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Governo "perde ouros" olímpicos e projetos sociais agem por novos talentos

05.08.2021- Jogos Olímpicos Tóquio 2020 -  Hebert Sousa do Brasil  disputa semifinal do boxe na Arena Kokugikan Foto: Miriam Jeske/COB - Miriam Jeske/COB
05.08.2021- Jogos Olímpicos Tóquio 2020 - Hebert Sousa do Brasil disputa semifinal do boxe na Arena Kokugikan Foto: Miriam Jeske/COB Imagem: Miriam Jeske/COB

Marcos Candido

De Ecoa, em São Paulo (SP)

06/08/2021 15h11

"Projeto social" é um termo que você deve ter ouvido nas Olimpíadas de Tóquio. E não é à toa. Nesses Jogos, há atletas olímpicos e medalhistas brasileiros pelo esforço de associações comunitárias, ONGs e coletivos em regiões com pouco acesso a esportes.

Com participação cada vez menor do governo federal, as ações são entradas para talentos e promoção de cidadania. É possível ajudá-las com doações, e a ajuda é necessária.

É o caso do skatista Ademar Luquinhas. Ele criou o Instituto Ademafia na comunidade de Santo Amaro, Rio de Janeiro, onde dá aulas de skate para crianças e adolescentes.

Nas Olimpíadas de 2020, o skate foi incluído pela primeira vez e está garantido nos Jogos de 2024, em Paris. Não será surpresa se um dos mais de 60 alunos do Ademafia estiverem lá.

Segundo Luquinhas, os alunos mostram talento inesperado na primeira volta em um skate, mas, possivelmente, teriam dificuldades para praticar o esporte sem o instituto. A meta da Ademafia é construir uma pista. Além do esporte, a Ademafia distribui cestas básicas e faz ações comunitárias em Santo Amaro, como uma vaquinha para reconstruir a casa do morador Paulinho, atingida por um incêndio.

Luquinhas considera que o instituto tem uma estrutura razoável de ensino graças às doações. Segundo ele, a realidade é diferente de projetos em outras comunidades, que penam para continuar. "O skate apresenta e resgata valores de consciência coletiva que fazem diferença para as nossas comunidades".

A gente perde 'muitos ouros' e há muitos diamantes a serem lapidados Luquinhas, Ademafia

Os talentos dos projetos sociais

1 - Divulgação - Divulgação
Franquia Team Nogueira - Minotauro e Minotouro
Imagem: Divulgação

Em comum, os projetos sociais encontram novos talentos, especialmente em áreas com poucas condições para os esportes. Existem instituições que descobrem e encaminham candidatos para clubes. Em outros casos, treinam e dão assistência técnica e profissional. Há ONGs com financiamento próprio e instituições patrocinadas pelo Estado.

Segundo Ricardo Ricci Uvinha, professor titular e orientador na pós-graduação em ciências da atividade física da USP, os projetos sociais têm habilidade para "ficar de olho" na comunidade onde o atleta vive para cobrar mais recursos do poder público e também promover valores do esporte, como a disciplina, a persistência e também o lazer e a diversão. "Também são muito importantes para articular patrocínios", acrescenta.

Alison Piu, vencedor da medalha de bronze nos 400 metros com barreira, era um garoto tímido com queimaduras sofridas quando bebê. Na adolescência, ele floresceu após ser descoberto pelo projeto social Instituto Edson Luciano Ribeiro, em São Joaquim da Barra, no interior de São Paulo, hoje patrocinado por instituições públicas e privadas.

Longe dali, a Academia Champion, em Salvador, descobriu alguns dos maiores boxeadores brasileiros, como Acelino Freitas "Popó", e do MMA, como os irmãos Rodrigo Minotauro e Rogério Minotouro. Descobertos pelo projeto, Adriana Araújo foi bronze nos Jogos de Londres e Robson Conceição ganhou o ouro na Rio 2016. Agora, deu medalha olímpica no boxe para Herbert William.

"Acredito muito na nossa metodologia, que hoje praticamente toda a Bahia segue. É um trabalho feito passo a passo", diz o coordenador Luiz Dórea em entrevista para a revista piauí.

2 - Fernando Naiberg/UOL - Fernando Naiberg/UOL
8.mai.2017 - Mohamed Camara treina na Academia Champions, em Salvador, para ser lutador de boxe e MMA
Imagem: Fernando Naiberg/UOL

Como ser um atleta no Brasil

Para o professor da USP, a descoberta de grandes atletas por projetos sociais também têm a ver com o que chama de "desmonte" do governo federal contra o esporte. Ele cita o fim do Ministério do Esporte, criado na década de 90 e extinto em 2019 por Jair Bolsonaro (sem partido).

Hoje, o ex-ministério é uma pasta dentro do Ministério da Cidadania. A extinção demonstra um empenho político menor em promover o esporte de alto nível olímpico, paralímpico e também cultural, afirma.

Além de projetos sociais, o número de medalhas recordes no Brasil em Tóquio 2020 está relacionado a três origens. A Lei das Loterias destina 2% das loterias para o Comitê Olímpico Brasileiro e Comitê Paralímpico Brasileiro desde 2001. Em 2020, o COB recebeu R$ 122 milhões, repassados para as confederações. Há também a Lei de Incentivo ao Esporte, no qual governos recebem dinheiro para investir na construção de ginásios, equipamentos e técnicos.

Outra saída é o Bolsa Atleta, que desde 2005 repassa dinheiro direto para atletas. O valor mínimo é de R$ 370 para base e estudantil, alcançando R$ 3.100 para olímpicos e paralímpicos, e no máximo de R$ 15 mil mensais na restrita categoria "pódio". 80% dos atletas olímpicos brasileiros em Tóquio recebem valores do Bolsa Atleta. Em 2020, os pagamentos foram atrasados.

Só o "salário" também não forma um atleta. "O que a gente percebe é que o investimento é insuficiente. Houve cenas de atletas que treinaram em açudes, sem local de treinamento, e tiveram patrocínios cortados na pandemia", conclui o professor da USP.

Instituto Ademafia de Cultura e Esporte (Rio de Janeiro)
PIX: CNPJ -- 40.190.215/0001-37 (qualquer valor)

Academia Champions (Bahia)
Cursos e informações: (71) 99288-2483

Instituto Edson Luciano Ribeiro "Correndo para vencer" (São Paulo)
Para mais informações, https://correndoparavencer.com.br/

ONG Social Skate (São Paulo)
Para mais informações: (11) 97215-3818)