Como comprar créditos de carbono para compensar as emissões de GEE?

Os créditos de carbono foram criados para precificar e reduzir as emissões de gases do efeito estufa (GEE). Eles são certificados monetários que comprovam que uma tonelada de CO2 deixou de ser emitida ou foi removida da atmosfera por meio de projetos de reflorestamento, energias renováveis, agricultura de baixo carbono ou de mitigação climática.
No Brasil, há dois mercados de carbono: o voluntário e o regulado. No primeiro, empresas compram créditos para compensar emissões de forma espontânea, apoiando projetos de reflorestamento, conservação de florestas, energia renovável e agricultura de baixo carbono. O segundo é mais recente e só deve começar a operar em 2027. Nele, haverá limites obrigatórios para reduzir as emissões.
Entenda mais sobre como funciona o mercado de carbono.
Quem pode comercializar créditos de carbono: empresas ou pessoas físicas?
Tanto o governo federal quanto empresas e pessoas físicas podem comercializar créditos de carbono.
Empresas podem comprar créditos para honrar compromissos de sustentabilidade, atender às exigências de investidores e consumidores e outros stakeholders, ou se preparar para futuras regulações. Pessoas físicas podem comprar para compensar emissões decorrentes de suas atividades pessoais ou profissionais, como viagens e consumo de energia.
No Brasil, o mercado voluntário é o que se encontra, atualmente, melhor estabelecido.
"Nele, os compradores são geralmente empresas que buscam bater suas metas de descarbonização. Os vendedores são desenvolvedores dos projetos que reduzem ou removem emissões", diz Viviane Romeiro, diretora de Clima e Energia do CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável).
Como sei quantos créditos de carbono preciso comprar?
No mercado voluntário, não existe uma obrigação legal de compra, cada um pode decidir qual porcentagem das suas emissões deseja neutralizar, de acordo com seus compromissos ambientais e de imagem, sem imposição legal.
"A empresa ou pessoa interessada primeiro faz um inventário de emissões, que mede a quantidade de gases de efeito estufa associada às suas atividades, como consumo de energia ou de combustível, viagens, processos industriais", explica Fernando Cesário, especialista em projetos de carbono na TNC (The Nature Conservancy).
Com o resultado do inventário, voluntariamente, a pessoa ou organização decide o quanto quer compensar de suas emissões.
"O número de créditos de carbono a ser comprado corresponde exatamente às toneladas de CO2 equivalente que se deseja compensar, ou seja, retirar da atmosfera", explica Fernando Cesário.
Cada crédito corresponde a uma tonelada de dióxido de carbono equivalente (tCO2e) que deixou de ser emitida ou foi removida da atmosfera.
Assim, se uma empresa aérea que emite um milhão de toneladas de CO2 comprar um milhão de créditos de projetos certificados de reflorestamento, ela realiza compensação de suas emissões.
Em contrapartida, no mercado regulado, primeiramente, o governo define o teto de emissões permitidas para setores ou empresas específicas. Essas organizações, então, recebem permissões de emissão correspondente a esse limite. Com isso em mãos, a companhia passa a medir e registrar todas as suas emissões por meio de inventários oficiais auditados, que devem seguir metodologias reconhecidas.
"Caso o total de emissões fique acima do permitido, ela precisará reduzir suas emissões ou comprar créditos equivalentes ao excedente para compensar e cumprir sua meta regulatória", diz Cesário.
Onde posso calcular a minha pegada de carbono?
A pegada de carbono é a soma de todas as emissões de GEE associadas a uma atividade, produto, evento ou mesmo à vida pessoal de alguém.
Segundo Lúcia Helena Carvalho, professora do IBMEC, para empresas e organizações, o caminho mais robusto para o cálculo é usar metodologias reconhecidas internacionalmente que forneçam ferramentas e guias padronizados.
"No Brasil, o Programa Brasileiro GHG Protocol, coordenado pelo FGVces, adapta essas ferramentas à realidade nacional e oferece fatores de emissão específicos do país, o que aumenta a precisão dos cálculos", diz Lúcia Helena Carvalho.
Para pessoas físicas, existem calculadoras online de fácil uso, como a CoolClimate Calculator, da Universidade da Califórnia, Berkeley, e a Lifestyle Calculator, desenvolvida em parceria com a UNFCCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima), que permitem estimar emissões individuais relacionadas a transporte, energia, alimentação e consumo.
"A Iniciativa Verde e o SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa) também oferecem calculadoras adaptadas para pessoas físicas e ao contexto brasileiro", sugere Lúcia Helena.
Como comprar créditos de carbono de forma segura?
A recomendação dos especialistas é fazer as transações por meio de plataformas online reconhecidas ou de consultorias especializadas. Isso garante que os recursos sejam de fato direcionados para projetos ambientais com impacto comprovado, com base em metodologias transparentes e rigorosas.
Para pessoas físicas e empresas menores, a forma mais fácil é usar plataformas digitais especializadas, que permitem escolher projetos certificados e calcular a quantidade de créditos necessária para compensar as emissões. Entre elas, estão a Gold Standard Marketplace, a plataforma da ONU Climate Neutral Now e, como opções locais, a BVRio e a Carbonext.
Já empresas de maior porte costumam comprar diretamente com corretoras de créditos de carbono, bancos e traders especializados, que intermediam grandes volumes e ajudam a selecionar projetos alinhados à estratégia ambiental da companhia.
Para verificar se o crédito de carbono é legítimo e conta com certificado, o recomendado é analisar o identificador. Ele pode ser rastreado em registros públicos, assegurando a origem do crédito e evitando, por exemplo, que ele não seja comercializado duas vezes.
"Um crédito legítimo e certificado, por exemplo, deve estar registrado em padrões internacionalmente reconhecidos, como Verra e Gold Standard, ou outras iniciativas nacionais", aponta Vinícius Rodrigues, professor do Insper.
Créditos de carbono podem ser usados a qualquer momento?
Os créditos têm prazos de validade definidos pela certificadora, por isso, sua validade pode variar. "Existem projetos que certificam o crédito pelas emissões daquele ano, outros durante algumas dezenas de anos", explica Vinícius Rodrigues, do Insper.
Lúcia Helena Carvalho, professora do IBMEC, destaca que os créditos de carbono somente podem ser usados uma vez. "Assim que uma empresa ou pessoa física decide utilizá-los para compensar suas emissões, eles são oficialmente aposentados dos registros públicos e não podem ser revendidos ou reutilizados", diz.
Esse processo garante a integridade ambiental e evita a dupla contagem, quando o mesmo crédito poderia ser contabilizado por mais de um comprador.
Quais projetos são financiados através da compra de créditos de carbono?
A compra de créditos de carbono pode financiar uma variedade de projetos com impacto ambiental e social.
Entre os mais conhecidos estão os de reflorestamento e restauração florestal, que ajudam a remover CO2 da atmosfera, e os de conservação, como o REDD+, voltados para evitar o desmatamento e a degradação de florestas nativas, com destaque para a conservação da Amazônia, que está no centro das atenções mundiais e deve ganhar ainda mais relevância na COP 30.
Também são comuns os projetos de energia renovável, como solar, eólica, biomassa e pequenas hidrelétricas, além dos de eficiência energética, que reduzem o consumo e as emissões em processos industriais, no transporte e em edificações.
"Há ainda iniciativas de agricultura regenerativa, gestão de resíduos e biodigestores que trazem benefícios sociais e ambientais, como geração de renda local, conservação da biodiversidade e uso sustentável da terra", explica a professora Lúcia Helena.
Como é feito o processo de compensação de carbono após a compra?
O processo de compensação após a compra dos créditos de carbono é bem estruturado e segue padrões internacionais de integridade ambiental.
Primeiro, há a detecção e verificação: as reduções ou remoções de emissões reportadas precisam ser comprovadas por auditorias independentes e registradas em plataformas reconhecidas, garantindo que cada crédito corresponda a uma tonelada de CO2 equivalente efetivamente reduzida ou removida.
Depois ocorre a quantificação e registro: o volume de emissões compensado é registrado em sistemas públicos de rastreamento para evitar dupla contagem.
Somente após esse processo é feito o cancelamento ou aposentadoria dos créditos, etapa que garante que eles não possam ser revendidos. Essa aposentadoria é o que assegura a integridade ambiental da transação, pois representa que a tonelada de CO2 equivalente foi definitivamente neutralizada.
Além disso, quando os créditos de carbono são aposentados, as plataformas ou registros emitem um comprovante digital confirmando a compensação.
Esse documento geralmente traz informações sobre o projeto que gerou os créditos, a quantidade de emissões compensadas, a data da aposentadoria e o número de registro.
Posso deduzir a compra de créditos de carbono no imposto de renda?
No Brasil, a compra de créditos de carbono ainda não é dedutível do imposto de renda de forma direta, nem para empresas nem para pessoas físicas.
Isso porque a Lei nº 15.042/2024, que criou o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), ainda está em fase de regulamentação e só deve entrar em operação a partir de 2027.
Enquanto isso, entidades como a Câmara de Comércio Internacional e a WayCarbon têm defendido a criação de incentivos fiscais para quem investe em soluções climáticas.
Vinícius Rodrigues, professor do Insper, ressalta que, para pessoas físicas, já há um projeto de lei no Brasil que prevê a permissão de dedução do IRPF dos valores que forem gastos com créditos de carbono.
"Há também outro projeto na linha de permitir o uso de créditos de carbono para o abatimento de impostos no setor agropecuário".
Comprar créditos de carbono realmente faz diferença para o meio ambiente?
Sim, segundo os especialistas, comprar créditos de carbono pode fazer diferença para o meio ambiente. Mas com uma condição: a compra deve ser parte de uma estratégia climática bem estruturada e não uma medida isolada. As empresas precisam se comprometer com ações definitivas de redução de emissões e usar os créditos apenas para compensar o que não puder ser eliminado de imediato.
"Particularmente entendo o mercado de carbono como uma forma de 'ganhar tempo' para conquistar mudanças mais estruturais e profundas, que passam por uma reorganização dos processos produtivos e dos padrões de consumo", defende Vinicius Rodrigues, do Insper.
Além disso, no Brasil, a compra de crédito de carbono também ajuda a financiar muitos projetos que geram impacto ambiental e social, como proteção da floresta Amazônica e geração de renda para comunidades locais, que são potencialmente vulnerabilizadas.
Fonte: Viviane Romeiro, diretora de Clima e Energia do CEBDS (Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável); Lucia Helena Carvalho, professora do MBA de ESG do IBMEC; Fernando Cesário, especialista em projetos de carbono na TNC (The Nature Conservancy); e Vinicius Picanço Rodrigues, professor e coordenador do Programa Avançado em Sustentabilidade do Insper











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