fizeram história

A luta pioneira de Laudelina de Campos Mello pelos direitos das domésticas no Brasil

Por Juliana Domingos de Lima 

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Benedita da Silva (à esq.) abraça Creuza Maria Oliveira, presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas após a aprovação da PEC no Senado 

Em 2 de junho de 2015, a PEC das domésticas entrou plenamente em vigor após ter sua regulamentação sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff. A lei garantiu direitos como jornada de 44 horas semanais, pagamento de horas extras e recolhimento do FGTS. Foi uma conquista histórica de uma das categorias mais precarizadas do país

Crédito: Sergio Lima/Folhapress

A luta das empregadas domésticas brasileiras por melhores condições de trabalho começou muitas décadas antes da aprovação da PEC. A mineira Laudelina de Campos Mello, ou Dona Nina, esteve à frente desse movimento desde os anos 1930

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Neta de escravizados, Laudelina nasceu em 1904 em Poços de Caldas (MG). Filha mais velha, ainda criança cuidava da casa, de irmãos e primos enquanto a mãe trabalhava como doceira e na lavanderia de um hotel. Começou a exercer o trabalho doméstico remunerado por volta dos 16 anos de idade. Desde cedo manifestava uma personalidade combativa, avessa a injustiças 

Poços de Caldas em 1910

Crédito: Arthur Silva/Prefeitura de Poços de Caldas

 Nos anos 1920, se mudou para Santos (SP), onde se casou e iniciou propriamente sua atividade política. Envolvida em organizações culturais e recreativas da população negra desde a adolescência, ela se filiou ao Partido Comunista Brasileiro e militou pela Frente Negra Brasileira na década de 1930. Em 1936, fundou em Santos a Associação das Empregadas Domésticas, organização pioneira em defesa da categoria

Crédito: Acervo/Fenatrad

A situação da empregada doméstica era muito ruim. A maioria daquelas antigas trabalharam 23 anos e morriam na rua pedindo esmola. Era um resíduo da escravidão, porque era tudo descendente de escravo

Em entrevista para a dissertação de mestrado de Elisabete Pinto
Laudelina de Campos Mello

A associação prestava assistência às trabalhadoras domésticas e suas famílias. Além disso, Laudelina lutava para que a organização fosse reconhecida como sindicato e reivindicava que a categoria fosse incluída na CLT de Getúlio Vargas, o que não aconteceu naquela época. A associação foi fechada durante o Estado Novo e voltou a funcionar em 1946

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Com o início da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), Laudelina se alistou como voluntária. A motivação, segundo ela, foi ter lido o o livro escrito por Hitler no qual o líder nazista explicita o plano de exterminar todos os não arianos, principalmente negros. “Aquilo me trouxe uma revolta, então resolvi me alistar”, disse a Elisabete Pinto

Crédito: Associação Nacional dos Veteranos da FEB/Divulgação

Ao fim da guerra, ela passou a trabalhar como governanta em uma fazenda na região de Campinas (SP). Seguiu atuante no movimento negro da cidade, participando de atividades culturais e sociais voltadas para a juventude negra. Em 1961, já “aposentada” do trabalho doméstico, abriu uma pensão e passou a vender salgados nos campos de futebol 

Laudelina (no centro), o cantor Jair Rodrigues e a vencedora de um dos concursos realizados nos bailes para a comunidade negra organizados por Dona Nina 

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Laudelina e domésticas em Campinas

A militância continuou. Na década de 1960, já durante a ditadura militar, atuou nas Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica e seguiu na defesa das domésticas, tendo inaugurado a Associação Profissional Beneficente das Empregadas Domésticas em 1961, em Campinas, e colaborado para a criação de várias outras associações pelo país

Crédito: Casa Laudelina/Reprodução

Laudelina foi fundamental na elaboração do projeto de lei que formalizou, em 1972, o reconhecimento da atividade pela legislação trabalhista brasileira. Na década seguinte, integrou caravanas que rumaram a Brasília para pressionar parlamentares a garantirem mais direitos às domésticas na nova constituição

Crédito: Reprodução

A Constituição de 1988 garantiu um conjunto mínimo de direitos à categoria (salário mínimo, repouso semanal remunerado, férias anuais, licença-maternidade e aposentadoria) e permitiu sua sindicalização, pauta defendida por Laudelina durante mais de 50 anos. Ela morreu em 1991, em Campinas, aos 86 anos 

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Edição: Fred Di Giacomo

Reportagem: Juliana Domingos de Lima

Publicado em 05 de junho de 2021