao sistema e não teria nenhuma garantia de recebimento de benefícios, salvo os da Seguridade Social, como o LOAS [Lei Orgânica de Assistência Social]", diz o professor.

Sem exigência de contribuição previdenciária, o Benefício Social de Prestação Continuada (BPC/LOAS) é concedido apenas a pessoas idosas ou portadoras de deficiência sem meios de prover o próprio sustento. No ano passado, segundo o Ministério da Economia, foram concedidos 265,9 mil benefícios assistenciais desse tipo. O valor é de um salário mínimo.

A contribuição previdenciária, observa Telles, garante, por exemplo, que uma mulher com emprego formal, ao engravidar, tenha a estabilidade gestante. Ela não pode ser demitida desde a confirmação da gravidez até o bebê completar cinco meses após o nascimento. A licença maternidade remunerada também é prevista pela legislação, podendo ser de 120 dias ou 180 dias, nos casos de empregadores que integram o programa Empresa Cidadã, do governo federal. Já para a licença paternidade, são cinco dias de afastamento. Esse prazo pode ser estendido ainda para 20 dias, nos casos de adesão ao Empresa Cidadã. Uma família na informalidade não conseguiria acessar esses direitos.

O advogado e professor de Direito do Trabalho da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Sandro Lunard Nicoladeli também salienta que, mesmo tendo amparo pelo SUS, em caso de acidente, não há cobertura de renda para o trabalhador sem recolhimentos mensais. "Essa perda de qualidade do segurado é a grande questão dos trabalhadores de aplicativo de entrega", comenta ele, ao completar que a contaminação por covid é outra situação comum que pode levar à necessidade de suporte financeiro. "Alguém que tenha sido contaminado e ficado com sequela, caberá à Previdência protegê-lo. Ele se torna um benificiário da Previdência, sistema que depende da renda dos trabalhadores", destaca.

Seguridade Social seria uma forma de se fazer justiça social?

Na visão de Nicoladeli, a Seguridade Social pode ser compreendida como uma maneira de buscar a redução de desigualdades sociais prevista na Constituição Federal. Ele analisa, no entanto, que as sucessivas reformas previdenciárias têm estabelecido formas de achatamento, obstáculos e reduzido valores dos benefícios acessados.

Para ilustrar esse cenário, o advogado cita o caso de uma mulher que, ao ficar viúva de um aposentado com renda de R$ 3 mil, passaria a receber R$ 1,5 mil de pensão. "Dependendo da idade, ela ainda teria o valor por um prazo determinado. São várias complicações que mantêm e até aprofundam a desigualdade econômica e social", pontua.

Sob o argumento de uma Previdência quebrada, muito se fala sobre privatização. Essa seria uma solução?

Com a expectativa de vida do brasileiro aumentando, a repactuação do financiamento da Previdência Social se tornou uma demanda cujo processo não pode deixar de garantir a dignidade das pessoas, sustenta Nicoladeli. "Significa, por exemplo, cobrar os grandes devedores da Previdência, que devem bilhões ao sistema, e isso alimenta o déficit, alargar as formas de financiamento", diz.

Para o especialista, é possível incluir a previdência complementar no debate, embora a maioria dos brasileiros, em função de baixa renda atual, tenha dificuldades em economizar para uma aposentadoria futura. Já a privatização do sistema, como ocorreu com o Chile, país que está revendo o modelo, passa longe do caminho para equacionar as contas do fundo previdenciário.

É fundamental, defende o advogado, que o governo garanta uma renda mínima de proteção ao cidadão, o que seria uma forma de garantir redistribuição de renda. "É só ver nas regiões mais pobres do Nordeste, o papel que cumpre a renda dos aposentados. Qualquer sistema que pense em potencialização de previdência complementar, se você quiser ter um país digno, decente, com respeito à dignidade da pessoa humana, precisa ter previdência pública. Que ela seja cobrada, financiada por empresários, trabalhadores e, eventualmente, outras fontes de receita que possam porventura existir", argumenta Nicoladeli.

Para Telles, a intervenção do Estado no campo que diz respeito ao da seguridade é inevitável, primeiro, estabelecendo regras, e depois, oferecendo custeio. Para ele, o enxugamento de outros setores governamentais também deveria ser feito como forma de auxiliar essa arrecadação.

Como lutar por direitos da Previdência?

Além de acompanhar discussões envolvendo o assunto, o primeiro passo, recomenda o Nicoladeli, é conhecer mais sobre o sistema e a cultura previdenciária. Isso pode ser feito por meio de movimentos sociais, sindicatos, entidades e profissionais especializados na área.

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