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Manifestos buscam transformar apoio em compromisso antirracista real

Carina Martins

Colaboração para Ecoa, em São Paulo

15/06/2020 17h00Atualizada em 15/06/2020 20h19

Pelo menos dois manifestos - bastante diferentes entre si, especialmente na origem - foram lançados nos últimos dias com o propósito de transformar discurso em ação. Duas semanas depois da Blackout Tuesday, a bandeira antirracista está desfraldada. Mas como só chamar de linda não vai hastear nada, movimentos e aliados buscam o compromisso de diversos setores com ações, de fato antirracistas.

A Coalizão Negra por Direitos, que representa mais de cem entidades do movimento negro de todo o Brasil, lançou neste domingo (14) o documento "Com Racismo Não Há Democracia", em que pede que "pratiquem o que discursam". Com mais de 3 mil assinaturas em 24 horas, o manifesto reúne nomes célebres de áreas diversas, como Martinho da Vila, o publicitário Celso Loducca, Zélia Duncan, Caetano Veloso, o empresário Oded Grajew e estrangeiros como Danny Glover e Valter Hugo Mãe. Mais do que um abaixo-assinado, a iniciativa traz um programa de propostas para que o racismo seja assunto central "como forma de construir a democracia".

"Viemos a público exigir a erradicação do racismo como prática genocida contra a população negra", diz o manifesto logo em sua primeira parte. A mesma Coalizão já conduz uma contundente campanha nesse sentido: a Alvos do Genocídio, criada para que os cidadãos se manifestem e cobrem dos veículos de comunicação o uso do termo "genocídio" para descrever o assassinato sistemático de brasileiros negros.

Sabendo que o primeiro passo para resolver um problema é que ele seja reconhecido como tal, o grupo apresenta dados contundentes que embasam sua reivindicação. Se 71% das pessoas assassinadas no Brasil são negras, assim como 75% dos mortos pela polícia e 91% das crianças vítimas de bala perdida, e se até policiais negros morrem mais do que não-negros, mesmo sendo apenas um terço da corporação, fica difícil não reconhecer a racialização nas mortes violentas no Brasil.

Logo de campanha da Coalizão Negra por Direitos - Divulgação - Divulgação
Logo de campanha da Coalizão Negra por Direitos
Imagem: Divulgação
"Eu apoio a campanha da Coalizão Negra por Direitos para que os veículos de mídia passem a tratar os assassinatos deliberados, diários, sistemáticos e em massa da população negra com o nome que eles têm: GENOCÍDIO", diz o manifesto que recolhe assinaturas para pressionar os veículos de comunicação a aderirem. "Genocídio é uma palavra forte. Utilizá-la é um passo importante para que a sociedade e os órgãos públicos reconheçam a realidade das pessoas negras no Brasil. E defendam que a negritude, em sua humanidade, tem direito à vida."

Empresas antirracistas

Partindo do princípio que "não precisamos de mais pessoas negras morrendo para ter um engajamento contínuo na pauta racial", um outro manifesto cobra "comprometimento público de pessoas e empresas que entendem que vidas negras importam". O Seja Antirracista parte de uma perspectiva de corporações para criar práticas de combate ao racismo em ambientes tradicionalmente dominados pela branquitude - como as empresas.

Selo de campanha do Instituto Identidades do Brasil - Divulgação - Divulgação
Selo de campanha do Instituto Identidades do Brasil
Imagem: Divulgação
O compromisso corporativo compreende itens como, por exemplo, publicar o número de pessoas negras em cargos executivos no Brasil no site da companhia, e traçar uma meta de quantos profissionais autodeclarados negros e negra se compromete a contratar anualmente. A campanha disponibiliza também um teste para avaliar o nível de engajamento de cada empresa. Também é possível assinar como pessoa física, com compromissos específicos.

Ainda no universo corporativo, a consultoria de inovação social Think Eva reuniu uma lista mastigada de projetos e ferramentas auto-organizados, facilitando recursos para que o mundo corporativo amplie as possibilidades para pessoas negras no mercado de trabalho.

Você pode conhecer a lista aqui.

Errata: este conteúdo foi atualizado
A primeira versão do texto errou o nome da campanha da Coalizão Negra por Direitos. O texto foi corrigido na segunda (15) às 20h10.