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Tony Marlon

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

As conversas mais potentes hoje estão nos podcasts. E eu posso provar

Imagem de divulgação do podcast Segredos das Margens - Divulgação
Imagem de divulgação do podcast Segredos das Margens Imagem: Divulgação

26/10/2021 06h00

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Mais de 70% dos podcasts brasileiros nasceram de 2018 para cá. Ao menos é isso que mostra a mais recente pesquisa da ABPOD - Associação Brasileira de Podcasters. Batizada de PodPesquisa Produtores, o estudo traça o perfil de quem produz. Mostra também como esses programas são feitos, quais são os populares e muito mais.

Já é perceptível nas plataformas e conversas por aí que temos cada vez mais pessoas tirando suas ideias do papel. Essa diversidade, aliás, ainda não foi necessariamente alcançada por pesquisas feito essa, já que, se fosse uma pessoa, o produtor brasileiro médio hoje seria um homem (75%), hétero (81%), branco (58%) com renda entre R$ 5 mil e R$ 10 mil, segundo os dados de 2020-2021. Sabemos que o mundo é bem maior que isso. E, justiça seja feita, a ABPOD tem feito bonitos movimentos para pluralizar a podosfera.

Ter mais pessoas criando é uma linda novidade, por muitos motivos. Quanto mais programas, mais opções. Mais opções, mais espaço. Mais espaço, novos debates. Novos debates, novas debatedoras. Com isso, novas autoridades se fortalecem e se nacionalizam. E todo mundo ganha com mais visões de mundo interpretando o Brasil.

Dois programas lançados recentemente resumem bem o poder que os podcasts têm de trazer um respiro à conversa pública, que gira em volta das mesmas pautas, com as pessoas falando. Mais democrático como produto, linguagem e espaço de produção de conhecimento, os podcasts têm as conversas mais interessantes do Brasil hoje. Ao menos para mim.

Essa Geração

Luciana Petersen tem 24 anos e não sabe se quer ou não ser pastora. Além de cristã, ela é negra e feminista e faz cultos pela internet, reunindo mulheres de vários cantos do Brasil. Mas o que seu pai, um tradicional pastor da Igreja Batista, acha disso?

Peguei este trecho emprestado da descrição do podcast Essa Geração, produzido pela Fundação Tide Setúbal. O programa mergulha no universo de jovens brasileiros conversando sobre religião, família, política e educação.

Sabe aquela roda de conversa que andamos sentindo falta, em que tem uma ou outra pessoa que a gente conhece, mas que de tão boa e interessante não pensamos duas vezes em nos sentarmos quando abre um espacinho, mesmo a gente sendo muito tímido? Pronto, o Essa Geração é isso.

Com uma linguagem leve e trazendo histórias e personagens poderosos, que te fazem nem ver o tempo passar, o podcast me atravessou de um jeito que não pude deixar de escrever sobre ele.

Primeiro porque traz um público que quase nunca é escutado pela mídia tradicional quando se debate religião no Brasil, que é o tema dos três episódios da temporada de estreia. Se olharmos para as reportagens que pipocam por aí, a espiritualidade é um assunto que parece interessar e ser experienciado apenas pelos adultos. Sabemos, isso não é nem um pouco verdade.

E segundo porque as juventudes que estão contando suas histórias no programa, compartilhando o que percebem e sentem quando passeamos pelo assunto religião, não são necessariamente aquelas que têm espaço nos grandes debates nacionais. Aliás, quem perde com isso é o debate.

Segredos das Margens

Começa pelo nome, que é bonito que só. Apresentado pela Tamires Rodrigues, Luana Santos e a Vitória Guilhermina, o Segredos das Margens nasceu dentro do Você Repórter da Periferia 2.0, um programa de inclusão produtiva da juventude periférica no jornalismo criado pelo coletivo Desenrola e Não Me Enrola. Vale conhecer este trabalho.

Além da leveza na linguagem e na condução, Segredinho, episódio de estreia do programa, mostra que é perfeitamente possível fazer uma conversa aberta sobre sexualidades sem repetir clichês históricos ou dar sono em quem escuta. E o mais importante de tudo: deixando as juventudes protagonizarem as perguntas e os rumos da conversa.

O conceito é simples: a partir de uma história recebida em áudio pelo Whatsapp, as apresentadoras trocam ideias com Rafael Fernandes, assistente social e pesquisador em gênero e sexualidade, na tentativa de responder alguns questionamentos da audiência. Simples e potente assim.

Me interessou trazer essas duas experiências, pois às vezes nos perdemos na infinidade de conteúdos publicados diariamente. Soterradas por tanta informação, nos cansamos rápido sem chegar a coisas tão importantes, potentes e, para mim, inovadoras, feito estes dois programas. A conversa que a gente precisa, sobre os temas que a gente precisa, mas do jeito que a gente quer e gosta de consumir.

A mídia tradicional tem ousado cada vez menos em formato e linguagem, trabalhando com fórmulas que oferecem poucos riscos, programas que parece que já vimos algumas vezes. E dos quais já estamos cansadas. É bom saber que o mundo é maior que isso.

Vale conhecer também:

Rede Nordestina de Podcasts

LGBTQIAP+ Podcasters

Pretas Na Rede.