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Este conteúdo é uma produção do UOL Content_Lab para Instituto Aegea e não faz parte do conteúdo jornalístico do UOL. Publicado em Setembro de 2025

ESCOLAS SEM SANEAMENTO

Milhões de alunos adoecem e veem o aprendizado comprometido no Brasil com a falta de saneamento básico

oferecido por Selo Publieditorial

Numa escola da área rural de Ponta de Pedras, na Ilha do Marajó (PA), as manhãs começam sempre com o mesmo desafio: não há banheiro adequado. As crianças dividem uma fossa improvisada, sem porta nem pia, e a água para beber é turva, retirada de um poço raso.

Com 10 anos, Matheus já perdeu várias semanas de aula por causa de diarreia. As crises começaram depois de beber água na escola. Outros colegas vivem situação parecida, com dores de barriga, vômitos e mal-estar frequentes. Regina dos Anjos, mãe do aluno, conta que não é raro metade da turma pedir para ir embora mais cedo porque não se sente bem.

Para as meninas mais velhas, a falta de privacidade pesa ainda mais. Elas geralmente deixam de frequentar as aulas durante o período menstrual. "Nossas alunas acabam perdendo o vínculo com a sala e, quando voltam, já estão desmotivadas", relata uma professora do município. "Situações assim são comuns aqui na cidade e nas comunidades vizinhas".

A situação no Marajó não é exceção. Em todo o país, 1,4 milhão de estudantes ainda frequentam escolas sem acesso à água potável e 440 mil estudam em unidades sem banheiro, de acordo com o estudo Água e Saneamento nas Escolas Brasileiras: Indicadores de Desigualdade Racial a partir do Censo Escolar, do Instituto Água e Saneamento (IAS) e do Centro de Estudos e Dados sobre Desigualdades Raciais (Cedra), com base no Censo Escolar 2023 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Saúde e aprendizado interrompidos

Segundo a médica de família Amanda Miguel, os impactos aparecem cedo e de forma intensa. "Os principais problemas são doenças infecciosas transmitidas pela água e pela falta de higiene, como diarreia, parasitoses intestinais e hepatite A. Também vemos infecções de pele e urinárias em ambientes sem estrutura sanitária adequada", explica.

Esses episódios, alerta ela, não se restringem a dias de mal-estar. "Na primeira infância, episódios repetidos de diarreia comprometem a absorção de nutrientes e afetam o crescimento físico e o desenvolvimento cerebral. Além disso, aumentam o risco de desidratação grave, que pode ser fatal em crianças pequenas".

O pediatra Ivan Savioli Ferraz, professor da USP, destaca que a consequência imediata são as faltas frequentes na escola. "Crianças em áreas sem saneamento ficam mais doentes e se ausentam mais. Quando a doença é recorrente e grave, pode comprometer tanto o crescimento físico quanto o desenvolvimento cognitivo. É um ciclo: quanto maior a exposição à doença, aumenta o risco de desnutrição, mais faltas e, no fim, prejuízo ao aprendizado."

Esse ciclo, explica Amanda, não se encerra quando a criança volta à sala de aula. "Mesmo quando presentes, muitas chegam cansadas, com déficit de atenção e baixo rendimento. Isso compromete seu aprendizado a longo prazo e reforça desigualdades", diz.

Questões raciais e de gênero

Ainda de acordo com os dados do Inep, a maior parte desses alunos é negra e está em escolas públicas localizadas em áreas periféricas, o que evidencia também a desigualdade racial e territorial do saneamento. A pesquisa nacional mostra que os alunos mais afetados são negros e moradores de periferias e áreas rurais. "Essas crianças vivem em comunidades com menos estímulos culturais e sociais, o que agrava ainda mais o atraso. Ou seja, o impacto não é só médico, é também social", avalia Ferraz.

As meninas são atingidas de forma ainda mais severa. A falta de banheiros adequados cria barreiras invisíveis que afetam diretamente a permanência escolar. "Muitas deixam de frequentar a escola durante o período menstrual ou até abandonam os estudos quando o acesso ao básico é limitado", aponta Amanda. Essa situação amplia desigualdades de gênero e compromete oportunidades futuras.

Impactos de longo prazo

Para Édison Carlos, presidente do Instituto Aegea, a falta de saneamento é o que explica por que tantas crianças abandonam a escola. "É muito comum que elas faltem às aulas com frequência, tenham notas mais baixas, repitam de ano e, em muitos casos, acabem desistindo dos estudos", afirma.

Por isso e por outras questões, Édison acrescenta que o saneamento deve ser entendido como um direito e não apenas como obra de infraestrutura. "O CEP onde você nasce acaba determinando a sua qualidade de vida e as oportunidades que terá a partir dali. O saneamento reduz desigualdades que são muito comuns em regiões onde ele não existe", diz.

Amanda reforça que "é muito mais eficaz e econômico evitar doenças do que tratá-las. O saneamento deve ser entendido como investimento em saúde e educação, e não apenas em obras".

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