Um mundo que funciona

Para especialista em biomimética, despertamos nossos anseios por comunidade, conexão e acesso à natureza

Dayna Baumeister Especial para Ecoa

[Meio ambiente e biomimética]

As normas culturais de praticamente todas as economias contemporâneas podem ser caracterizadas por várias formas de consumo materialista e entretenimento (supostamente) vazio. Mas vimos o impossível virar possível com uma grande pausa do planeta. A desaceleração por semanas a fio é uma oportunidade única para refletirmos sobre o que mais valorizamos e nos dá a chance de construir um mundo que funciona.

Ecoa traz na série O Mundo Pós-Covid-19 um grupo de especialistas que, em depoimento a jornalista Mariana Castro, contam como imaginam uma civilização pós-pandemia a partir de temas como Tecnologia, Trabalho, Educação, Ciência, Alimentação, Cidades, Novas Economias, Espiritualidade, Meio Ambiente e Comportamento. Além de desenhar possíveis cenários para o que vem depois, eles falam sobre como as escolhas de agora podem contribuir para a construção de um futuro mais desejável.

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Seja qual for o grupo social que estudam, os antropólogos modernos podem atestar que somos mesmo uma espécie codependente. Dois, três ou 12 meses de distanciamento social e a carência da vida em comunidade não vão apagar 300 mil anos de evolução. Assim que pudermos nos conectar de novo, nos reconectaremos. Toda previsão que imagina um mundo mais desconectado e distanciado não leva em conta o que significa ser humano.

Claro, não somos definidos apenas pela nossa história evolutiva. As normas culturais exercem uma forte influência sobre os nossos comportamentos. (Contudo, isso se deve ao desejo evolutivo de continuar fazendo parte da tribo. As normas culturais se desenvolvem como uma forma de manter a comunidade. Desafiar as normas pode levar alguém a "ser expulso da ilha", e o isolamento é o mesmo que a morte para boa parte da existência humana). As normas culturais de praticamente todas as economias contemporâneas, tanto emergentes quanto estabelecidas, podem ser caracterizadas por várias formas de consumo materialista e entretenimento (supostamente) vazio. A Covid-19 provocou uma Grande Pausa.

Com efeito, as restrições impostas pelos governos levantaram o véu da sociedade moderna. Agora temos o potencial de ver quão cegos estávamos para o poder de destruição dos nossos comportamentos, que representam uma ameaça para o bem-estar da humanidade e do planeta. Os decretos para a população ficar em casa e as quarentenas restringiram a maioria das formas de consumo e entretenimento e, ao mesmo tempo, limitaram a nossa capacidade de conexão e a afirmação do nosso lugar na tribo. E a evolução nos lembra que esta última é uma perda muito maior. A desaceleração por semanas a fio é uma oportunidade única para refletirmos sobre o que mais valorizamos.

Estamos despertando os nossos anseios por comunidade, conexão e acesso à natureza. Estamos vivenciando à flor da pele a realidade de um mundo interconectado e interdependente. Os nossos sentidos estão em sintonia com céus mais azuis, ruas mais tranquilas, águas mais limpas. De repente, conseguimos enxergar o que queremos de fato, as nossas verdadeiras necessidades — família, amigos, um senso de bem-estar, acesso a serviços de saúde, tempo para refletir, segurança e comunidades engajadas. Essa é a mais pura verdade, seja quem for você, esteja onde estiver. São desejos que unem toda a humanidade.

A verdade é que essas necessidades estiveram presentes o tempo todo, por centenas de milhares de anos. Agora temos a oportunidade de escolher essas possibilidades e definir novas normas culturais que valorizem o bem-estar da humanidade e ecossistemas que nos apoiem. Podemos optar por voltar nossa atenção para comportamentos que propiciem resultados mais saudáveis.

Cultura nada mais é do que o desenvolvimento coletivo de comportamentos individuais. Como um dos indivíduos que definem as normas culturais da sua comunidade, como você vai ser diferente do outro lado? Depois da Grande Pausa, você vai se lembrar das suas reflexões sobre o que mais valoriza e agir com base nisso? Agora que você viu o impossível virar possível, como pode ajudar a elaborar um mundo que funciona?

  • Dayna Baumeister

    É sócio-fundadora da Biomimicry 3.8, empresa de biomimética, e diretora do The Biomimicry Center at Arizona State University

    Imagem: Divulgação

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+ Sobre a série

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