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Stephanie Ribeiro traz discussão sobre "quarto de empregada" na arquitetura

A arquiteta e ativista Stephanie Ribeiro - Iwi Onodera/UOL
A arquiteta e ativista Stephanie Ribeiro Imagem: Iwi Onodera/UOL

Isabella Garcia

Colaboração para Ecoa, de São Paulo

01/12/2020 13h06

A representatividade negra na arquitetura e no design e a intersecção entre raça e veganismo foram destaque na programação de ontem (30), último dia da Feira Preta. Apesar de se tratar de assuntos distintos, as pautas coincidem por estarem socialmente associadas a pessoas brancas.

O painel "Pretos na Arquitetura" contou com mediação do arquiteto Antonio Isuperio e participação da arquiteta e apresentadora Stephanie Ribeiro, o designer de interiores Jorge Felipe e a arquiteta Francine Moura.

O mediador da conversa levantou o dado de que a arquitetura é ocupada em 78% por profissionais brancos.
Essa falta de inserção negra influencia diretamente na construção da cidade, como reflete a arquiteta Francine. "Hoje a arquitetura e o urbanismo da cidade estão a serviço do capital da burguesia e não contempla a população negra e a classe trabalhadora. Eu penso que esses espaços elitizados são consequências de um ciclo vicioso. A gente não consegue se ver nesses lugares, pois não temos um sentimento de pertencimento e isso acontece porque não nos vemos nas universidades e nos cursos técnicos. Mesmo quando a gente consegue um diploma, as chances são reduzidas, pois o racismo das estruturas complica tudo" reflete Francine Moura.

Nas universidades públicas o curso de arquitetura é um dos mais concorridos do Brasil e nas instituições particulares é uma graduação muito cara. Além disso, o material didático tem um custo alto e a permanência acadêmica é difícil, pois as aulas são em um período integral, o que impede o estudante de ter um trabalho.

Essas questões distanciam os jovens negros dessa graduação, pois além de toda questão financeira, ele se encontra perdido naquele ambiente. O designer Jorge Felipe conta que na universidade é muito comum ouvir os colegas dizendo que o pai, o avô, a mãe ou alguém próximo do seu convívio é designer. "Isso faz com que essas pessoas cresçam com uma base. Quando eu descobri o que é design de interiores, eu tinha mais de 15 anos", relata. "A partir do momento que as oportunidades se dão de maneira distintas para negros e não negros, o privilégio se firma, e você precisa conseguir se consolidar na área mesmo carregando esse desequilíbrio". Por isso, ele acredita que o caminho a se seguir é fazer com que o design seja acessível para mais pessoas.

Por estar associada à arte, a arquitetura é vista por muitos como uma profissão transgressora, mas para Stephanie Ribeiro essa é apenas uma impressão falsa. "A verdade é que a maioria dos escritórios são ligados à figura de homens e brancos, e isso reflete nas construções. A gente vive um país em que é supercomum ter o quartinho da empregada e quem desenha esses projetos? Os arquitetos" aponta.

É necessário fazer uma discussão interna para quebrar uma série de coisas que já deveriam ter sido questionadas e abolidas. Quando fazemos discussões entre arquitetos sobre a questão do quartinho da empregada, eles respondem que nunca tinham parado para pensar. Isso é só um exemplo de como as coisas vão se naturalizando e não tem uma quebra para essa lógica.

Stephanie Ribeiro, arquiteta e apresentadora

Com mediação da curadora Patrícia Durães, o painel "Veganismo, vegetarianismo e raça", contou com a participação de Suellen Maristela que é chefe de cozinha, Maíra da Costa, proprietária da Free Soul Food que trabalha com comidas naturais, e as influencers Luciene Santos, mais conhecida nas redes como Sapa Vegana, e Ellen Monielle, a

Eco Fada, que produzem conteúdo para promover alimentação vegana popular.
Segundo Maíra Costa, existe um estereótipo que associa a alimentação de pessoas negras a uma comida gordurosa e com muito sal. "Mas se a gente pensar na nossa ancestralidade, estamos ligados a frutas, verduras e uma alimentação mais saudável".

Com apenas 21 anos, a Eco Fada, Ellen, luta por uma alimentação popular com base em alimentos vegetais e antirracista. "Falar sobre isso do ponto de vista negro é muito importante! As pessoas pretas estão morrendo pelo que elas põem na boca, então é preciso fazer uma revolução pelos animais e propor a transformação com uma alimentação baseada em plantas para derrubar as chances de doenças se fazerem presentes no nosso corpo".

Para conseguir trilhar esse caminho Luciene, a Sapa vegana, diz que o primeiro passo é se inspirar em pessoas com uma realidade alimentar parecida com a sua, justamente para não criar ilusões. "Muitos pretos querem seguir pessoas brancas e ricas e isso não é legal. Viva o veganismo dentro da sua realidade."

Essa vivência está associada a ir às feiras do bairro, experimentar alimentos e deixar o prato bem colorido. Outro ponto que ela destaca é que é necessário temperar os vegetais. "Você tempera a carne e acha ela saborosa, por que na hora de temperar o chuchu você só vai colocar sal?".