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Tony Marlon

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

A responsabilidade social não pode ser resumida a um departamento

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Imagem: iStock

02/11/2021 06h00

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Há 20 anos, começo dos anos 2000, o mundo era bem diferente. As demandas sociais, assim como as maneiras de se organizar para lutar por avanços, também. Eram outros: o vocabulário, a comunicação entre as pessoas. A velocidade e o tom da conversa pública. Quem a pautava. Foi quando eu entrei pela primeira vez em um projeto social, como aluno.

Desse momento em diante eu não parei de escutar e ler sobre responsabilidade social. O termo estava presente em todos os lugares. Foi por esse período que muitas empresas, especialmente as grandes, estruturaram de verdade suas áreas de investimento social privado. De maneira simplista, uma equipe passou a fazer a gestão de parte do que se ganhava com a venda de produtos ou serviços apoiando projetos sociais.

Durante um bocado de tempo foi assim que tudo funcionou. Depois nasceram os institutos e fundações das próprias empresas, por exemplo. Ao invés de investir em terceiros, o recurso passou a girar em projetos mais autorais. Outro fenômeno importante foi a aproximação do investimento social do core business. Ou seja, uma marca de saúde passou a investir em projetos que se relacionavam com a saúde. E por aí foi.

A maneira de uma empresa assumir sua parcela de responsabilidade na transformação positiva da sociedade mudou muito de lá pra cá, pois a realidade brasileira mudou muito de lá para cá. Mas, ao que parece, algumas marcas ainda não entenderam o espírito social do nosso tempo. Nele, a responsabilidade social é um valor, não apenas um departamento isolado dentro do negócio.

Não é suficiente, hoje, que uma empresa apoie financeiramente iniciativas de equidade racial e de gênero em várias partes do Brasil, mas tenha em seus espaços de poder e decisão somente executivos homens. E brancos. A mudança precisa ser para fora e para dentro das estruturas.

Da mesma maneira, para ficar em outro exemplo simples, não se sustenta uma história contada por uma marca em que numa ponta ela investe em projetos de cuidam do meio ambiente, e do outro segue sem um programa de logística reversa para seus produtos que poluem cada dia mais. Ou cometendo crimes ambientais ano sim, ano também.

Tem sido recorrente que para se justificar de críticas que alcançam o debate público, muitas marcas ainda hoje evoquem que apoiam tais causas, que investem financeiramente em projetos sociais aqui e ali. De novo, a responsabilidade social, no sentido de promovermos uma sociedade que acolha e promova o respeito e os direitos de todas as existências que nos tecem como grupo, precisa ser valor de ponta a ponta em uma empresa. Não adianta dizer que apoia a diversidade, mas empregar quem relativiza o racismo, a transfobia.

As marcas têm, sim, um papel importante no imaginário e na construção do debate público. O que ela comunica e, especialmente, o que ela faz e como se posiciona, entra nas conversas do dia a dia das pessoas. E é ali, no dia a dia das pessoas, que as coisas se transformam, um pouco por vez. Para essa mudança que queremos, todo mundo tem um papel.

O mundo mudou, e terá mudado ainda mais até o fim deste artigo. E novos tempos, novas formas de estar e agir. E isso vale para todos e todas nós, sociedade, vale também, e muito, para as empresas.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL