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Tony Marlon

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O Brasil matou mais um brasileiro

Genivaldo de Jesus Santos, 38, foi morto após ser submetido a uma abordagem truculenta durante uma blitz da PRF em Umbaúba, Sergipe - Arquivo pessoal
Genivaldo de Jesus Santos, 38, foi morto após ser submetido a uma abordagem truculenta durante uma blitz da PRF em Umbaúba, Sergipe Imagem: Arquivo pessoal

27/05/2022 11h20

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Hoje não tem palavras de inspiração. Jogaram Genivaldo de Jesus Santos no fundo de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal. E soltaram gás. Ninguém nos contou, está tudo filmado.

Hoje não tem esperança. Jogaram Genivaldo de Jesus Santos no fundo de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal. E soltaram gás. Ninguém nos contou, está tudo filmado.

Hoje não tem entrevistas inspiradoras, nem costura de palavra por palavra para mostrar que já fomos melhor que hoje, e voltaremos a ser. Jogaram Genivaldo de Jesus Santos no fundo de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal. E soltaram gás. Ninguém nos contou, está tudo filmado.

Hoje não tem aquela ideia parida no interior de Minas Gerais, que muda tudo que sabíamos e fazíamos em nossa casa quando o assunto é alimentação. Jogaram Genivaldo de Jesus Santos no fundo de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal. E soltaram gás. Ninguém nos contou, está tudo filmado.

Hoje não tem dicas de filmes que mostram que o mundo acontece no encontro entre os diferentes, nem sugestões de livro que nos ensinam que a realidade é bem maior e mais complexa que o nosso quintal. Jogaram Genivaldo de Jesus Santos no fundo de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal. E soltaram gás. Ninguém nos contou, está tudo filmado.

Hoje não tem a história, e os personagens, daquela política pública de educação que deixou a universidade com mais cara de brasis, menos de Brasil. Nem a história da cantora que entendeu que responsabilidade social não mora em um CNPJ, mas em sua própria voz. Jogaram Genivaldo de Jesus Santos no fundo de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal. E soltaram gás. Ninguém nos contou, está tudo filmado.

Hoje não tem uma sacada poderosa, nem uma lista de bons podcasts para escutar a realidade fora das realidades paralelas que tomaram conta do país. Não tem um bom número de perfis para seguir nas redes sociais, daqueles que te abraçam e dizem que tudo vai ficar bem e o sol já vem.

Hoje não tem aquela boa frase que uma entrevistada diz, que a gente anota, leva para todo canto, pois era tudo que queríamos dizer e não sabíamos. Hoje não temos nem um amanhã que preste. Jogaram Genivaldo de Jesus Santos no fundo de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal. E soltaram gás. Ninguém nos contou, está tudo filmado.

Hoje não tem o influencer que usa seu alcance de milhões para convidar atenção ao que realmente importa neste momento. Não tem o jogador de futebol que aos poucos compreende que só vai ficar bom para ele, quando estiver bom para todo mundo.

Hoje não tem a artista que deixa mais perguntas que respostas pelo caminho e os palcos que anda, nem a cientista que você desconhecia, cujas descobertas já devem ter te salvado três vezes. Só na semana passada.

Hoje, eu chego aqui sem futuros para escrever. Zonzo, com o estômago embrulhado. Talvez o que você esteja lendo nem seja um texto, só um amontoado de dor mesmo. Como este país racista vai começar tudo de novo amanhã, quando jogaram Genivaldo de Jesus Santos no fundo de uma viatura da Polícia Rodoviária Federal. E soltaram gás? Ninguém nos contou, está tudo filmado.